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32 | I Série - Número: 071 | 13 de Abril de 2007

for tratado.
A exigência da intensidade e da reiteração para a qualificação da conduta como crime de violência doméstica, significa, na prática, que os agressores continuarão a ser punidos meramente pelo crime de ofensas à integridade física. Incluir estas duas circunstâncias no tipo penal implica a sujeição total ao poder discricionário do procurador do Ministério Público, que decidirá o que é ou não intenso, e, mesmo que passe por este crivo, dificultará a prova em sede de julgamento, pois a mesma terá que ser produzida em relação a todos os factos, nomeadamente quanto à sequência de datas que justifica a reiteração.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Esta é uma questão muito importante e por isso o Bloco de Esquerda quis trazê-la hoje aqui e colocá-la directamente ao Governo, para que, na especialidade, se possa ponderá-la seriamente.
O combate à violência sobre as mulheres também passa pelo fim da impunidade dos agressores — e é isso que pode estar em causa com esta alteração.
Termino, reafirmando o apoio do Bloco de Esquerda ao projecto de resolução hoje debatido e o nosso compromisso no seu cumprimento.
Esta é tarefa de todos, mulheres e homens. E ainda bem que a Assembleia da República também a assume.

Aplausos do BE, do PCP e de Deputados do PS, do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria do Rosário Carneiro.

A Sr.ª Maria do Rosário Carneiro (PS): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: A violência contra as mulheres ofende-nos na nossa dignidade humana. Ela é global, sistemática e está enraizada nas diferenças de poder e de desigualdade estrutural entre mulheres e homens.
Está para além de especificidades históricas, sociais e religiosas. É universal e permanente. Afecta as mulheres de forma desproporcional, só porque são mulheres: desde o sofrimento físico e mental até outras formas de coação ou inibição da liberdade, como a privação económica ou isolamento.
Thomas Friedman fala-nos de um mundo plano, onde tudo passa a ser visível e que vem evidenciar uma monstruosidade inimaginável, a de uma anomalia demográfica que nos conta que faltam 100 milhões de mulheres no mundo. Faltam, simplesmente porque morreram: umas, antes de terem nascido, outras, vítimas de infanticídio, e outras ainda, de negligência ou de maus-tratos.
A discriminação e os maus-tratos começam muito cedo, ainda na infância. Em muitas partes do mundo, as crianças do sexo feminino estão privadas da escolaridade básica, são maltratadas, exploradas e vítimas de preconceitos, sofrem, de forma particular, as consequências da pobreza e, muitas das vezes, são encaminhadas para o trabalho infantil e para a exploração sexual.
Do que falamos é do direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal, que constitui um direito inalienável e inerente à dignidade da pessoa humana, que clarifica as obrigações do Estado na prevenção, erradicação e punição da violência, que impõe o «empoderamento» das mulheres no sentido de se tornarem autónomas e independentes, e que exige a intervenção articulada, multissectorial dos vários sectores que compõem o Estado.
É um problema velho, bem velho, que carece, no entanto, de respostas novas, que tenham em conta a forma como as sociedades vão evoluindo.
De facto, apesar de uma significativa elevação do nível educativo, que deveria pressupor maior civilidade nas relações interpessoais, as manifestações de violência aumentam e apresentam novas formas; apesar de uma elevada participação das mulheres no mundo do trabalho, que deveria pressupor uma maior autonomia e independência, os testemunhos destas mulheres batidas e sofridas tardam a ser reconhecidos como credíveis, e muitas mulheres permanecem prisioneiras isoladas no seu mundo de violência; apesar de uma progressiva e significativa melhoria das condições gerais de vida, no entanto, persistentes vulnerabilidades, assimetrias e exclusões são responsáveis por uma violência que não cede, antes se acentua; e apesar de uma significativa e compreensiva evolução na feitura de leis, que definem o crime como crime público, que prevêem a protecção da vítima e que punem o agressor, porém, como bem recentemente aconteceu na sociedade portuguesa, a interpretação do crime e a análise da vítima continuam condicionadas a preconceitos e estereotipias.
As leis não dispensam uma mudança de mentalidades.
Este projecto de resolução, que hoje aqui apresentamos, integra-se numa campanha comum da União Europeia que procura evidenciar como é inaceitável a persistente violência contra as mulheres nas suas múltiplas formas, como é fundamental reforçar o empenho político e a intervenção conjunta de todos os decisores para identificar formas e recursos que previnam e combatam de forma sustentada a violência contra as mulheres, e como é indispensável o envolvimento de toda a comunidade não só na identificação das situações e do acolhimento decorrente mas também no empenhamento activo na sua eliminação. E a finalidade desta resolução e de todas as outras medidas que se queiram preconizar será sempre a de garantir a igualdade, a liberdade e a dignidade das mulheres.