I SÉRIE — NÚMERO 25
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contribuir para o desenvolvimento industrial da economia portuguesa e consequente aumento do valor
económico associado à aquisição».
Os efeitos das contrapartidas na economia portuguesa, também de acordo com o Decreto-Lei n.º 154/2006,
devem ser «estruturantes e inovadores, designadamente através do desenvolvimento de capacidades
empresariais competitivas nos mercados internacionais» e «devem contribuir também para a criação de
capacidades empresariais na área das indústrias de defesa».
No caso concreto dos submarinos, nos termos do contrato assinado em 23 de abril de 2004 entre o Estado
português e o GSC (German Submarine Consortium), para vigorar entre 2004 e 2012, as contrapartidas a gerir
pela empresa Ferrostaal ascenderiam a 1210 milhões de euros.
Nos primeiros seis anos do contrato, ou seja, entre 2004 e 2010, 19 dos 39 projetos incluídos no programa
não tinham registado qualquer movimento. Entretanto, surgiram processos criminais por corrupção, na justiça
alemã, com arguidos já condenados, e na justiça portuguesa, por burla qualificada e falsificação de
documentos, que, como se sabe, estão, neste momento, em fase de julgamento.
Passando por cima de pormenores pouco edificantes, descritos no relatório da Comissão Permanente de
Contrapartidas relativo a 2011, o facto é que, em 30 de março de 2012, data desse relatório, do montante de
1210 milhões de euros que constava do contrato, estavam validadas contrapartidas no valor de 489 milhões
de euros e estavam em litígio contrapartidas no valor de 261 milhões. Ou seja: 721 milhões de euros de
contrapartidas estavam, e estão, por cumprir.
Do relatório da Comissão Permanente de Contrapartidas, constam várias hipóteses em negociação,
designadamente um investimento da empresa Koch de Portugal, um projeto designado por «MedSim», na
área da Medicina, e ainda a criação de um Fundo de Investimento de Capital de Risco.
Mas eis senão quando surge na imprensa portuguesa a notícia de que o Ministério da Economia acordou,
em outubro passado, com o Fundo de Investimento alemão MPC, que controla presentemente a Ferrostaal,
fechar o contencioso das contrapartidas não prestadas, através da recuperação de um hotel de luxo em
Albufeira.
Acontece, porém, que a recuperação dessa unidade hoteleira estava prevista há muito tempo, tendo sido
mesmo classificada pelo anterior Governo, em 2010, como Projeto de Interesse Nacional (PIN) e só não terá
avançado entretanto por dificuldades de financiamento do Fundo de Investimento alemão a que se encontrava
associado.
Porém, em março deste ano, o Fundo MPC passou a controlar a Ferrostaal e encontrou o «ovo de
Colombo», que foi fazer passar como contrapartida pelos submarinos a recuperação do Hotel Alfamar, que
tem todo o interesse em fazer e que lhe custará 150 milhões de euros. Só que, como o Governo português é
um «mãos largas», o Ministério da Economia terá considerado que o valor dessa contrapartida será
considerado em 600 milhões de euros: 150 milhões do investimento, mais 450 milhões dos negócios gerados
pelo avanço do projeto, cujo proveito será, obviamente, do grupo alemão.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — É um escândalo completo!
O Sr. António Filipe (PCP): — E devido a este gesto de boa vontade do Governo, a defesa dos arguidos
no processo que corre na justiça portuguesa já veio dizer que, se o Estado português se dá por satisfeito com
as contrapartidas assim acordadas, não há qualquer razão para que se mantenha a acusação de burla e
falsificação de documentos e que o processo deve ser arquivado.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — É extraordinário!
O Sr. António Filipe (PCP): — Atentemos na gravidade do que está em causa: o Estado português foi
lesado em 721 milhões de euros pela Ferrostaal, num processo que tem, inclusivamente, implicações
criminais. As contrapartidas a prestar deveriam, nos termos da lei, beneficiar a capacidade da indústria
portuguesa e permitir aumentar a sua competitividade nos mercados internacionais. Entretanto, o Fundo de
Investimento alemão que controla a Ferrostaal pegou num projeto de tinha em Portugal, desde há vários anos,
e que não avançou entretanto por razões que lhe são imputáveis, e contou com a cumplicidade do Governo de