51 | I Série - Número: 028 | 19 de Dezembro de 2008
O que hoje está em causa é saber se PS e PSD, que «cozinharam» a última revisão do Código de Processo Penal, estão dispostos a garantir uma alteração fundamental para o sucesso do combate à criminalidade grave e complexa, ou se, pelo contrário, pretendem manter um regime de segredo de justiça que, independentemente das intenções que o justifiquem, serve objectivamente apenas os interesses do crime organizado, de corruptos, corruptores e dos senhores das grandes fraudes económicas e financeiras.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Para apresentar o projecto de lei do Bloco de Esquerda, tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Pinto.
A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A última reforma do Código de Processo Penal foi fonte de controvérsias e polémicas. Fruto de um Pacto de Justiça entre o PS e o PSD, a reforma acabou por ser uma oportunidade perdida e não correspondeu àquilo que a justiça necessitava.
Discordamos de muitas das soluções encontradas e temos de apontar a responsabilidade do grande falhanço desta reforma ao Partido Socialista, mas também ao PSD, naquilo que será uma marca indisfarçável que ficará colada a esta Legislatura. A reforma não correspondeu ao salto de qualidade na justiça que os cidadãos e as cidadãs esperavam, não conseguiu resgatar a confiança no sistema de justiça.
O Sr. Luís Fazenda (BE): — Muito bem!
A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Apresentamos as nossas ideias sobre uma matéria das mais sensíveis e polémicas nesta reforma: o segredo de justiça. Sensível por ser uma componente estruturante da investigação criminal; sensível por ser uma baliza indiscutível da garantia de direitos.
O Bloco de Esquerda considera que as actuais regras do segredo de justiça não correspondem às necessidades da investigação criminal, com as características que certos tipos de criminalidade muito complexa assumem na actualidade. Consideramos que o caminho não é voltar para trás, não é voltar ao anterior paradigma em que tudo estava sujeito a segredo.
A transparência do processo e da actuação do Ministério Público são fundamentais, assim como é fundamental a existência e o cumprimento de prazos processuais. Mas a justiça, a sua organização e a sua aplicação não podem estar desligadas da realidade social e das necessidades objectivas que se colocam na sociedade dos nossos dias. A justiça tem de responder às situações e aos problemas que hoje estão colocados. Em nossa opinião, o Código de Processo Penal não responde a uma questão fundamental: como garantir o equilíbrio necessário entre a natureza do crime a investigar e as condições indispensáveis à eficácia dessa mesma investigação.
Retomamos, pois, as nossas anteriores propostas, assim como acolhemos as sugestões do ProcuradorGeral da República. Por isso, propomos que a publicidade do processo, durante a fase de inquérito, dependa da natureza do crime — privada, semi-pública ou pública.
Crimes de natureza privada são sempre públicos; aos crimes semi-públicos deve aplicar-se o segredo de justiça até ser deduzida a acusação, com possibilidade de ser levantado desde que não ponha em causa a investigação ou os sujeitos processuais.
Para crimes públicos deve existir sempre segredo de justiça até ser deduzida a acusação com possibilidade de prorrogação dos prazos nos casos de criminalidade organizada, corrupção económicofinanceira.
Se é praticamente consensual que, em relação a determinados tipos de crimes, nada obsta ao facto de a instrução e inquérito decorrerem sob a regra da publicidade, sem daí resultar o prejuízo quer para a investigação quer para os direitos dos intervenientes, já a mesma situação não se coloca quando se trata de investigação da criminalidade violenta e altamente organizada, assim como dos crimes de natureza económica e financeira, que implicam condições e meios muito específicos para a sua investigação.