I SÉRIE — NÚMERO 92
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Lembramo-nos bem dos inflamados discursos sobre a ganância dos banqueiros e dos especuladores,
sobre a necessidade de moralizar o sistema, de acabar com os paraísos fiscais, de implementar um imposto
sobre as transações financeiras ou de eliminar os «produtos» financeiros derivados de alto risco. Deste
denodado, mas falso, impulso reformador restou apenas o quadro regulamentar de Basileia III, acolhido com
bonomia pelos banqueiros, um quadro regulamentar que foi determinado pelo próprio capital financeiro e à
exata medida dos seus interesses.
A Diretiva e o Regulamento europeus, que o Governo pretende agora transpor para a ordem jurídica
interna, constituem mais um passo no processo de concentração monopolista do setor financeiro à escala
europeia. Representam mais uma machadada nas soberanias nacionais e na possibilidade de desenvolver um
setor financeiro ao serviço da economia real e das necessidades dos povos.
Criam-se maiores dificuldades, custos e obstáculos aos bancos de pequena escala, ao mutualismo e ao
setor cooperativo, promovendo uma ainda maior concentração e centralização da riqueza nos grandes bancos.
Sujeita-se todo o setor financeiro às mesmas regras, procurando eliminar aquelas que, em alguns casos, ainda
defendiam, ou tinham o potencial para defender, a especificidade nacional de cada país e as necessidades de
financiamento da economia real.
Não tenhamos dúvidas, não são medidas como estas que porão cobro à especulação financeira ou que
impedirão que o grande capital financeiro continue a parasitar a economia real! O que o País necessita é de
um setor financeiro controlado pelo Estado e ao serviço do desenvolvimento económico e social.
Aplausos do PCP.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Filipe
Soares.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Secretária de Estado dos Assuntos Parlamentares
e da Igualdade, Sr. Secretário de Estado das Finanças, Sr.as
e Srs. Deputados: O debate de hoje sobre a
proposta de lei do Governo é da maior importância.
Todos percebemos que é necessário «ter mão» num sistema financeiro que vive acima do controlo
democrático que deveria existir e todos percebemos também que na Europa, apesar de se fazerem muitas
«juras de amor» a uma maior transparência, a uma maior fiscalização, estamos no mesmo continente que
ainda continua a ter, bem no seu coração, vários paraísos ficais.
Ora, com esta falta de controlo e com esta permissividade, compreendemos como é que nascem diretivas
como a que estamos a discutir e que está na génese desta legislação do Governo e como, por outro lado, fica
muito aquém do que deveria ser feito em algumas das matérias e noutras são encontradas soluções
completamente erradas.
Vamos começar pelas soluções erradas.
Esta legislação responde às dúvidas que existem atualmente sobre como é que o Banco de Portugal deve
agir, por exemplo, relativamente ao BES, à Espírito Santo Internacional, àquilo que se passa nesta enorme
fraude do sistema financeiro, com impactos nacionais até nos aforradores? A responde é: «Não. Não,
responde!»
Ainda na sexta-feira passada, quando questionado sobre esta matéria, disse um representante do Banco
de Portugal: «Não, não está nas nossas competências. Nós só podemos agir no que toca ao espaço nacional.
O que vai para além disso não está na nossa competência». Pergunta-se: então, está na competência de
quem?
E vai-se andando de imbróglio jurídico em imbróglio jurídico para perceber que, na verdade, está em terra
de ninguém. É exatamente esse o problema desta legislação: não cria mais reforço nesta matéria. Por outro
lado, cria é uma maior concentração das instituições financeiras.
Assim, são dados mais passos no caminho daquelas instituições que se dizem sempre que são ou
demasiado grandes para que se deixe cair ou, por outro lado, demasiado grandes para que se consiga
controlar. É este o resultado da aplicação desta legislação.
Traz-nos a transparência que era necessária? A verdade é que não, fica ainda muito aquém, porque
continua na senda deformada de olhar para o sistema financeiro e o Banco Central Europeu — essa entidade