I SÉRIE — NÚMERO 24
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está, porventura, demasiado vinculado a uma conceção da economia e da sociedade que confunde
competitividade com anacronismo e crescimento com irresponsabilidade orçamental.
Todos seremos avaliados pelo reformismo das soluções que apresentarmos neste debate. Não podemos
estar sempre a proclamar que há mais vida além do défice e mais vida além da dívida e, depois, na prática
olvidarmos a importância da superação dos outros défices estruturais, quase crónicos, que nos impedem de
crescer sustentada e sustentavelmente.
Uma verdadeira estratégia pós-troica implica responsabilidade orçamental, reformas estruturais e um
quadro de investimento seletivo e produtivo em áreas estratégicas, como é o caso da economia verde.
Foi neste contexto de aposta no crescimento verde que decidimos avançar com o processo de reforma da
fiscalidade verde há 10 meses, em primeiro lugar, porque é necessário melhorar a eficiência na utilização de
recursos, reduzir a dependência energética do exterior e induzir comportamentos, quer ao nível da produção
quer ao nível do consumo, mais sustentáveis, reforçando a liberdade e a responsabilidade dos cidadãos e das
empresas.
É verdade que Portugal conseguiu atingir indicadores da maior relevância no plano da sustentabilidade,
mas não é menos verdade que ainda perdemos 40% da água que distribuímos, que depositamos 50% dos
resíduos em aterro, que consumimos um número record de sacos plásticos por habitante por ano, que
importamos, todos os anos, 7000 a 10 000 milhões de euros de combustíveis fósseis, que exibimos uma
intensidade energética e uma intensidade dos transportes no PIB demasiado elevadas e que apresentamos
uma elevada vulnerabilidade às consequências das alterações climáticas.
Repito: há mais défices e mais dívidas além daqueles de natureza financeira e orçamental. A superação,
como tem vindo a suceder, dos problemas de natureza financeira e orçamental é condição necessária, mas
não suficiente, para o desenvolvimento e para o crescimento sustentáveis. Temos de ousar e de romper com
visões conservadoras que nos acompanham há demasiado tempo. É tempo de assumir uma resposta
estrutural para problemas igualmente estruturais.
Em segundo lugar, a reforma fiscal verde insere-se num objetivo mais abrangente de promoção de uma
política fiscal mais alinhada com os objetivos de crescimento e de emprego.
O desígnio do desagravamento futuro da carga fiscal não é matéria de controvérsia, todos o defendemos,
mas existe um outro debate para o qual o nosso sentido reformista é mais fortemente interpelado: num quadro
de neutralidade fiscal, isto é, num cenário em que ainda não é possível desagravar, como todos desejamos, a
carga fiscal global, é ou não possível, e até desejável, reequilibrar a carga fiscal, tributando mais o que se polui
e degrada para tributar menos aquilo que se aufere e se produz? Entendemos que sim, seja por razões
conceptuais, que estão, aliás, em linha com as recomendações de todas as organizações internacionais, seja
pela constatação de um desequilíbrio acentuado nas duas últimas décadas.
Em 20 anos, o peso dos impostos sobre o trabalho e sobre as empresas cresceu mais do que os impostos
sobre a poluição e sobre a degradação de recursos.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Agora nem se fala!…
O Sr. Ministro do Ambiente, Ordenamento do Território e Energia: — Logo, é fundamental reequilibrar
a carga fiscal.
Com esta motivação, o Governo avançou para uma reforma fiscal que, pela primeira vez, não só aborda
transversalmente todos os setores e todos os recursos como, também pela primeira vez, avalia os impactos
ambientais, económicos e no emprego das opções tomadas. Não confundamos impostos e taxas aprovadas
de modo avulso e fragmentado ao longo de anos com uma reforma integral e abrangente da fiscalidade verde.
Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, repito aquilo que vezes sem conta tenho dito: a fiscalidade verde não
aumenta impostos, substitui impostos. A neutralidade fiscal nunca foi uma mera hipótese, foi sempre um
pressuposto — um pressuposto que se verificou na prática. Sem a garantia da neutralidade fiscal — isto é, de
utilização da receita da fiscalidade verde para desagravar outros impostos —, não haveria reforma da
fiscalidade verde.
Por outro lado, os outros pressupostos também foram cumpridos. A fiscalidade verde é amiga do
crescimento e do emprego, como está comprovado na avaliação de impacto realizada pela comissão de
reforma.