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I SÉRIE — NÚMERO 54

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O nosso entendimento, na altura da aprovação da lei de limitação de mandatos, foi o de que ela deveria

ser, inclusivamente, mais extensiva, do ponto de vista de vários cargos executivos. Deveria haver limitação de

mandatos de Primeiro-Ministro, de presidente de Governo Regional, para além de presidentes das autarquias

singulares. Isto não foi possível porque o PSD, na altura, não anuiu nessa circunstância e era necessária uma

maioria qualificada para o fazer.

Em todas as circunstâncias, Sr. Deputado António Filipe, o que entendemos é que há um princípio

constitucional que tem de ser concretizado, que é um princípio, aliás, ínsito à ética republicana da renovação

dos mandatos. A disposição de que ninguém está num mandato vitalício não pode ser entrecortada apenas

por ocasião do sufrágio, deve ter limitações, em determinados momentos, no ciclo político.

E aqui, em sede política, porque é da realidade que estamos a falar e a sua intervenção não será apenas

teorética e produto de uma hermenêutica constitucional, ela está inserida na vida política concreta do País,

pergunto: politicamente, franquear a ponte do Freixo ou o IC19 resolve o problema que a lei pretendia resolver,

ou seja, não deixar amadurecer determinado tipo de promiscuidades locais entre titulares de cargos políticos e

interesse económicos? E esse é que é o ponto em concreto.

Dir-se-á: há interpretações que não são unívocas acerca da lei. Certamente. Nós temos uma, que é aquela

que nos parece que acompanha o espírito do legislador. E parece que não estamos totalmente

desacompanhados, pois a questão tem sido debatida e há constitucionalistas que têm opiniões diversas e até

antagónicas sobre o assunto.

Mas chamo a atenção do Sr. Deputado para a recente decisão de tribunais superiores em relação ao caso

do Presidente da Câmara de Faro, que entenderam fazer com este perdesse o mandato devido a práticas

consideradas ilegais tidas anteriormente numa outra autarquia da qual tinha sido presidente. Portanto, a

interpretação aqui não é unívoca.

Do ponto de vista político, creio que todos devem assumir responsabilidades, cada um na coerência dos

seus atos. Não repudio, não renego absolutamente a ninguém a coerência dos seus atos. Contudo,

precisamos de uma boa lei de limitação de mandatos, não precisamos de «febres repentinas», seja em Vila

Nova de Gaia, seja em Sintra, seja lá onde for, para vir deturpar e subverter aquele que era o espírito da

aplicação de uma lei absolutamente constitucional e que visa arejar, desenvolver e democratizar a participação

dos cidadãos portugueses.

Vozes do BE: — Muito bem!

A Sr.ª Presidente: — Queira terminar, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Ao tempo, o que se falava era que não poderiam prolongar-se os dinossauros

autárquicos, mas parece que eles reentram, por uma espécie de amizade serôdia, pelo Parque Jurássico.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Luís Fazenda, agradeço-lhe muito a questão

que colocou, sendo clara a discordância que temos relativamente a esta matéria.

O Sr. Deputado falou do princípio constitucional da renovação de mandatos. O princípio da renovação de

mandatos não é um princípio geral da nossa Constituição, é uma exceção que a nossa Constituição

estabelece em determinados casos.

O que a Constituição prevê é que não pode haver cargos vitalícios e estabeleceu, desde o início, uma

exceção ao princípio da renovação de mandatos no caso do Chefe de Estado, do Presidente da República,

tendo em conta as caraterísticas desse órgão, para enfatizar a forma republicana de governo; só muito mais

tarde se estabeleceu esta lei, que hoje estamos a discutir, relativamente aos presidentes de órgãos executivos

das autarquias.