I SÉRIE — NÚMERO 61
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Para iniciar este ponto, tem a palavra o Sr. Deputado Heitor de Sousa para uma intervenção.
O Sr. Heitor Sousa (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O debate que o Bloco de Esquerda hoje
traz ao Parlamento, ao apresentar esta proposta para resgatar para a esfera pública a rede básica da Portugal
Telecom (PT), é um debate sobre um balanço e uma escolha.
Foi há mais de duas décadas que Cavaco Silva deu o primeiro passo para a privatização das
telecomunicações em Portugal, criando, primeiro, a Portugal Telecom, SA, e iniciando, depois, a primeira fase
de privatização da empresa.
O caminho que se seguiu a partir daí é conhecido: governo após governo, em governos de geometria variável,
PS, PSD e CDS foram programando a privatização da PT. A empresa foi sendo progressivamente transferida
da esfera pública para a esfera privada, até que, em 2011, o Governo do protetorado da troica determinou a
eliminação da golden share que o Estado ainda detinha, colocando a PT, exclusivamente, nas mãos de privados.
E aqui estamos, 24 anos depois, com uma PT que praticamente desapareceu como empresa estratégica para
dar lugar a uma subsidiária integral do grupo franco-israelita Altice.
As consequências estão à vista. No que diz respeito às redes de emergência e proteção civil, os trágicos
incêndios do ano passado mostraram que os vários sistemas de comunicação que tinham como suporte a
PT/Altice falharam durante largos períodos. Estas falhas, que se repetiram em junho e em outubro, provam que
não se trata apenas de falhas localizadas mas, sim, de um extenso apagão, em períodos de tempo cruciais, de
toda uma rede abrangendo regiões inteiras do centro e do interior do País.
Mas se a Altice falhou na rede emergência e socorro e nas redes fixas de telecomunicações, falhou também
na televisão digital terrestre (TDT). E porquê? Pela única razão de que há um conflito de interesses, identificado
pela própria ANACOM (Autoridade Nacional de Comunicações): a Altice é detentora da rede básica que garante
a difusão da TDT e é, simultaneamente, detentora do principal operador de televisão por assinatura que inclui a
TDT. E como se não bastasse quer ainda comprar a TVI num processo que, se se concretizasse, significaria
uma inaceitável operação de concentração na comunicação social portuguesa que colocaria em risco o
pluralismo da informação e de conteúdos nos media.
Sejamos claros: o que a Altice faz ao travar o desenvolvimento da TDT para vender pacotes da MEO é
indigno e é uma afronta ao Estado e à obrigação de todos nós garantirmos as condições para a prestação do
serviço público de rádio e televisão.
Sr.as e Srs. Deputados, para além do balanço de década e meia de falhanços, hoje também precisamos de
falar de escolhas e são quatro as escolhas que este Parlamento terá de fazer.
Primeiro: quer este Parlamento deixar a infraestrutura do SIRESP (Sistema Integrado de Redes de
Emergência e Segurança de Portugal) nas mãos de uma empresa que tem dado provas de sucessivas
incompetências ou, pelo contrário, quer assumir a solução responsável de resgatar para o Estado essa rede e,
com isso, garantir a segurança, a emergência e o socorro das nossas populações?
Aplausos do BE.
Segundo: vai este Parlamento fechar os olhos ao conflito de interesses que faz com que a Altice trave o
desenvolvimento da televisão digital terrestre para vender pacotes da MEO ou, pelo contrário, vai assumir a
responsabilidade de garantir o serviço público de TDT, essencial para as populações que mais precisam,
especialmente, do interior cada vez mais abandonado?
Terceiro: vai este Parlamento aceitar o argumento, usado pela administração da Altice, que favorece a
exclusão de milhares de famílias mais pobres e mais idosas, segundo a qual há cada vez menos portugueses
que usam o telefone fixo ou, pelo contrário, vai encontrar respostas para esta política que transformou Portugal
num dos países da União Europeia em que as comunicações são mais caras?
Quarto: finalmente, vai este Parlamento deixar que uma empresa como a Altice, por ação ou por omissão,
ponha em causa a necessidade de alargar um serviço público universal de telecomunicações ou, pelo contrário,
vai assumir a escolha corajosa de resgatar para o Estado o que deve ser uma verdadeira rede básica da Portugal
Telecom?
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Queira terminar, Sr. Deputado.