16 DE SETEMBRO DE 2016
25
e um partido que em três anos conseguiu aumentar a carga fiscal sobre os portugueses em mais 11 000 milhões
de euros vir para este debate discutir política fiscal quando aquilo de que se está a tratar é de repor justiça fiscal
nos escalões do IRS, de reduzir o IVA, de reduzir o IMI, de introduzir mecanismos de justiça fiscal que tributem
o património mobiliário e imobiliário de quem tem património com mais valor, é, de facto, de um enormíssimo
descaramento. Mas é também uma outra coisa mais grave: é de quem não quer assumir as responsabilidades
pela política que executou, contra os interesses do povo português e que hoje é flagrantemente denunciada
como tal.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís
Ferreira, de Os Verdes.
O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Notícias recentes dão-nos
conta que as negociações entre a União Europeia e os Estado Unidos da América, a propósito do TTIP (Tratado
de Parceria Transatlântica de Comércio e Investimento), terão fracassado.
São boas notícias para todos. Para os europeus e para os portugueses, para as nossas empresas, sobretudo
para as micro, pequenas e médias empresas, mas também para o ambiente e para os recursos naturais.
De facto, e por mais estranho que possa parecer numa Europa que se diz tão democrática e tão transparente,
este acordo foi negociado nas costas dos europeus.
Anos de clandestinidade e longe dos olhares dos povos da Europa, escondiam papéis para ninguém ver.
Uma vergonha! Foi assim o processo negocial do TTIP.
Até há pouco tempo, pelo menos em Portugal, o texto não estava disponível. Depois passou a estar —
pasme-se! — na Embaixada dos Estados Unidos da América e só para os Deputados da Assembleia da
República. Só há pouco tempo passou a ser possível aos Deputados da Assembleia da República, e só aos
Deputados, consultarem o texto numa sala de leitura do Ministério dos Negócios Estrangeiros, e mesmo assim
com uma série de restrições e só na versão inglesa.
O mistério, o secretismo e a falta de transparência que envolveu este processo é a todos os títulos
condenável, mas ao mesmo tempo induzem-nos para uma importante questão: porquê tanto secretismo?
A resposta só pode se uma: porque este acordo não é bom para os europeus e para os portugueses, senão
não haveria motivos para o esconder dos povos.
Mas, mais: este secretismo apenas confirma a suspeita de que o principal objetivo deste Tratado era dar
resposta às exigências das grandes multinacionais.
Do pouco que conhecemos do seu conteúdo, sabemos que se pretendia: remover «barreiras regulatórias»,
seja ao nível das exigências ambientais, seja ao nível social e laboral, seja ao nível da segurança alimentar;
reduzir os padrões de exigência e de regulamentação europeia em áreas como a agroindústria e abolir as
restrições sobre organismos geneticamente modificados; criar novos mercados e abrir os serviços públicos,
como a educação, água e a saúde, ao voraz apetite das multinacionais.
O que se pretendia era mais liberalização económica e menos proteção social, era permitir às multinacionais
processar os Estados, incluindo as autarquias, sobre decisões que pudessem comprometer os seus lucros. E
processar os Estados não nos tribunais de cada Estado, mas em tribunais privados, em tribunais arbitrais, tal
como as multinacionais gostam.
Com este jeito às multinacionais, os próprios órgãos de soberania ficariam fortemente condicionados ou até
impedidos de defender o interesse nacional e o interesse das populações, porque, em primeiro lugar, seria
necessário não perturbar a expectativa de lucros das multinacionais e só depois se pensaria nas pessoas e no
País.
Aliás, esta faculdade que seria dada às multinacionais de poderem processar o Estado, caso este adotasse
políticas que impedissem ou dificultassem a sua margem de lucro, para além de representar uma violação do
Estado de direito democrático, ainda nos mostra a ousadia do poder económico em pretender transferir os riscos
dos seus investimentos para o Estado e para os cidadãos.