I SÉRIE — NÚMERO 80
18
A Sr.ª Ministra da Justiça: — Que falta de argumentos!
A Sr.ª Isabel Oneto (PS): — Sejamos claros: o crime de pedofilia é muito perverso, já o dissemos. Atinge-
nos a todos. Nenhum cidadão fica indiferente sempre que uma criança é vítima de tais crimes. Reagimos
emotivamente enquanto seres que sentem, que sofrem e que querem reagir ao crime que renega os valores
que mais estimamos. Mas não deve ser o Estado por isso mesmo racional, longe da emoção própria da
natureza do ser e procurar a justa medida da ação e da reação?
Diz o Ministério da Justiça que a medida é preventiva. É mais do que isso. É uma medida de segurança
constitucionalmente proibida.
Aplausos do PS.
Sr.ª Presidente, é perigoso um Estado que nos põe a espiar uns aos outros. É hipócrita um Estado que
lança sobre os cidadãos o ónus da prevenção, deixando as crianças entregues ao seu destino quando as
retira aos técnicos de prevenção de crianças e jovens em risco. E isso é inconstitucional, manifestamente
inconstitucional, como o referem todos os pareceres, quer da magistratura judicial, quer do Ministério Público,
quer da Ordem dos Advogados, quer da Comissão Nacional de Proteção de Dados, como referiu ainda ontem.
O Sr. José Magalhães (PS): — Bem lembrado!
A Sr.ª Isabel Oneto (PS): — É tempo de olhar para a justiça, no sentido constitucional mais amplo. Ou
seja, olharmos para a forma como o Estado trata o seu cidadão, porque é nessa relação dia-a-dia que se
constrói, que se densifica e se concretiza o Estado de direito democrático. Mas o inverso também é
verdadeiro: o Estado de direito democrático também se desconstrói, também se esvazia, também se sufoca
quando o cidadão, ignorado na plenitude da sua essência, deixa de o ser e passa a ser um mero instrumento
do poder. E é também este ponto de viragem que aqui hoje estamos a debater.
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente: — Para apresentar o projeto de lei n.º 886/XII, do PCP, tem a palavra o Sr. Deputado
João Oliveira.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Ministra da Justiça, Sr.as
e Srs. Deputados: O PCP traz
hoje a esta discussão um projeto de lei com um conjunto de medidas tendo em vista a aprovação, neste
Parlamento, de uma estratégia nacional para a proteção das crianças contra a exploração sexual e os abusos
sexuais. É que, Sr.ª Ministra, julgo que se há coisa sobre a qual, nesta Sala, nunca encontrará opinião
diferente é a de que o combate aos abusos sexuais e à exploração sexual das crianças deve merecer todo o
empenho, seja qual for a perspetiva política que tenhamos nestas questões.
O Sr. António Filipe (PCP): — Muito bem!
O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr.ª Ministra, não me vou debruçar sobre qualificações à sua intervenção,
mas, das referências concretas que fez, retirava apenas a conclusão de que tudo isso deve motivar todo o
empenho, seja qual for a perspetiva política que cada um tenha, na prevenção e no combate aos abusos
sexuais e à exploração sexual das crianças.
Por isso, Sr.ª Ministra, ao contrário do que faz a proposta de lei do Governo, apresentamos aqui um projeto
que coloca como prioridade não o combate à reincidência, não a prevenção da reincidência, mas a prevenção
do primeiro abuso sexual contra as crianças e os jovens. Apresentamos um conjunto de propostas e de
medidas que, de forma articulada, não só em função de diferentes responsabilidades mas em diferentes
esferas de ação e de intervenção, procura criar um quadro de intervenção com o objetivo de prevenir e