I SÉRIE — NÚMERO 49
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O Sr. António Filipe (PCP): — Num momento em que as bolsas de investigação científica sofrem cortes
drásticos, assistimos a discursos piedosos sobre a indispensabilidade da inovação para ultrapassar a crise.
No momento que em vemos até um comissário europeu, ontem, em Lisboa, com toda a hipocrisia do
mundo, a zurzir na austeridade e nas suas consequências nefastas, temos o Primeiro-Ministro a dizer no
Tramagal que agora, sim, os portugueses estão a viver de acordo com as possibilidades, o FMI a dizer que é
preciso alterar ainda mais, para pior, a legislação laboral, e temos o Governo, hoje mesmo, a aprovar em
Conselho de Ministros novas regras para facilitar ainda mais os despedimentos.
No momento em que acaba de aprovar, no Orçamento retificativo, novos cortes nas reformas e nos
salários, o Governo pretende diferir os seus efeitos para depois das eleições europeias, para que os
portugueses afetados não «sintam na pele» os efeitos dessas medidas antes de ir a votos.
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Exatamente!
O Sr. António Filipe (PCP): — Entretanto, o Ministro Poiares Maduro vai percorrendo o País a anunciar os
milhares de milhões que hão de vir da União Europeia para nos garantir um futuro radioso.
É esta a realidade com que os portugueses se confrontam: um Governo a empobrecer o País e a criar
excêntricos todos os dias.
Aplausos do PCP.
Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: A mais recente operação mistificatória do discurso propagandístico do
Governo chama-se, agora, «saída limpa». Quando se tratou de negar a inevitabilidade de um segundo
resgate, foi inventado o «programa cautelar». Quando se começou a perceber que o «programa cautelar» não
era mais nem menos do que a nova designação da troica, foi posta a circular a «saída limpa» e foi
encomendado o champanhe para a semana anterior às eleições europeias.
E como que para dar credibilidade a essa operação, foi anunciado mais um sucesso no regresso aos
mercados: o Governo conseguiu a enorme proeza de se endividar a uma taxa de juro proibitiva, superior a 5%,
para poder pagar os juros das dívidas anteriores.
Enquanto se mantiver este Governo e esta política, enquanto se mantiver a sujeição às imposições da
troica e do seu Memorando, enquanto se mantiver a obediência cega à ditadura dos mercados e dos
especuladores e enquanto se aceitar como inevitável que haja cada vez mais pobres para que os ricos sejam
cada vez mais ricos, não haverá saída limpa de espécie nenhuma. Quem lançou o País na lama não lhe pode
prometer uma «saída limpa».
Chamem-lhe «saída limpa», «programa cautelar», «ajustamento», chamem-lhe o que quiserem, o que
oferecem aos portugueses, à grande maioria, a quem trabalha ou trabalhou uma vida inteira, a quem estuda
ou quer estudar para ter uma vida digna é a condenação à pobreza, ao abandono ou à emigração.
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Exatamente!
O Sr. António Filipe (PCP): — Portugal está hoje muito pior do que estava antes do Memorando da troica.
O País tornou-se mais pobre, mais injusto e mais desigual.
A única saída limpa e digna para Portugal exige uma rutura clara com este Governo e com esta política.
Enquanto o País estiver amarrado à agiotagem e a ter de suportar os juros insuportáveis do endividamento a
que nos obrigaram para satisfazer a ganância dos especuladores, não haverá crescimento económico que nos
permita sair deste círculo vicioso.
A renegociação da dívida nos seus montantes, juros e prazos, e a adoção de políticas públicas capazes de
melhorar as condições de vida dos portugueses e promover o crescimento económico são condições
indispensáveis para, aí sim, uma saída limpa. Não a que o Governo promete, mas a que o País exige e está
ao alcance do povo português.
Aplausos do PCP.