I SÉRIE — NÚMERO 57
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A segunda questão tem a ver com o facto de, verdadeiramente, o Governo só ter tido conhecimento dela a
partir do verão do ano passado, quando foi transmitida pela Autoridade Tributária ao Governo a estatística
relativa a 2015. E quando comparámos a estatística de 2015 com os números que estavam publicados, e que
tinham sido compilados, de abril de 2014, verificámos que as transferências para paraísos fiscais tinham
aumentado de aproximadamente 400 milhões de euros — era o número que se conhecia de 2014 — para quase
9000 milhões de euros. E, perante tamanha divergência, naturalmente, o Governo questionou a Autoridade
Tributária para saber de onde vinha essa variação, o que é que explicava um aumento de 22 vezes nas
transferências.
Bom, o que nos foi, então, respondido foi que os números de 2014 não estavam corretos, tal como não
estavam os números de 2013, de 2012 e de 2011. Ou seja, os números que tinham sido corretamente, pelo
menos, tanto quanto sabemos, reportados à Autoridade Tributária pelas instituições financeiras não tinham sido
corretamente extraídos dos ficheiros na passagem desses ficheiros depositados no Portal das Finanças para o
sistema central da Autoridade Tributária. Portanto, não ficaram disponíveis nem para a publicação, daí que a
estatística estivesse errada, nem para o controlo inspetivo.
A questão da publicação foi, entretanto, corrigida, ou seja, em dezembro o Governo mandou corrigir as
estatísticas de 2011 a 2014 ao mesmo tempo que publicava as de 2015.
Quanto ao controlo inspetivo, há, evidentemente, duas questões: a de que ele não foi feito, não há dúvidas,
porque isso foi-nos reportado pela inspeção tributária; e a de que, quanto àquele montante, aos tais 10 000
milhões de euros, esse controlo não foi feito, porque aquelas transferências não eram conhecidas da inspeção
tributária, mas, entretanto, isso está a ser feito.
Há, naturalmente, uma outra questão que é a do porquê, que, provavelmente, nos preocupa a todos. Como
é que esta falha foi possível? E foi, naturalmente, por isso, quanto ao porquê, que este Governo solicitou à
Inspeção-Geral de Finanças (IGF) que fizesse um inquérito para que nos pudesse fornecer as respostas.
Estes, Srs. Deputados, são os factos tais como o Governo os conhece e assim os transmite ao Parlamento.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Ferreira.
O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, quero, em primeiro ligar,
saudá-lo pelo facto de, com este Governo, ter regressado a publicação das listas com as transferências para os
offshore, porque foi preciso que o Governo PSD/CDS se fosse embora para que a publicação dessas listas
regressassem.
Gostaria ainda de dizer que, já agora, na nossa perspetiva, nos parece injusto um sistema fiscal onde uns
vivam em paraísos fiscais e outros em infernos fiscais. Parece-nos que não faz sentido que, hoje, haja lugares
no mundo onde a justiça não entre, onde o poder judicial fique à porta e onde os governos finjam que nada têm
a ver com o assunto e que nada podem fazer. Bem sei que o Governo português sozinho não poderá fazer nada,
mas acho que o Governo português poderia, tanto ao nível da União Europeia como nas outras organizações
internacionais de que faz parte, lutar para acabar com os paraísos fiscais.
Sr. Secretário de Estado, sobre o assunto que está hoje em discussão, o que podemos concluir é que durante
o Governo PSD/CDS foi o reinado dos paraísos fiscais. Ou seja, durante o período do Governo PSD/CDS houve
ocultação de informação, houve violação do dever de publicação dos dados. O não ter havido escrutínio dos
movimentos para offshore, o não ter havido divulgação das transferências milionárias para offshore foi mais do
que um paraíso fiscal, foi um regabofe fiscal. E, portanto, podemos estar a discutir se foi, ou não, deliberado,
mas a verdade é que isso aconteceu. Era uma espécie de «transfiram que o Governo finge que não vê», ou de
«transfiram que o Governo fecha os olhos».
Sr. Secretário de Estado, dada a experiência que tem na matéria, considerando que não houve aqui nenhum
problema, que não houve um «Citius» informático como houve ao nível da justiça e tendo, aliás, a Autoridade
Tributária efetuado, em devido tempo, quer o tratamento e o acompanhamento inspetivo que lhe competia quer
a preparação dos elementos necessários à efetiva divulgação pública dos elementos em causa, a única
conclusão possível, a nosso ver, é dizer-se que só não houve publicação desses dados porque o Governo não