I SÉRIE — NÚMERO 83
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Mas, 39 anos depois, a pergunta mantém-se: como vivemos e sentimos, hoje, o 25 de Abril, ou seja, o dia
referencial das nossas liberdade e democracia? Como poderemos dotar de textura e de sentido, sobretudo
para as novas gerações, esta efeméride? Melhor, como cumprimos o 25 de Abril para que não seja uma
simples efeméride?
O 25 de Abril de 1974 prometeu e satisfez um programa que, à data, se tornou conhecido por ser o dos
«três D»: descolonização, democracia e desenvolvimento.
A democracia sedimentou-se com a Constituição de 1976, através da plenitude dos direitos, liberdades e
garantias e mediante a efetivação dos direitos económicos e sociais. O robustecimento das instituições
democráticas e a lógica da sociedade aberta conheceram um impulso decisivo com a entrada de Portugal nas
então Comunidades Europeias, em 1986, tornando o nosso País num parceiro na caminhada da integração
europeia — talvez o sonho mais lindo que a Europa conheceu nos últimos séculos apesar dos seus recentes
entorpecimentos.
O desenvolvimento de Portugal é inegável nestes 39 anos de liberdade e supera, em muito, aquilo que
seria expectável adquirir pelo mero decurso do tempo. O atual regime garantiu o acesso à educação, desde o
ensino básico ao universitário, universalizou os cuidados de saúde e providenciou os apoios sociais para os
mais carenciados, de um modo que não pode deixar de ser considerado como uma rutura de sentido com o
que acontecia antes de Abril de 1974.
O País foi dotado de um conjunto de equipamentos e de infraestruturas fortes e o poder local democrático
potenciou a qualidade de vida das populações aproveitando as vantagens de perspetiva e de ação da sua
intrínseca lógica de proximidade.
Contudo, se Portugal avançou muito na globalidade, esse desenvolvimento foi desigual sobretudo ao nível
territorial.
A título de exemplo, veja-se o Relatório sobre o Índice Sintético de Desenvolvimento Regional de 2010,
recentemente publicado pelo Instituto Nacional de Estatística, no passado dia 11 do presente mês, em que se
mede o resultado multidimensional das componentes da competitividade, coesão e qualidade ambiental, em
30 sub-regiões do País, incluindo as regiões autónomas.
Os resultados confirmam algumas das piores angústias dos que contemplam a litoralização consumada do
nosso desenvolvimento: apenas cinco sub-regiões situadas no litoral superam a média nacional e possuem
níveis europeus aceitáveis. As restantes 25 obtêm resultados medíocres ou francamente negativos.
Um País que após 39 anos de democracia e liberdade não consegue corrigir as assimetrias do território
falhou a lógica de um desenvolvimento pleno e legítimo — incapaz de existir se os meios e os instrumentos
aptos a realizá-lo estão concentrados numa breve faixa litoral do País, largando o resto do território à
desertificação e à astenia de capacidades e competências. É forçoso, nesta matéria, constatar um falhanço
objetivo de todos, mas todos os Governos constitucionais.
Aplausos do PSD.
Aí, não se cumpriu o sempre repetido grito de alegria de Sophia de Mello Breyner, quando cantava: «O dia
inicial inteiro e limpo onde emergimos da noite e do silêncio»…
A crise e as diversas respostas internas que esta originou desde 2008, agravaram este problema não
resolvido. O poder político, perante a iminência da crise financeira, não conseguiu escapar ao instinto natural
da «fuga para o centro», imitando os moluscos com carapaça quando pressentem uma ameaça. Em claro
contraste com os melhores exemplos europeus, Portugal é hoje um País em que o verdadeiro poder de
decisão se encontra bastante mais centralizado do que há uma década.
Sr. Presidente da República, Sr.ª Presidente da Assembleia da República, Sr. Primeiro-Ministro, Minhas
Senhoras e Meus Senhores: Num momento em que as lógicas de crescimento económico são um imperativo
da agenda política nacional, é tempo de superarmos este paradoxo. Não é possível realizarmos o desígnio de
gerar riqueza, emprego, fomento industrial e engrandecimento económico sem ser através de políticas
descentralizadas que aproximem o poder de decisão dos problemas que se visam resolver, das empresas e
das pessoas.
No contexto em que nos encontramos, o crescimento da economia é tão importante como foi o medrar da
democracia! Para tal, é necessário, também, que as políticas públicas sejam percebidas e reconhecidas como