26 DE MARÇO DE 2015
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Quanto aos apoios vindos de Bruxelas — e para terminar, Sr.ª Presidente —, que são importantes para o
desenvolvimento da agricultura nacional, queria dizer-lhe, Sr. Deputado, que, devido ao próximo quadro
comunitário, até 2020, virão para Portugal 26 000 milhões de euros.
Sabe o Sr. Deputado quanto é que vai sair em pagamento de juros, só para a União Europeia? 60 000
milhões!
Se estes dados não lhe merecem reflexão nenhuma, pois a mim merecem muita reflexão e muita
preocupação.
Aplausos do PCP.
A Sr.ª Presidente: — Para uma declaração política, tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Pinto.
A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: O Bloco de Esquerda pede a vossa
atenção para a situação que se vive desde ontem no bairro de Santa Filomena, no concelho da Amadora.
O bairro de Santa Filomena é um bairro de gente pobre, as casas foram construídas pelos próprios, mas é
um bairro e aquelas casas são as suas casas, as únicas casas que têm e agora estão a ser destruídas.
As retroescavadoras entraram no bairro e levaram tudo pela frente. São as demolições, Sr.as
e Srs.
Deputados! Esta não é a primeira vez, mas cada vez que voltam é a primeira vez para as famílias que ficam
sem teto e que veem os seus pertences espalhados na rua e misturados com o entulho.
Sabemos que o problema é complexo, sabemos que a erradicação das barracas é um desígnio difícil, mas
também sabemos que foi conseguido por muitos municípios e vários na Área Metropolitana de Lisboa.
Sabemos que a Amadora tem uma concentração muito elevada de bairros sem condições de
habitabilidade, mas também sabemos que muito pouco foi feito para resolver este problema que mexe com os
direitos humanos, o direito à habitação.
O Programa Especial de Realojamento não foi cumprido na Amadora. A política foi a de «empurrar com a
barriga para a frente», esquecendo que falamos de pessoas, de cidadãos e de cidadãs, com os mesmos
direitos que todos os outros, e hoje somos confrontados com um espetáculo que não é digno de um Estado de
direito e de uma democracia. Somos todos e todas confrontados e nós, Deputados e Deputadas da República,
por maioria de razão, não podemos ficar indiferentes.
Aplausos do BE.
A D. Dulce veio de Cabo Verde, sozinha, em busca de uma vida melhor. Deixou lá quatro filhos, esteve 10
anos, repito, 10 anos sem ver os filhos. Trabalha de manhã à noite num restaurante para amealhar, para
mandar buscar os filhos, como ela própria diz. Hoje, está doente e ainda tem dois filhos a cargo, um com
deficiência. Tem uma casa humilde, mas organizada. Não tem para onde ir, está simplesmente à espera da
retroescavadora. Ninguém fala com ela. A Câmara não avisa sobre quando será a demolição. Espera, até que
lhe batam à porta. Ninguém lhe perguntou como vai ser o dia seguinte.
Ontem, foram demolidas oito casas, desalojando 28 pessoas, incluindo crianças. Hoje, não sabemos ainda
quantas serão. Ao fim do dia alguém fará o balanço. Mais destroços se juntarão aos que já lá estão, sem o
mínimo cuidado em relação ao perigo que representam para as crianças que ainda vivem no bairro.
Ao fim do dia, haverá mais umas quantas famílias que irão pedir abrigo a familiares e amigos, sobrelotando
outras casas, onde a fartura não existe nem nunca existiu.
As demolições são acompanhadas pela Polícia Municipal e pela PSP, através do Corpo de Intervenção
rápida. Um número de agentes da polícia completamente desproporcional em relação aos moradores fazem a
barreira e estão prontos a intervir, como se os moradores, muitos dos quais velhos e crianças, constituíssem
uma ameaça à segurança das retroescavadoras…
O Comandante da Polícia Municipal é responsável pela ação. Perguntado sobre a decisão que sustenta
essa ação, sobre a notificação aos moradores, apenas diz que foi decisão da Câmara. E onde está a decisão
da Câmara, escrita, para dela termos conhecimento? Não está, não existe!