34 | I Série - Número: 055 | 6 de Março de 2008
descoberta do crime. Esta solidariedade delinquente, conjugada com a privacidade que, normalmente, rodeia a prática do crime, torna estas actividades largamente imunes à intromissão das instâncias de controlo, provocando elevadas cifras negras.
Neste contexto, um Estado que não queira ver a punição desses crimes reduzida a pouco ou a quase nada tem de dar às pessoas que contribuem para a realização da justiça condições de segurança e deve assegurar que possam prestar o seu depoimento sem interferências, ameaças ou coacção.
Com esta iniciativa, quisemos colocar à disposição de investigadores e magistrados novos instrumentos para tornar mais efectiva a perspectiva de decisões condenatórias em relação a crimes tantas vezes sem castigo.
Propomos, assim, uma revisão e um alargamento do actual regime de protecção de testemunhas introduzido em 1999.
As medidas de protecção de testemunhas passam, agora, a ser aplicadas a crimes contra a vida, contra a liberdade das pessoas, contra a liberdade ou autodeterminação sexual e de corrupção, com ou sem verificação de associação criminosa, desde que puníveis com penas de máximo igual ou superior a oito anos de prisão.
Com este critério, também crimes como homicídio, sequestro agravado, violação de pessoas e abuso sexual de crianças passam a ser sempre passíveis de aplicação de medidas de protecção de testemunhas.
Esta proposta versa medidas de protecção de testemunhas, não se ocupa de perdões ou de benesses.
Os mecanismos de dispensa e de atenuação da pena estão já previstos noutros diplomas, como acontece com o Código Penal ou com a legislação sobre a corrupção desportiva, o sector privado ou o comércio internacional. São soluções aplicáveis quando o corrompido voluntariamente repudiar ou restituir a vantagem oferecida antes de praticar o facto ou quando o agente auxilie concretamente na recolha de provas decisivas para a identificação ou captura dos responsáveis.
São acrescentadas novas medidas às que já estão consagradas. Por exemplo: a indicação, no processo, de uma residência que não é a habitual; o transporte em viatura do Estado para intervir num acto; dispor de um compartimento reservado em instalações policiais ou judiciárias; protecção policial; isolamento na prisão de outros reclusos; transporte em viatura separada; ocultação da imagem da testemunha; distorção da voz; não revelação da identidade; programas especiais de segurança, como, por exemplo, para alteração do aspecto físico; documentos com identificação diferente; concessão de nova habitação no País ou no estrangeiro; apoio na angariação de meios de subsistência, incluindo subsídios. E, para testemunhas especialmente vulneráveis, por exemplo, pela idade diminuta ou avançada, pelo estado de saúde ou pelo facto de prestar declarações contra pessoa da família ou quem esteja numa relação de dependência ou subordinação, acompanhamento psicológico ou social, afastamento temporário da família ou do grupo social fechado, assegurar que nunca se encontram com certos intervenientes no processo.
A estas medidas é também acrescentada uma nova medida pontual de segurança: a alteração do local físico da residência da testemunha, que pode ser uma medida proporcionada ao risco assumido.
Prevê-se também a possibilidade de concessão de uma moratória à testemunha que, em resultado da sua colaboração, venha a encontrar-se numa situação económica difícil. Procura-se também a responsabilização da testemunha beneficiária, passando a prever-se que a aplicação das medidas pontuais de segurança possa ser acompanhada de regras de conduta a observar pela testemunha, podendo as medidas ser suspensas em caso de violação das regras.
Sr.as e Srs. Deputados: A nossa experiência nesta matéria não é extensa, envolve algumas dezenas de beneficiários, mas é positiva.
A Comissão de Programas Especiais de Segurança, presidida pelo Conselheiro Armando Leandro, que daqui saúdo, merece o nosso reconhecimento.
A prova é fundamental para a condenação. Testemunhas, em certo tipo de crimes, são absolutamente cruciais para haver punição, para que enunciar esses crimes não seja o mesmo que dizer «impunidade».
Proteger as testemunhas e criar os meios para que possa ser mobilizada mais prova para os nossos julgamentos criminais é uma opção que se impõe num Estado de direito, em que a prova testemunhal não pode ficar à mercê dos poderes fácticos que frustram a acção da justiça.
Como sempre, Sr.as e Srs. Deputados, estaremos atentos a todos os contributos e disponíveis para todos os aperfeiçoamentos na especialidade. É o que exige o progresso do Estado de direito.