30 DE MARÇO DE 2017
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A verdade é que os senhores sacrificaram tudo no altar do défice e falharam o objetivo do défice, enquanto
o Governo do PS conseguiu o défice mais baixo da democracia portuguesa, ao mesmo tempo que repôs os
salários e as pensões, ao mesmo tempo que não aumentou os impostos — até os reduziu —, ao mesmo tempo
que aumentou o salário mínimo nacional, ao mesmo tempo que repôs também os direitos sociais que os
senhores retiraram.
Aplausos do PS.
Protestos do Deputado do CDS-PP Pedro Mota Soares.
O senhor veio falar de Sócrates.
O Sr. Presidente: — Já ultrapassou o seu tempo, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Edite Estrela (PS): — Deveria ter dito, antes, «Estou com Sócrates: ‘Só sei que nada sei’».
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado José Soeiro, do Grupo
Parlamentar do Bloco de Esquerda.
O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Em Portugal, há uma geração
inteira que começou a trabalhar muito cedo. Muita gente foi empurrada para ganhar a vida desde criança. A
escolaridade obrigatória não ia além da 4.ª classe, centenas de milhares de pessoas começavam a trabalhar ao
11, 12, 13, 14, 15 anos. Estas pessoas têm hoje carreiras contributivas longuíssimas, mas a vida de trabalho
que já levam não é considerada suficiente para dar acesso a uma pensão. Ou seja, a mesma sociedade que
lhes roubou o final da infância não lhes reconhece, hoje, o direito a reformarem-se mais cedo sem penalizações.
Que justiça existe nisto?
Neste momento, o orador exibiu uma pedra de granito.
Esta pedra de granito foi-me oferecida na sexta-feira passada, em Peroselo, por trabalhadores das pedreiras
de Penafiel. Estes trabalhadores arrancam do terreno enormes pedras disformes de granito e transformam-nas,
com a força dos seus braços e com golpes que só a experiência ensina, nas pedras da calçada que nós pisamos
todos os dias.
Estes trabalhadores começaram quase todos a trabalhar quando acabaram a 4.ª classe. Aos 11 ou aos 12
anos todos eles já trabalhavam na pedreira. Os horários eram longos e ainda hoje vão para além do que deviam.
Férias, poucos as gozaram, mesmo quando estavam no contrato. Doenças, quase todos têm. Ao fim de 40, 41,
42, 43, 44 anos de descontos, de trabalho duro, a respirar a poeira da pedra — que lhes destrói os pulmões —,
a trabalhar com o ruído das máquinas e do transporte, com as mãos, com os braços e com as costas moídos
pela vibração frenética dos compressores, o corpo fica desfeito. E, no entanto, têm de esperar mais uma década
para poderem reformar-se. Mais 10 anos daquele trabalho, Sr.as e Srs. Deputados, garanto-lhes que ninguém
aguenta.
Estes trabalhadores, que começaram a trabalhar aos 12 anos, mas a descontar aos 14 anos — porque a
regra era iniciar descontos só aos 14, mesmo quando começavam a trabalhar aos 11 ou aos 12 —, têm hoje 44,
45 ou 46 anos de descontos para a segurança social. A vida foi consumida pela pedreira, mas ainda não podem
reformar-se ou, se o fizerem, têm cortes de mais de 40% nas suas pensões, que já seriam baixas, porque o
salário sempre foi baixo.
Em Portugal, esta geração, que foi forçada ao que hoje consideramos trabalho infantil, merece ser reparada.
Quem tem longuíssimas carreiras contributivas não pode ser obrigado a trabalhar até ao limite das forças e da
sua vida.