I SÉRIE — NÚMERO 81
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que o Reino Unidos tem de as assumir, tal como as assumiu quando era um parceiro de pleno direito da União
Europeia.
Haverá uma discussão, certamente, complexa e difícil para nós, em Portugal, e para os nossos parceiros a
seguir a 2020, quando o Reino Unido abandonar a União Europeia e, portanto, perdermos a contribuição líquida,
muito expressiva, do Reino Unido para o Orçamento europeu.
Quanto à prossecução destas negociações e para levarmos a cabo este processo que se adivinha muito
difícil, é uma ilusão pensar que o conseguiremos levar a bom porto sem uma ideia clara da Europa que somos
e da Europa que queremos ser.
O primeiro passo para termos essa ideia clara da Europa que queremos ser diz respeito não só à vontade
de reformarmos as instituições europeias, mas também de não nos deixarmos intimidar pelos extremismos
políticos antieuropeístas de esquerda e de direita.
Vemos, pelo que está a acontecer em França, que muitas vezes as neutralidades que são assumidas por um
extremismo de um lado do espectro não são senão efetivas afinidades com o outro extremismo de polo oposto.
Não nos podemos deixar intimidar, nem podemos disfarçar essas presumidas neutralidades. Do lado de um
processo tão moroso e tão complexo como este e de outros atos políticos de idêntica envergadura, não nos
podemos esquecer quais são os valores europeus que fundam a Europa que desejamos: os valores da
democracia política, os valores do regime de liberdades, os valores de uma economia social de mercado.
No debate político interno português, temos de ter uma ideia clara sobre aquilo que nos divide entre as forças
extremistas — no nosso caso, de esquerda —, antieuropeístas que promovem um conflito e uma guerra aberta
contra estes valores e as outras forças políticas que são a favor de uma Europa que se revê precisamente nestes
valores.
O mínimo que se pode exigir ao Governo da República portuguesa é que não seja ambíguo neste confronto
político, neste debate do nosso tempo, que é o grande debate europeu do nosso tempo. Não pode ser a coberto
de ambiguidades de circunstância que este debate se torne mais confuso. Isso vale para Portugal, para França
ou para qualquer outro Estado-membro.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para uma intervenção, tem a palavra, em nome do Grupo
Parlamentar do Bloco de Esquerda, a Sr.ª Deputada Isabel Pires.
A Sr.ª Isabel Pires (BE): — Sr. Presidente, Sr.as Deputadas e Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro: O
Conselho Europeu de dia 29 de abril será extraordinário e irá focar-se na adoção das linhas orientadoras para
a negociação pós-Brexit.
Neste contexto, há uma primeira conclusão que podemos tirar: as posições de ambos os lados têm sido, até
hoje, confusas e, em alguns momentos, mesmo contraditórias, imprimindo um cenário de cada vez maior
incerteza, em particular para os milhares de pessoas que residem, trabalham e estudam no Reino Unido.
Segundo as informações que o Governo português tem prestado, inclusivamente em sede de comissão
parlamentar, estas negociações teriam duas prioridades essenciais: um acordo em matéria de segurança e
defesa, por um lado, e a defesa dos direitos dos cidadãos, por outro.
Não podemos deixar de notar que estas prioridades são contraditórias no seu objetivo. Se a primeira destas
prioridades é um tiro ao lado na resposta aos principais problemas, a segunda, analisando o debate em curso,
não pode ser levada a sério.
Desde o início, o Brexit foi instrumentalizado para incutir o discurso do medo e do ódio ao outro, ao que vem
de fora, e, também, para a sobrevivência política de uma elite governante que se vai deslocando mais e mais à
direita. A cada tentativa de condicionar a livre escolha democrática, as instituições ou representantes europeus
mais repeliam os cidadãos e deram fôlego ao Brexit.
A União Europeia é um projeto cada vez mais difícil de defender, mesmo contra as piores razões.
O povo britânico decidiu sair e, desde que foi acionado o artigo 50.º do Tratado de Lisboa, assistimos a uma
completa incongruência nas posições negociais. Ora é urgente um acordo que beneficie as duas partes, ora é
preciso um acordo que afirme o poder da União Europeia face ao Reino Unido. Ora é preciso um acordo que