I SÉRIE — NÚMERO 84
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O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Michael
Seufert.
O Sr. Michael Seufert (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: De facto, a proposta que hoje aqui
apreciamos é aparentemente uma proposta sensata, eu diria que faz sentido, mas não acompanho as ideias
do Partido Socialista sobre o que é cidadania. Julgo que ato de cidadania é ter mais rendimento disponível,
pagar menos impostos e fazer com o rendimento o que se quiser; entregar dinheiro ao Estado para ser o
Estado a redistribuir, perdendo na máquina fiscal, e chamar a isso cidadania, não me parece. Percebo que
isso nos divida, é da vida e é das coisas fundamentais que dividirá sempre o CDS dos partidos mais
socialistas.
Em relação a esta questão concreta, a Sr.ª Deputada Gabriela Canavilhas referiu tratar-se de uma questão
simples, e eu diria, possivelmente, demasiado simples. Isto porque a questão da consignação do IRS é uma
questão técnica e juridicamente muito complexa.
No quadro atual, as entidades que beneficiam dessa consignação são necessariamente entidades coletivas
de utilidade pública, reconhecidas para o efeito de acordo com a legislação em vigor e, por exemplo, sempre e
em coerência com isso, isentas de IRC.
Além disso, o Estatuto das Pessoas Coletivas de Utilidade Pública torna obrigatório que a consignação de
IRS não vise a distribuição de receitas que são do Estado para fins diferentes àqueles que o Estado
prossegue. Isso é um princípio fundamental do ordenamento jurídico tributário e da legislação comunitária.
Portanto, têm de ser fins de interesse geral, da comunidade nacional, da região ou da circunscrição, têm de
cooperar com a administração central ou a administração local, nos termos da lei, e, por isso, merecem o
estatuto e a declaração de utilidade pública.
Assim, Srs. Deputados, as entidades que hoje beneficiam de consignação de IRS são entidades que nunca
podem ter fins lucrativos. Ainda que a Sr.ª Deputada tenha referido isso na sua intervenção, não o colocou no
projeto de lei e tem de colocar, porque é matéria reservada e exclusiva da Assembleia da República definir as
competências da consignação e não pode ser o Governo depois, por via de portaria ou, sequer, por via de
decreto-lei, a densificar os conceitos desta lei. Obrigatoriamente, como sabe, até por imperativo constitucional,
é o Parlamento a fazer isso. Portanto, refere-se a entidades exclusivamente dedicadas à atividade sem fins
lucrativos e que não podem ter atividades económicas em concorrência com outras entidades que não possam
beneficiar desse mesmo estatuto da consignação.
A Sr.ª Deputada não colocou isto na proposta; se tivesse encontrado uma forma de o colocar, julgo que nos
podíamos aproximar, mas digo-lhe que não consigo encontrar uma forma de fazer isso sem esvaziar a lei de
conteúdo e sem reduzir a zero o número de entidades que dela beneficiaria.
É que, por exemplo, é preciso garantir também que estas entidades, pelos seus estatutos, não prosseguem
nunca os benefícios de interesses privados dos seus associados ou dos seus fundadores, como é o caso,
legitimamente, em muitas destas entidades.
Portanto, sem densificar aquilo que o projeto de lei não diz em lado nenhum, ou seja, o que são pessoas
coletivas públicas ou privadas que desenvolvam atividades de natureza e interesse cultural, sem explicar que
essas entidades têm de ter de interesse público, portanto, têm de ser pessoas coletivas de utilidade pública,
resta-nos concluir que podíamos estar aqui a violar as regras comunitárias do auxílio do Estado, na medida em
que estas entidades estão colocadas num setor em concreto,…
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor de terminar.
O Sr. Michael Seufert (CDS-PP): — … não esquecendo as exigências que o Governo e a lei já fazem às
IPSS que beneficiam da consignação de IRS.
Percebo o interesse que isto poderia ter, acho que seria interessante se conseguíssemos encontrar uma
forma, mas uma lei assim colocaria em claro pé de desigualdade estas novas entidades, dadas as exigências
que se fazem às entidades que atualmente beneficiam de consignação de IRS, e estas que se pretendem
incluir, incorrendo, portanto, esta lei, também por aí, num vício de inconstitucionalidade.