O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

31 DE MAIO DE 2013

35

Conheci-o às escondidas, pelo seu legado, pelos seus livros, 10 anos depois da sua morte, nos anos 70,

ainda quando os «lobos uivavam» e a censura reprimia a expressão.

Interpelado desde então, aqui o partilho hoje nesta Casa, na Assembleia da República, volvidos 50 anos

sobre a sua morte, que se cumpriram precisamente no dia 27 de maio.

Trago aqui a esta tribuna o homem, mas também o escritor, o cultor da palavra, o intérprete dos sons e o

político inquebrantável na defesa dos direitos do seu povo, das suas gentes, do seu território. Na defesa,

também e sempre, do interior de Portugal, ou não tivesse ele nascido no Carregal, aldeia de Sernancelhe,

vivido em Soutosa, aldeia de Moimenta da Beira, calcorreado Vila Nova de Paiva, Sátão, Viseu, Lamego e

tantos e tantos outros locais, nomeadamente, dos distritos de Viseu e da Guarda.

Encontramo-lo igualmente aqui, em Lisboa, em várias lutas, em vários movimentos; ou também no Porto ou

em Beja.

De todos os locais nos deixou marcas, retalhos, diálogos mais ou menos ficcionados na sua vastíssima

obra literária, ante um regime que sempre lhe quis açaimar a sua prosa carregada de verdades duras.

Foram inúmeras as geografias sentimentais de Aquilino, foram muitos os seus espaços de intervenção,

foram intensos os seus trajetos em 78 anos de vida.

Quem nunca saboreou nacos dessa prosa aquiliniana? Dessa prosa telúrica, prenhe de uma cultura

genuinamente beirã? Dessa prosa densa de recortes de vida?

Quem nunca sorveu textos, outrora censurados porque em defesa dos seus oprimidos e calejados

concidadãos residentes nas serranias da Nave, de Leomil ou da Lapa?

Quem não conhece figuras míticas — o Malhadinhas ou o juiz de Barrelas? Ou essas obras intemporais —

O Romance da Raposa, O Livro da Marianinha, A Casa Grande de Romarigães ou Quando os Lobos Uivam?

Estas e tantas outras obras fizeram, e fazem, de Aquilino Ribeiro, evidentemente, um dos nossos maiores

escritores do século XX. Evidência que nos é dada pela vastíssima obra publicada, mas também pela proposta

do seu nome, por escritores de diversos países, para Nobel da literatura. Evidência que, em 2007, levou a

Assembleia da República a conceder aos seus restos mortais honras de Panteão Nacional, local onde

repousam aqueles que, pela grandeza das suas vidas e pela grandeza das suas obras, se perpetuam para

além da debilidade da nossa memória, da memória humana.

Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Contudo, a vida de Aquilino foi também uma vida de exílios.

Começaram bem cedo, em 1908, aos 23 anos, quando, como opositor da monarquia, se viu exilado em Paris,

onde estudou até que a implantação da República o trouxe, de novo, a Portugal para ser professor no Liceu

Camões e bibliotecário na Biblioteca Nacional.

E é Paris que, em 1927 e 1928, o recebe de novo como exilado. Nestes dois casos, por participação em

movimentos militares contra a ditadura entretanto instaurada e que veio a abrir as portas a Salazar. No

segundo caso, depois de ser preso em Mangualde e se ter evadido do presídio do Fontelo, em Viseu.

E foi precisamente em Paris, durante este terceiro exílio, que nasceu o seu segundo filho, Aquilino Ribeiro

Machado, falecido em outubro de 2012, que foi presidente da Câmara Municipal de Lisboa; o primeiro eleito

democraticamente, nas listas do Partido Socialista, depois da Revolução de Abril de 1974. Aqui também o

evoco: um lutador, um democrata, também um homem de causas.

E se Aquilino foi, de facto, um grande escritor, ele foi de igual modo um enorme político, que pagou cara a

sua dureza de cerviz. Ou não tivesse estado ele ao lado de Norton de Matos e apoiado Humberto Delgado; ou

não tivesse ele inspirado e se inspirado no MUD; ou não tivesse ele sempre lutado pelo seu povo contra as

injustiças de um regime em que reinava o nepotismo.

Defensor incansável da sua terra, do interior, onde pontifica um povo de rija têmpera, Aquilino veio a ser

perseguido e enxovalhado no final dos anos 50, na sequência do seu romance, entretanto apreendido,

Quando os Lobos Uivam, que nos representa a saga dos beirões ante o Estado Novo na defesa dos terrenos

baldios.

E se muitos o esqueceram, e esquecem, Viseu e a região lembram-no.

O seu nome está ligado à Fundação Aquilino Ribeiro, sedeada em Soutosa, integrada pelos municípios de

Moimenta da Beira, de Sernancelhe e de Vila Nova de Paiva; ao Centro de Estudos Aquilino Ribeiro; à escola

básica dos 2.º e 3.º ciclos de Vila Nova de Paiva; à biblioteca municipal de Moimenta da Beira; ao auditório

municipal de Sernancelhe; ao parque da cidade de Viseu; à revista Aquilino; a colóquios; a conferências; a

exposições; a feiras; e à toponímia, nos mais diversos locais.