I SÉRIE — NÚMERO 23
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E, Sr.ª Ministra, esta proposta de lei e a intervenção da Sr.ª Ministra não seria estranha em França, mas,
em Portugal, não é aceitável. E não seria estranha em França, porque, em França, o Ministério Público é
dependente do poder executivo, mas, em Portugal, não. Em Portugal, há uma obrigação constitucional de
respeito pela autonomia externa do Ministério Público. E, Sr.ª Ministra, esta proposta de lei não respeita essa
liberdade e essa autonomia externa do Ministério Público.
A Sr.ª Ministra sabe que a autonomia do Ministério Público é uma imposição constitucional e uma garantia
dos cidadãos, e é um reflexo do princípio da separação com interdependência de poderes.
A Sr.ª Ministra sabe que do que estamos a tratar hoje é da indicação de um membro nacional para uma
autoridade judiciária internacional. E, respeitando a autonomia do Ministério Público, o Governo deve ter um
papel meramente formal naquilo que é a indicação de um membro nacional para a Eurojust.
A Sr.ª Ministra da Justiça: — E tem!
O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr.ª Ministra, a intervenção do Governo neste processo, como é proposto na
proposta de lei, não é uma intervenção, é uma interferência. O afastamento do Conselho Superior do
Ministério Público e o reforço dos poderes da Procuradoria-Geral da República é uma má opção, que não tem
a ver com quem exerce as funções mas, sim, com o modelo e a arquitetura orgânica do Ministério Público.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Queira concluir, Sr. Deputado.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Vou concluir, Sr.ª Presidente.
Esta proposta de lei, naquilo que prevê de definição dos correspondentes nacionais na Eurojust é uma
intromissão na autonomia do Ministério Público e é um condicionamento da liberdade de organização interna.
E, Sr.ª Ministra, esta proposta de lei, tal qual está, não tem rigorosamente nada a ver com as obrigações de
cumprimento da Decisão-Quadro. Ela é o aproveitamento da Decisão-Quadro para ir a matérias que não
tinham a ver com a Decisão e matérias que dificilmente conseguem ser explicadas sem atender àquela que é
uma questão de fundo (e não é um mexerico ou uma questão lateral): a decisão do Governo de não dar
seguimento a uma proposta do Conselho Superior do Ministério Público para renovar uma comissão de
serviço do membro nacional da Eurojust é um problema, Sr.ª Ministra, que traduz tudo aquilo que entendemos
negativo, que é a interferência do Governo naquilo que deveria ser uma responsabilidade exclusiva do
Ministério Público.
Aplausos do PCP.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Telmo Correia.
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Ministra da Justiça, Sr.ª Secretária de Estado dos
Assuntos Parlamentares e da Igualdade, Sr.as
e Srs. Deputados: Neste ponto do debate, quero deixar duas ou
três notas sobre a posição do CDS nesta matéria.
Em primeiro lugar, para sublinhar aquilo que, de facto, me parece o mais importante, independentemente
de todos os incidentes laterais de que aqui temos estado a falar, que é o facto de estarmos perante uma
Decisão do Conselho da União Europeia — a Decisão 2009/426/JAI, de 16 de dezembro de 2008 — que
carecia obviamente de iniciativa legislativa para Portugal poder acompanhar essa mesma Decisão relativa à
Eurojust.
Em segundo lugar, para referir aqui, e para que se perceba, tanto a importância da Eurojust como a
urgência desta proposta de lei.
A importância da Eurojust deve-se ao facto de, como já aqui foi explicado, e bem, se tratar de um
organismo fundamental em matéria de cooperação judiciária — e isto é o mais relevante de tudo — e de um
organismo decisivo para, como aqui foi explicado pelo Sr. Deputado João Lobo, atuar na criminalidade
transnacional, designadamente em crimes como o terrorismo, a corrupção, enfim, crimes da maior
importância, cujo combate é absolutamente necessário e indispensável.