22 DE MARÇO DE 2018
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O terceiro problema é inerente ao próprio modelo. Os concursos da Direção-Geral das Artes dirigem-se, por
lei, às estruturas independentes. Ora, neste modelo, há coisas que não mudaram e, em nosso entender, deviam
ter mudado.
Continuam a ter de concorrer aos mesmos concursos estruturas de criação artística independentes e
estruturas de programação, nomeadamente de teatros públicos, o que cria uma perversão no sistema.
Os resultados preliminares, agora conhecidos, confirmam-no: os maiores apoios vão para teatros municipais,
que concorrem através de associações criadas e dirigidas pelos municípios, numa batota consentida pela tutela.
Por exemplo, no caso dos concursos para estruturas que trabalham com cruzamentos artísticos, mais de
metade do montante disponível para a região Norte foi atribuído apenas a uma entidade, que é programadora
de um centro cultural municipal.
As verbas destinadas a independentes são, afinal, atribuídas a autarquias que assim transferem para o
Estado central as obrigações de financiamento das suas próprias estruturas. Ora, isto reduz não só o
financiamento global às artes, mas também a pluralidade da criação com reflexos negativos no plano da fruição
e do acesso à cultura.
Sr.as e Srs. Deputados, corrigir o modelo em tempo útil é impossível; contudo, encolher os ombros não é
opção. Façamos, então, escolhas. Quais?
No imediato e para que os erros de ontem e de hoje não transformem o futuro próximo numa triste
reconfiguração do tecido artístico — seja por encerramento, falência ou desistência de estruturas e de criadores
—, os apoios às artes devem ser reforçados, no mínimo, ao nível do financiamento de 2009, ou seja, 19,8
milhões de euros.
Por outro lado, e já, dê-se início ao processo de correção dos erros do novo modelo para lançar os próximos
concursos em tempo adequado.
Finalmente, no Orçamento do Estado para 2019, faça-se o caminho urgente e que tanto tarda no sentido de
o orçamento para a cultura se aproximar da decência de 1%.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Queira terminar, Sr. Deputado.
O Sr. Jorge Campos (BE): — Termino, Sr. Presidente.
Com os sinais de recuperação económica, o subfinanciamento das artes mais parece uma opção do que
uma necessidade.
É preciso corrigir o erro. O Bloco de Esquerda quer fazer parte da solução.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para pedir esclarecimentos, inscreveram-se quatro Srs.
Deputados e o Sr. Deputado Jorge Campos indicará à Mesa, através do seu líder parlamentar, que quer
responder a grupos de dois, por telepatia.
Vamos começar com o primeiro pedido de esclarecimento, que cabe à Sr.ª Deputada Teresa Caeiro, do CDS-
PP.
Faça favor.
A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Jorge Campos, devo dizer que não tenho
dúvidas quanto à sua preocupação relativamente às artes, à cultura e ao apoio às mesmas, mas também não
sei como entender a posição do Bloco de Esquerda no que se refere a esta e, aliás, a outras matérias.
Sei que a realpolitik tem razões que a razão desconhece, mas eu relembrar-lhe-ia apenas algumas
declarações, quer por parte do Governo, quer por parte do Bloco de Esquerda e do PCP, quer, muito
particularmente, pela líder do seu partido aquando da discussão do Orçamento do Estado para 2018.
Dizia, desde logo, o Governo, nas palavras do Sr. Primeiro-Ministro, que reconhecia que o Orçamento, no
que se refere à cultura, era insuficiente. Por outro lado, ouvimos dizer, dia sim, dia não, que a página da
austeridade já foi virada. Já foi virada para muitas áreas, mas certamente que não foi virada para a área da
cultura.