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26 DE ABRIL DE 2013

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Decisivamente, é este espaço público, como instância viva da política e da democracia, que traça o abismo

entre os tempos sombrios de ontem e os tempos difíceis de hoje. É o espaço público, com a sua política

interventiva e criadora.

Porque o que é a política se não isso mesmo, exercício de uma vontade que renuncia ao egoísmo

confortável e ao distanciamento snob e que se atreve no desconforto da luz crua dos lugares públicos, para

rasgar o horizonte de uma justiça para todos. Uma justiça pública que a solidariedade particular e avulsa pode

ajudar, mas que nunca pode substituir.

Celebramos, pois, hoje, o espaço público com a sua política, que se recusa a ser lugar banal e oco de uma

relação de domínio sem sentido. Celebramo-lo como espaço vital da autonomia do sujeito, onde se manifesta

e cumpre a existência de cada um de nós. Porque, como disse Karl Jaspers, existir é agir em comum e

comunicar. Celebramos, pois, o espaço público, com as infinitas possibilidades que a liberdade pública é

capaz de deixar à felicidade privada.

Por isso mesmo, nestes tempos difíceis e de crise, temos que amar a democracia como nunca. Porque é

nas suas regras que coletivamente seguramos os estremecimentos do presente. Temos que amar essas

regras contrafactuais e intemporais e ler nelas o código das soluções, a cifra para os novos paradigmas de

organização do nosso tempo.

Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Minhas Senhoras e Meus Senhores: É este um tempo novo, de um

mundo novo e surpreendente, um mundo de interações, feitas pela economia e a tecnologia, tomando a

dianteira sobre os ritmos da política. É a sociedade mundial, da comunicação dos povos e do seu desafio do

muito por fazer. A ponte entre o universal e o particular, a igualdade entre indivíduos sobre tradições culturais

muito diferentes, o confronto ético entre a economia social de mercado e a outra economia, a integração dos

Estados para construir uma justiça equitativa entre os cidadãos e os povos. Como diz Hannah Arendt, a

solidariedade do género humano só pode ser relevante se estiver associada à responsabilidade política. Coisa

que tem já o seu prenúncio na afirmação kantiana de que é preciso escrever a História de um ponto de vista

cosmopolita.

E é sempre às bases da democracia que regressamos para enfrentar os novos desafios. Os desafios para

as muitas e novas realizações do contrato social, de acordo com os tempos, desafios da esperança política.

Também aqui Abril carregou um projeto moral e cosmopolita, numa espécie de intenção antes do tempo.

Pois, se há uma decifração para a crise, ela está em que a justiça, hoje, pressupõe a partilha política entre

os Estados e essa partilha apenas dá os primeiros passos. Os movimentos da sociedade económica vão muito

à frente das audácias da sociedade política. Ainda se ensaia por enquanto, e apenas se ensaia, a inteligência

cooperativa dos Estados, a que é capaz de adaptar as políticas públicas à nova escala do ambiente social.

Entretanto, a crise interpela-nos sobre a consistência do discurso da democracia. Os cidadãos pedem à

democracia que ela seja arte da liberdade, mas também arte de felicidade. Perguntam pelos seus resultados

nas formas concretas de vida, perguntam pelo seu conseguimento. Decididamente, o teste que é feito à

democracia é a justiça que ela é capaz de gerar.

Como está bem de ver no percurso da União Europeia que, enquanto comunidade de sucesso, conviveu

muito bem com a decisão política relativamente fechada nos gabinetes. Agora que é também comunidade de

riscos, testa a sua democracia na efervescência dos espaços vitais dos indivíduos e dos grupos e nas vivas

pretensões da rua. É sempre às bases do jogo que regressamos para refazer a justiça, é sempre aos seus

postulados mais intuitivos e evidentes que regressamos. A vida digna é indissociável da vida livre. A ideia

corre o dia a dia das pessoas, a inquietação dos Governos, a dor que dói sempre que enfraquecem os direitos

na nossa sociedade aberta.

Contra o desencanto democrático, todos temos que correr para vencer. Como se cada um de nós

carregasse sozinho a esperança do mundo.

Os cidadãos com o seu ativismo. Os media, comprometidos que estão com a verdade e os direitos

humanos. E, sobretudo, as lideranças políticas. Porque a política é, por natureza, a única ação capaz de uma

eficácia universal. A política tem esta capacidade de reprodução das coisas, que lhe permitirá fazer da

comunidade humana uma comunidade de comunicação moral. É aí, no mandato, que se afirma em toda a

linha o sentido de serviço, a lembrar-nos, de certo modo, aquela expressão bíblica que diz que o primeiro de

todos deverá ser o servo.