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I SÉRIE — NÚMERO 83

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daqueles que a viveram, é também daqueles que por ela lutaram sem chegarem a vê-la tornada realidade e

daqueles que, por terem nascido mais tarde, nunca conheceram uma sociedade sem liberdade.

Minhas Senhoras e Meus Senhores: O 25 de Abril, com esta leitura abrangente, permitiu o reencontro de

Portugal com a Europa. Isso aconteceu décadas depois de a Europa ter reencontrado a sua paz e iniciado um

projeto de prosperidade que está indissoluvelmente ligado a dois conceitos: a economia social de mercado e o

modelo social europeu. Estas duas ideias mobilizadoras estão vivas, mas não são estáticas. E, porque o

mundo mudou muito, é preciso reformar os sistemas para podermos preservar os princípios.

Precisamente, a economia social de mercado e o modelo social europeu, na sua raiz e no seu destino, são

obra conjunta e património reivindicável de três grandes famílias políticas: a democracia-cristã, a social-

democracia e o socialismo democrático. Por isso, é natural que sejam estas famílias políticas a ter de enfrentar

os momentos e as causas de uma Europa manifestamente em crise.

Falemos, por isso, abertamente. É com inquietação que assistimos a um crescente debate no espaço

europeu, feito à volta de considerações simplistas, para usar um eufemismo, ou maniqueístas, para chamar as

coisas pelos nomes, ou mesmo moralistas, para ser um pouco mais audaz.

Falamos da crescente tentativa de dividir a Europa entre um Norte, que trabalha, e um Sul, que descansa;

entre um Centro, que poupa, e uma periferia, que gasta. Esta alegada divisão é absolutamente inaceitável.

A Europa só faz sentido com os países do Sul, com os países do Centro e com os países do Norte. A

Europa triunfará unida, mas cairá se for dividida.

A História ensinou-nos já muitas vezes, frequentemente através de conflitos trágicos, que a Europa será

coesa, ou não será.

No caso português, porque é de Portugal que nos cabe tratar antes de mais, é sempre bom lembrar que

basta olhar para o mar para percebermos a nossa centralidade. Tal como basta refletir na nossa própria

História para concluir que já há muitos séculos somos «globais».

E Portugal conseguirá, como sempre conseguiu, vencer com dignidade e responsabilidade os seus

problemas. Mas, não nos iludamos, os problemas não são apenas nossos, são cada vez mais europeus.

Precisamos de um Portugal com determinação e de uma Europa com visão.

Queremos uma Europa com visão estratégica, capaz de antecipar problemas, propor soluções e ver além

do momento presente. O projeto político da moeda única depende, sabemo-lo bem, de uma atitude de

responsabilidade e do respeito de todos os países por regras comuns de convivência. Portugal tem não só o

dever mas, sobretudo, o direito de honrar essa responsabilidade com que se comprometeu. Mais, a

esmagadora maioria destas regras são bons princípios, não só para a consolidação orçamental, como nos

habituámos a ouvir, mas, sobretudo, para uma economia sã, concorrencial e forte. Também aqui as dicotomias

estabelecidas são com frequência bastante simplistas.

Mas a esta responsabilidade com que Portugal se compromete corresponde necessariamente um princípio

— diria mesmo, um sentimento — de solidariedade entre todos os europeus. Responsabilidade e

solidariedade não são apenas dois valores. São dois pressupostos essenciais que não poderão sobreviver

sozinhos — um é condição imprescindível do outro.

O momento que vivemos em Portugal, muito em concreto o Plano de Assistência Económica e Financeira,

tornou esta constatação uma realidade particularmente evidente.

Queremos uma Europa que se orgulhe de pedir o razoável. Não queremos uma Europa que se arrependa

de exigir o impossível.

Minhas Senhoras e Meus Senhores: O momento em que agora estamos não é o primeiro momento difícil

que Portugal atravessa.

Olhando apenas para a nossa História recente, Portugal esteve por três vezes à beira da bancarrota.

Curiosamente, nenhum artigo da Constituição o impediu. Mas a nossa Constituição é como o 25 de Abril: não

é de alguns, deve ser de todos; não é apenas dos que aqui estão, é também dos que já partiram e dos que

hão de nascer. Foi por isso mesmo que nos batemos pela consagração constitucional de um limite à dívida

pública, porque a Constituição da República Portuguesa é o documento máximo que deve unir todos os

portugueses, de todas as gerações, de todas as convicções e de todas as filiações partidárias.

A sabedoria, a coesão social e a concórdia que os portugueses foram capazes de demonstrar, mesmo num

contexto de enormes, enormes sacrifícios, são bem demonstrativas daquilo que somos capazes de realizar.