I SÉRIE — NÚMERO 68
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Falamos de falsos recibos verdes, falamos de falso trabalho temporário, de falso outsourcing, de falsas
bolsas, de falsos estágios, de falso voluntariado, tudo mecanismos de ocultação de uma verdadeira relação de
trabalho subordinado, à qual não corresponde, mas devia, um contrato de trabalho. E falamos também do
trabalho informal, que continua a ter, em Portugal, um peso bastante grande.
Na sequência das mobilizações contra a troica, das mobilizações da «geração à rasca», os movimentos dos
trabalhadores precários apresentaram a este Parlamento uma iniciativa legislativa de cidadãos, subscrita por
mais de 40 000 pessoas, iniciativa essa que deu origem à Lei n.º 63/2013. Esta Lei de impulso dos cidadãos foi
a única alteração de sentido positivo que houve nesse período em Portugal, em termos da legislação laboral.
O seu mérito foi o de atribuir maiores competências à Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT) para
combater os falsos recibos verdes e o de assumir que não podia depender do trabalhador levar a tribunal o
processo de reconhecimento do seu contrato de trabalho porque isso era uma causa de interesse público e o
Estado devia assumir o interesse público dessa causa e o Ministério Público devia assumir o reconhecimento
do contrato de trabalho destes trabalhadores.
Ao abrigo desta lei, foram detetadas cerca de 2740 situações de falsos recibos verdes e houve cerca de 2000
trabalhadores que viram reconhecido o seu contrato de trabalho.
Ora, isto é uma pequenina gota no oceano da precariedade. Mas é evidentemente um mecanismo que
mostrou ter potencial e que tem de ser reforçado, tem de ser aprofundado, porque é valioso.
No início desta Legislatura o Bloco de Esquerda fez audições sobre o aprofundamento desta Lei e, nos
últimos meses, tem debatido com o Partido Socialista e com o Governo, no âmbito de um grupo de trabalho
constituído para o efeito, um conjunto de alterações capazes de alargar o âmbito e a eficácia desta Lei.
Essas alterações constam das conclusões do relatório do grupo de trabalho, criado entre o Partido Socialista,
o Governo e o Bloco de Esquerda, para estudar medidas de combate à precariedade. E esse compromisso já
foi inclusivamente transposto para o Orçamento do Estado para 2017. Esse trabalho que foi concluído deve,
agora, passar a ser lei. Por isso, no âmbito da especialidade deste processo legislativo, será apresentada uma
proposta conjunta entre o Bloco de Esquerda e o Partido Socialista para concretizar essas alterações.
E estamos seguros de que, ao reforçar os poderes da ACT, ao dar mais força à ação do Ministério Público,
ao alargar o âmbito desta lei, deste mecanismo, desta ação especial de reconhecimento do contrato de trabalho,
não apenas aos falsos recibos verdes mas a todas as formas de dissimulação do contrato de trabalho, que são
formas de precarização das relações laborais, estaremos a dar um passo muito importante no combate à
precariedade.
Temos discutido, nos últimos meses, um programa de regularização dos vínculos precários no Estado. Ora,
também no setor privado é preciso que o combate à precariedade veja a luz do dia, também no setor privado é
preciso que haja medidas concretas, que passam por alterações à legislação laboral e que passam pelo reforço
destes mecanismos.
É disso que trata o projeto de lei que estamos a discutir, é da democracia contra o abuso laboral, é do respeito
pelos direitos básicos que as pessoas têm, é do respeito pelos direitos dos precários, é da consagração do seu
direito ao trabalho, é do seu direito a um contrato que este projeto de lei trata.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado António Carlos
Monteiro.
O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Bloco de Esquerda e
Partido Comunista Português resolveram, hoje, acotovelar-se para tentar provar quem, de entre eles, grita mais
alto em nome dos precários. Deixem-me dizer-lhes que ambos fizeram um péssimo serviço a quem tem um
trabalho precário. Tudo isto não passa de uma simulação. Já sabemos que estes projetos de lei são para baixar
à comissão sem votação.
Bloco de Esquerda e Partido Comunista Português têm muita pressa em pressionar o Partido Socialista. E a
pressa é tão grande que já se atropelam um ao outro. O PCP agendou o seu projeto de lei sem este sequer ter
tido a obrigatória consulta pública e o Bloco de Esquerda fez o mesmo sem que ter terminado o prazo de consulta
pública do seu. Agora já não gritam que falta a consulta pública?!