13 | I Série - Número: 089 | 31 de Maio de 2007
O Sr. Manuel Mota (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Que razões levam o PSD, maior partido da oposição, a utilizar um agendamento potestativo para que discutamos um projecto de lei sobre a autonomia e a gestão das instituições de ensino superior? Haverá ausência de orientação do Governo em relação à matéria em causa? Não se perspectiva qualquer mudança legislativa sobre o regime jurídico das instituições de ensino superior? Ora, pelo menos, desde o final do ano transacto, no debate mensal com o Sr. Primeiro-Ministro, o PSD sabia de todo o calendário das reformas para o ensino superior, sabendo, inclusive, aquando do agendamento deste projecto de lei, que o Governo tinha em discussão, com os vários parceiros, um diploma sobre a mesma matéria.
Parece-nos que o principal partido da oposição tem muito pouco de novo para propor ao País, limitando-se a ser «a caixa de ressonância» de faits divers ou a, oportunistamente, associar-se a focos de contestação pontuais. Este agendamento potestativo e o projecto de lei que o sustenta provam-no.
Senão vejamos: parece querer ignorar o facto de estar a acontecer, neste preciso momento, um debate na sociedade portuguesa sobre a matéria.
Ignora todo «um mundo novo» que entretanto emergiu no ensino superior em Portugal: desde as recomendações de estudos internacionais, às alterações à Lei de Bases do Sistema Educativo, passando pelo Processo de Bolonha, a abertura a novos públicos, à clarificação da diferenciação das missões entre universidades e politécnicos, à mobilidade de estudantes e diplomados, à exigência no acesso, às questões da empregabilidade ou às profundas mudanças no modelo de avaliação e acreditação do ensino superior em Portugal.
Não nos surpreende, porque é por demais evidente, que este projecto de lei tenha como principais orientações ainda as da lei de bases vetada pelo Sr. Presidente da República no anterior governo de maioria PSD/CDS-PP.
Um projecto de lei que promete muito no seu preâmbulo, mas que na prática, entenda-se articulado, muda muito pouco no actual panorama da organização das instituições de ensino superior em Portugal.
Centremo-nos, por breves instantes, nas questões mais relevantes do diploma: a autonomia e os modelos de gestão. O PSD propõe dar total autonomia e liberdade de escolha às instituições em relação aos modelos de gestão mas, na prática, permite que tudo fique na mesma, já que não delimita um padrão mínimo para alcançar os objectivos da sua reforma.
Analisemos algumas questões concretas.
Primeira questão: quem elege o reitor da universidade ou o presidente do politécnico? O que os estatutos estabelecerem! Quem cria os estatutos? As actuais estruturas das instituições de ensino superior, sejam mais ou menos conservadores, mais ou menos inovadoras, exactamente aquelas que o PSD quer mudar! Segunda questão: é possível concretizar-se a proposta de n.º 2 do artigo 9.º, ou seja, que uma personalidade de reconhecido mérito, externa à instituição, seja reitor ou presidente? Sim, se o colégio eleitoral assim o entender! Mas quem é o colégio eleitoral? Aquele que os estatutos definirem! E quem cria os estatutos? Todos aqueles que até hoje se mostraram contra essa possibilidade. Ou seja, na prática é quase impossível com este diploma cumprir esse objectivo.
E o que é que podemos esperar da necessária abertura das instituições à comunidade, consubstanciado no órgão colegial estabelecido pelo n.º 3 do artigo 9.º, responsável objectivamente apenas pelo desenvolvimento estratégico das instituições de ensino superior? Podemos esperar, no essencial, o que já hoje esperamos dos conselhos consultivos dos politécnicos e dos conselhos estratégicos das universidades — daqueles que os têm.
Sem competências concretas estatuídas, podemos esperar tudo teoricamente, mas na prática permite-se a total arbitrariedade no seu uso.
O PSD propõe mudar tudo, mas cria condições para que fique tudo na mesma.
Este projecto de lei é um documento desactualizado porque não responde aos desafios da modernidade para o nosso sistema de ensino superior, como por exemplo: a adopção de um quadro exigente de referência internacional para o desenvolvimento e qualidade do sistema de ensino superior português, centrado no objectivo da qualificação, de nível internacional, dos seus estudantes; o reforço da especialização do sistema binário; a consolidação e integração institucional dos institutos politécnicos para que deixem de ser federações de escolas separadas e autónomas; a regulação e ordenamento da rede pública; a definição de requisitos comuns de exigência para a criação e continuidade de instituições de ensino superior, impondo-se designadamente níveis apropriados de pessoal doutorado a tempo inteiro, em função da dimensão e da natureza das instituições; a possibilidade de criação de mecanismos inovadores que potenciem sinergias entre instituições diferentes; o envolvimento de representantes das instituições de investigação das universidades nos seus conselhos científicos; a criação de regras que permitam, objectivamente, a renovação dos dirigentes das instituições; a reforma do sistema de Governo das instituições de ensino superior públicas de acordo com as boas práticas internacionais; a clarificação e a valorização do papel dos alunos e antigos alunos, entre outros.
Um novo regime jurídico para as instituições de ensino superior que não contemple estas orientações