18 DE OUTUBRO DE 2018
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Poucos serão os exercícios de memória mais penosos e tristes. As lágrimas, os gritos, por vezes até o silêncio
evidenciavam o desespero. Num instante, desapareceram famílias, amigos, memórias, casas, recordações de
gerações.
Portugal é hoje um país centralista, muito envelhecido, com baixíssimas taxas de natalidade. Lisboa cresce
e o resto do país empobrece. Território abandonado é território improdutivo. Portugal, atrasado perante os
parceiros europeus, não se pode dar ao luxo de desperdiçar recursos.
Terras sem pessoas são terras sem guardiões. O êxodo da população para as grandes cidades foi agravado
por um Estado que esquece as pessoas.
Ao longo dos anos, o Estado falhou. Muitas vezes, ao não cuidar sequer do que é seu, outras ao recusar
condições dignas aos voluntários que, num heroísmo altruísta, tudo têm feito para nos proteger.
Hoje, como há um ano, o Governo e a maioria que o suporta continuam a acreditar que a troca de ministros
tudo irá desculpabilizar.
Quase 100 pessoas morreram, abandonadas pelo Estado, condenadas à sua autoproteção e a um inaceitável
salve-se quem puder. Floresta, casas, fábricas e empregos desapareceram no inferno dantesco a que fomos
condenados.
Recordemos a descoordenação, o sofrimento, a dor, a angústia dos que teimosamente permaneceram nos
seus territórios e que, em segundos, assistiram à destruição.
Dois meses antes do verão, o Governo, de forma inconsciente e irresponsável, tinha revolucionado a
estrutura nacional da proteção civil, dando prioridade aos boys. Dispensaram meios aéreos, de vigia e de
combate, agravando o cenário provocado pelas condições climatéricas. Falharam!
Até hoje, nada de estrutural se modificou.
No caso da prevenção, no ordenamento do território e na definição de uma eficaz política florestal, o Governo
comporta-se de forma irracional, não percebendo as dificuldades dos pequenos e médios proprietários,
perseguindo a propriedade privada. Esquecem-se que as poucas pessoas que restam nestes territórios são
maioritariamente pobres e idosos, sem recursos para as limpezas, gente que, depois da tragédia, continuou
meses a fio sem comunicações devido à fraqueza do Estado face aos grandes grupos económicos.
Persistem fábricas e inúmeras casas por recuperar. Em Pedrogão, o facilitismo transformou-se em caso de
polícia. No IP3, nem sequer as vedações foram ainda repostas.
O abandono do território e os incêndios transformam as florestas em matagais.
Preocupados com a pequena chicana política, desperdiçaram a oportunidade dada pelo PSD de lançar uma
verdadeira reforma, descentralizadora e transformadora de Portugal. Preferiram o faz-de-conta.
Da palavra dada à palavra honrada, ao ridículo do Infarmed, o Primeiro-Ministro continua a permitir que haja
portugueses abandonados à sua própria sorte.
Aplausos do PSD.
A cegueira ideológica e estatizante desta maioria de esquerda faz o Governo viver longe das organizações
não governamentais sem fins lucrativos, onde milhares de portugueses se mobilizaram para recuperar Portugal.
Felizmente, as pessoas não falharam!
As lágrimas e os gritos de revolta deram lugar à persistência e à tenacidade. Determinados e solidários, os
portugueses envolveram-se e mobilizaram-se.
Sr.as e Srs. Deputados, exige-se uma nova realidade que todos envolva. A sociedade precisa de proteção e
de menos obstáculos. Urge a construção de um país diferente, mais competitivo e menos assimétrico.
Neste desafio, as instituições não lucrativas devem ser acarinhadas. Podem ser bons parceiros na
descentralização e apoios de proximidade.
Do Estado quer-se o exemplo. Pela passividade e inoperância do Governo, não pode o interior continuar
condenado ao abandono. Que se comece já, sem hesitações e com coragem, dando o exemplo da transferência
do Tribunal Constitucional para Coimbra. Que se ponderem e estudem outras transferências e que se atraia
investimento produtivo. As pessoas querem continuar a viver naqueles territórios, mas necessitam de condições
para aí poderem viver.