1 DE MARÇO DE 2014
27
projeto de resolução porta-bandeira das pessoas que estão contra o Acordo, e isso é legítimo, mas a partir do
momento em que os seus proponentes deixaram cair as possibilidades de um grupo de trabalho que,
eventualmente, poderia propor a desvinculação ou a suspensão do Acordo Ortográfico, depois, deixaram cair
o prazo do grupo de trabalho e, agora, deixaram cair a exposição de motivos. Quer dizer, ficamos com a ideia,
sem acinte, de que há um certo despedaçamento da iniciativa original e, nessa medida, não levarão a mal que
votemos contra porque nos parece de uma patente desnecessidade votar um grupo de trabalho que fará, sem
mais, aquilo que fez a própria Assembleia da República.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para intervir, em nome do PS, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos
Enes.
O Sr. Carlos Enes (PS): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Saúdo os peticionários que trouxeram a
este Plenário um tema que tem sido objeto de análise, na nossa sociedade, já lá vão alguns séculos.
Em 1540, João de Barros já defendia o critério fonético por oposição ao etimológico, propondo a eliminação
das chamadas consoantes ociosas. O Acordo de 1990 foi, assim, herdeiro do espírito humanista, iluminista e
republicano que visava uma simplificação da escrita com vista a combater o analfabetismo.
Este propósito obteve a aprovação desta Assembleia em vários momentos, mas foi mais além,
transformando-se num tratado internacional que engloba os países falantes da língua portuguesa. A iniciativa
concretizou-se num Governo do PSD, continuando o seu percurso com o Governo do PS, que passou à fase
da sua aplicação.
Foi grande o esforço do País na formação de professores, na elaboração de manuais, de dicionários e
outros materiais de apoio pedagógico. Desde então, até ao presente, o Ministério da Educação não registou
casos de dificuldades na implementação do Acordo Ortográfico.
De uma forma generalizada, a sociedade portuguesa seguiu o mesmo percurso. Recorde-se que o Acordo
é aplicado por todas as redes televisivas de canal aberto, por todos os operadores de telecomunicações, por
mais de 90% do mercado editorial, por 9 dos 10 jornais mais vendidos, pela quase totalidade das maiores
empresas, pelas universidades e organismos públicos.
O Acordo Ortográfico tem vindo a ser aplicado em Portugal e no Brasil, e a vontade política de prosseguir o
caminho foi reafirmada, recentemente, pela Presidente Dilma Rousseff, em comunicado conjunto com o
Primeiro-Ministro Passos Coelho.
No seio dos restantes membros da CPLP, cada País está a implementá-lo ao seu ritmo próprio. A vontade
política permanece e o caminho está a ser feito, como podemos constatar através de um comunicado recente
da CPLP em relação a Timor Leste.
A prova de que o Acordo Ortográfico está vivo e que os seus objetivos continuam válidos foi agora
evidenciada. À última da hora, os Deputados enquadrados na maioria retiraram do seu projeto de resolução os
dois pontos que propunham a revogação do Acordo Ortográfico. Em boa hora o fizeram, mas o texto
introdutório continua eivado de um espírito contrário ao Acordo e as restantes recomendações são
desprovidas de sentido, na medida em que o Governo já tem competência para executá-las.
Vozes do PS: — Muito bem!
O Sr. Carlos Enes (PS): — A perspetiva deve ser a de caminhar com segurança, limar arestas, obter mais
consensos.
A sua revisão é uma possibilidade sempre em aberto, na medida em que uma língua é um corpo vivo. O
texto do Acordo não é uma bíblia sagrada, mas essa revisão terá de ser feita após um período mais longo de
maturação e experiência no terreno.
A aplicação do Acordo ainda está a decorrer no ensino básico e secundário e a publicação do vocabulário
ortográfico comum está em fase de ultimação, para ser conhecida ainda este ano.
Estranhamente, ou talvez não, muitos dos que denunciaram a implementação apressada do Acordo são os
mesmos que, agora, pretendem a sua revisão à pressa.