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I SÉRIE — NÚMERO 83

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Em 1976, a Constituição da República Portuguesa consagrou, pela primeira vez, liberdades, garantias e

direitos essenciais, conquistados pelas massas em movimento. Foram momentos de grandes avanços

progressistas, que trouxeram ao povo a esperança de uma vida com a dignidade que merece. A aprovação da

Constituição constituiu uma vitória da Revolução de Abril e perspetivou como objetivo a construção de um País

mais livre, justo e fraterno.

Mesmo após 37 anos de política de direita e de sucessivas subversões da Constituição, as forças da

política de direita ainda não conseguiram aniquilar o património de liberdades e direitos conquistados com a

Revolução de Abril.

A política de direita aplicada por sucessivos Governos e a integração capitalista europeia, que provocaram

o aumento da exploração no trabalho, a diminuição de direitos essenciais e a destruição do nosso setor

produtivo são responsáveis pela situação em que hoje se encontra Portugal, marcada pela recessão, pelas

desigualdades e pelas injustiças.

Vivemos tempos de retrocesso civilizacional. Dois anos depois da aplicação das medidas que constam do

pacto de agressão da troica, os problemas agravaram-se.

Assistimos à reconstituição dos monopólios e à privatização de setores estratégicos da economia. Há mais

desemprego, mais exploração e mais empobrecimento. Há famílias que estão completamente desesperadas e

desamparadas, porque não conseguem fazer face às suas responsabilidades, devido ao roubo nos salários e

pensões, ao corte nas prestações sociais, ao aumento de preços de bens essenciais, ao aumento de impostos

para quem vive do seu trabalho e às dificuldades acrescidas no acesso à saúde e à educação. Hoje,

empobrece-se a trabalhar, por via de uma política de baixos salários. O desemprego aumentou para níveis

nunca atingidos desde o fascismo. Há um milhão e meio de trabalhadores em situação de desemprego e, em

relação aos jovens trabalhadores, 40% estão desempregados.

O compromisso com a troica é um verdadeiro compromisso contra Abril e contra os seus valores.

Perguntamos: que País é este, onde o Governo nada tem a oferecer aos jovens, que não seja desemprego,

precariedade e baixos salários? Que País é este, onde o Governo sugere aos jovens que emigrem e procurem

uma oportunidade profissional noutros países? Que País é este, onde o Governo compromete o futuro e o

desenvolvimento, e deixa para as gerações vindouras piores condições de vida?

O pacto de agressão da troica não é uma inevitabilidade. É, acima de tudo, uma opção política e ideológica

de quem o subscreveu e de quem o executa. Assume-se como um verdadeiro programa de liquidação das

conquistas de Abril e do regime democrático.

É por isso que a Grândola tem sido o hino da contestação a esta política.

Hoje, temos uma democracia empobrecida. O entendimento de democracia, explanado na nossa

Constituição, não se resume à democracia política, seja pelo voto em atos eleitorais, seja pela

representatividade e participação dos partidos políticos. A nossa Constituição contempla um entendimento de

democracia bem mais amplo, assente na democracia política, económica, social e cultural e por um País

independente e soberano.

Significa que não há democracia plena sem emprego com direitos, não há democracia plena sem saúde

para todos, não há democracia plena sem igualdade de oportunidades no acesso, frequência e sucesso

escolar em todos os níveis de ensino, não há democracia plena sem estarem satisfeitas as necessidades de

habitação e não há democracia plena sem a proteção social dos mais frágeis.

Os tempos que vivemos, em Portugal, evidenciam a atualidade e o alcance dos valores e das conquistas

de Abril. É preciso retomar o caminho de Abril e cumprir os princípios consagrados na Constituição da

República Portuguesa. Esta é a solução para os portugueses e o País.

A alternativa existe, mas ela não está na continuidade da mesma política, mesmo com outras caras, está

na rutura com esta política. Está na urgente renegociação da dívida, nomeadamente nos seus montantes,

taxas e prazos, para libertar recursos públicos que possibilitem o investimento na produção nacional. Está em

pôr o País a produzir e apostar na agricultura, na pesca e num programa de reindustrialização para reduzir a

nossa dependência externa e criar emprego com direitos. Está em redistribuir a riqueza criada através da

valorização dos salários e pensões, numa perspetiva de dinamização do mercado interno. Está em apoiar as

micro, pequenas e médias empresas e pôr fim às privatizações, assegurando um forte setor empresarial do

Estado. Está em garantir o Serviço Nacional de Saúde, a escola pública, o apoio social, a habitação digna.

Está em afirmar a nossa independência e soberania.