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16 | I Série - Número: 075 | 26 de Abril de 2007

trar o adequado desenho constitucional que assegure que a Europa se assume a uma só voz nas relações externas e na política de segurança comum, cumpre o seu papel no equilíbrio geoestratégico mundial, contribuindo para a paz, para o desenvolvimento, para a protecção do planeta e para a regulação da globalização, em que a economia sirva as pessoas e não as pessoas a economia.
Mas só teremos mais Europa se colocarmos a coesão social a par da união política e da união económica.
Isto significará também uma clara definição das competências das instituições europeias e das competências nacionais.
O princípio da subsidiariedade, designadamente na organização dos sistemas de protecção social, é de salvaguardar de forma adequada.
Numa época onde as grandes diferenças entre partidos políticos se medem frequentemente na forma como concebem os modelos de protecção social, a imposição de modelos únicos europeus poria em causa a própria essência do sistema democrático nas suas escolhas nacionais.
Acompanho, por isso Jean-Paul Fitoussi e Jacques Le Cacheux no seu manifesto sobre a Europa dos bens públicos como contributo para a reforma da constituição económica europeia, tão oportuno quando estão em aprofundamento os serviços sociais de interesse geral, na sequência da revisão da Directiva Bolkenstein.
Defendem estes autores que prosseguir a integração no campo político implica uma explicitação prévia da reforma do projecto político que contém a Europa económica, conciliando duas realidades essenciais: o Estado-nação e a soberania partilhada. A estabilidade macroeconómica, o pleno emprego, a coesão territorial, o progresso do conhecimento e da sua transmissão, a protecção do ambiente (que preside à noção de desenvolvimento sustentável), a mobilidade, a independência energética e a coesão nacional através da integração social no seio de cada Estado-membro são bens públicos europeus essenciais ao bem-estar das populações.
A União Europeia é bem mais do que um mercado. É uma união política que deve ter a possibilidade de definir e concretizar estratégias industriais e comerciais, competindo à autoridade política reconciliar os objectivos de três políticas: concorrência industrial e comercial, sem subordinação destas últimas à primeira. A União Europeia não deve nem pode ficar de fora da prosperidade mundial e não pode subtrair-se às suas responsabilidades de grande potência. Ela tem um futuro a ganhar.
E o mundo? O mundo, esse, hoje já não é caracterizado pelo espaço-tempo mas pelo «espaçovelocidade», como diz Paul Virgilio.
Isto quer dizer que o mundo está aqui, na mão e na vida de cada um de nós. Mas esse mundo é vivido, por vezes, numa busca de felicidade «mais numa lógica de mina do que de agricultura ou horticultura», numa feliz expressão de Zygmunt Bauman. Isto é, mais numa lógica de exploração até esgotar do que numa lógica de cultivar e fazer crescer. Razão pela qual muito mais do que da visão de Thomas Friedman, que atribui à globalização a imagem de «o mundo é plano», comungo da premonição de Kant, de há bem mais de dois séculos, de que é porque o mundo é esférico que se impede a «dispersão infinita» e, no final, seremos todos vizinhos, não tendo outra alternativa senão vivermos todos juntos e sustentarmo-nos uns aos outros.
E é porque somos todos vizinhos, porque vivemos ao lado uns dos outros, que, enquanto não chega a época da «hiper-democracia», não podemos ignorar as terríveis desigualdades que convivem connosco e os milhões de pessoas que morrem por ano simplesmente porque são demasiado pobres para permanecerem vivas.
Outro mundo é preciso e é possível. É o que nos propõe Jeffrey Sachs quando afirma que a oportunidade que temos é de cortar a respiração: sermos capazes de fazer avançar a visão do iluminismo de Jefferson, Smith, Kant e Condorcet. A revolução democrática que o iluminismo pôs em marcha cobre actualmente mais de metade da população mundial; a visão de Kant sobre uma federação de Estados independentes está corporizada nas Nações Unidas; a imagem de Condorcet de uma revolução cientifica auto-sustentada tem demonstrado estar acertada e a ciência pode agora ser utilizada para tratar alguns dos maiores perigos permanentes da humanidade; e o conceito de Adam Smith relativo à difusão da riqueza económica é o mais imediato dos triunfos que temos à frente: a eliminação da pobreza extrema num período de apenas duas décadas, promovendo uma «globalização iluminada», constituída por democracia, multilateralismo, ciência e tecnologia e um sistema económico desenhado para satisfazer as necessidades humanas.
Acabar com a pobreza será a única oportunidade para lutar contra a paz precária que vivemos face às ameaças do terrorismo.
Parafraseando Robert Kennedy, «poucos terão a grandeza de vergar a própria história, mas cada um de nós pode trabalhar para mudar uma pequena parte dos acontecimentos e na totalidade de todos esses actos será escrita a história da sua geração (…).».
Seremos capazes. Estou certa de que sim. Teremos apenas que ler mais, como aconselha Paul Ricoeur, porque «a imaginação social é constitutiva da própria realidade». Depois, fazer bem, como nos ensina António Damásio, numa atitude de combate que vença o mero determinismo biológico, acrescentando-lhe emoção e sentimento.