19 | I Série - Número: 088 | 26 de Maio de 2007
os crimes efectivamente prioritários. O Governo sentiu essa necessidade: primeiro, elencou os crimes prioritários e, depois, elencou os ainda mais prioritários.
O que digo, e repito, é que suponho que todos nós estamos apostados, de facto, em trabalhar em sede de especialidade. É evidente que, aqui, não vou dizer-lhe qual considero que deveria ser, se o crime A, o crime B, etc.
Aliás, se bem está recordado, o Sr. Procurador-Geral da República também acusou a lei desse excesso mas, entretanto, viu que era preciso elencar mais um crime.
Portanto, tudo isto é discutível e estamos com a maior boa fé e a maior boa vontade para, em sede de especialidade, participarmos na redacção de uma lei que seja justa e adequada, que trace, de facto, o conjunto das efectivas prioridades em matéria penal, tal como eu disse que desejamos que aconteça.
Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo, muito obrigado pelas suas palavras. Sabe quanto também o considero e aprecio há tantos anos.
De facto, não posso deixar de estar mais de acordo com o que V. Ex.ª disse.
Não me parece fazer o mais pequeno sentido que um processo-crime que decorra numa determinada comarca demore duas, três, quatro ou cinco vezes mais tempo do que um outro de idênticas características, envolvendo idênticos ilícitos, que decorra noutra comarca. Repito que não posso estar mais de acordo com o que V. Ex.ª disse.
As prioridades têm de deixar de ser regionais e têm de passar a ser materiais. É isso que desejamos que aconteça.
O seu alerta foi público, o que é sempre de louvar. V. Ex.ª disse, e muito bem, que o processo a que se referiu decorre em termos absolutamente inapropriados.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.
O Sr. Luís Fazenda (BE): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, Srs. Deputados: Há pouco mais de um ano, a propósito da discussão da proposta de lei que daria origem à Lei-Quadro da Política Criminal, o Bloco de Esquerda alertou para o carácter vago e genérico da lei e questionou o Sr. Ministro da Justiça sobre o que iria mudar, com tal lei, nas práticas e nos meios disponíveis para a investigação criminal.
Embora não tenha respondido a esse ponto concreto, disse o Sr. Ministro da Justiça, em resposta à Deputada Ana Drago: «Temos aqui (…) a possibilidade de trazer a um órgão de soberania eleito a possibilidade de definir orientações gerais nesta matéria. Repito, orientações gerais, porque, quanto a processos, quanto a decisões que interfiram com processos, continua a ser o Ministério Público a única entidade que o poderá fazer, em homenagem ao princípio constitucional da autonomia (…)».
O que mudou, então, no espaço de um ano? A proposta de lei hoje em apreço, e cuja função é definir a política criminal dos próximos dois anos, continua tão vaga e genérica quanto a lei-quadro que lhe deu origem.
Bem pode o Sr. Ministro da Justiça fazer uma extrapolação estatística, referindo-se a um quinto dos processos, argumentando pelo quantitativo, o que só refere o óbvio, mas anula a selectividade qualitativa.
Nenhum estudo sobre a realidade sociológico-criminal foi entretanto efectuado.
Nenhuma avaliação sobre os resultados da investigação criminal levada a efeito nos últimos anos foi realizada.
Nenhuma análise sobre os meios disponíveis, sobre os meios utilizados e, sobretudo, sobre a eficácia dos mesmos para a investigação criminal foi elaborada.
Ora, não tendo sido efectuado qualquer estudo com relevância para esta matéria, como pode o Governo determinar quais são as prioridades de política criminal? Quais os critérios que orientaram as opções constantes desta proposta? Como facilmente se constata pela análise da fundamentação constante do anexo ao diploma, o Governo baseia-se na teoria jurídica, em opções prospectivas e abstractas, mas não em dados efectivamente recolhidos.
Salvo raras excepções, como os dados relativos à população prisional que se encontra encarcerada pela prática de crimes relacionados com o consumo e tráfico de drogas, que o Governo foi retirar ao relatório de 2003 do Provedor de Justiça, sobre o sistema penitenciário português, os dados relativos, por exemplo, à sinistralidade rodoviária e os relativos à área ardida no ano de 2006, apenas encontramos — lamento dizê-lo! —generalidades e lugares comuns. Por isso, Sr. Ministro da Justiça, as prioridades são um «catálogo de A a Z».
Também não se compreende como é que a proposta hoje em discussão garante o princípio constitucional da autonomia do Ministério Público — aquele que o Sr. Ministro tão acerrimamente defendeu há um ano e que, da nossa parte, mereceu o benefício da dúvida —, contendo orientações tão claras e precisas sobre as directivas e instruções a aprovar pelo Procurador-Geral da República.