I SÉRIE — NÚMERO 3
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Risos do Deputado do BE José Manuel Pureza.
Mas trata-se, certamente, de um equívoco ideológico, porque o PREC (Processo Revolucionário em Curso)
pertence à História. Foi em 1975.
Entre o preconceito ideológico e tanta azáfama legislativa, ao Governo apenas escapou um pequeno
pormenor, que foi o de conformar esta autorização e este regime com os princípios do Estado de direito e com
a Constituição.
É tudo tão fácil, tão fácil, que o difícil é mesmo aprovar esta autorização legislativa. Em consciência, a este
pedido de autorização legislativa, esta Câmara deveria responder com uma ordem de proibição legislativa.
Este diploma teve apenas uma única preocupação: o interesse do Estado na declaração da utilidade pública
e no caráter de urgência das expropriações, descurando e sacrificando, de forma grave, o interesse dos
expropriados, o que poderá ofender o direito à propriedade privada, plasmado no artigo 62.º da Constituição.
O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Oh!
O Sr. José Cancela Moura (PSD): — Por outro lado, conforme é consensual na atual jurisprudência, a tutela constitucional da propriedade não é incompatível com a compressão desse direito, desde que estas restrições
se mostrem proporcionais em relação à realização de um fim de utilidade pública, o que, no caso em concreto,
pode também ferir o princípio da proporcionalidade, consagrado no n.º 2 do artigo 18.º da Constituição.
Este regime especial exclui a aquisição de bens por via do direito privado e impede que os expropriados
exerçam o contraditório, pelo que a decisão quase unilateral de expropriar só poderá ser impugnada em sede
de contencioso administrativo, o que sabemos ter, na maior parte dos casos, prejuízos graves para os
interessados, quanto ao justo valor dos bens.
Se a declaração de utilidade pública é apenas publicada com a planta aprovada ou com o mapa das áreas e
a lista de proprietários, estes não têm como aferir, nem como defender-se da desproporcionalidade das decisões
da administração, porque permanecem em desconhecimento de causa até àquele momento.
Há ainda outro efeito bizarro. Basta tão-só esta publicação do ato declarativo da utilidade pública para haver
lugar, de imediato, à posse administrativa dos bens expropriados. Não se compreende esta restrição injustificada
do direito à propriedade privada, nem a forma manifestamente desproporcionada como o Governo pretende
fazer prevalecer a própria noção de interesse público. Expropriar ou constituir servidões já é per si um ato
excecional e urgente, regulado no Código das Expropriações. Por isso, não se compreende que o Governo
pretenda criar um regime que estabelece uma exceção à exceção de expropriar e confira prioridade à urgência
de tomar posse, ainda por cima à margem do disposto no artigo 2.º do Código das Expropriações, por não
respeitar os direitos dos expropriados, nem observar os princípios da legalidade, da justiça, da
proporcionalidade, da imparcialidade e da boa-fé.
Não está em causa nem o mérito, nem a bondade da finalidade, nem tampouco a implementação do PEES,…
O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Sr. Deputado, chamo a sua atenção para o tempo.
O Sr. José Cancela Moura (PSD): — … mas, num Estado de direito, não pode valer tudo, sobretudo quando está em causa a proteção da confiança dos cidadãos.
Termino, Sr. Presidente, dizendo que o PSD não está uma, nem duas, mas três vezes contra.
O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Eh lá!
O Sr. José Cancela Moura (PSD): — O PSD está contra esta espécie de confisco, contra esta perigosa arbitrariedade, contra esta negação do Estado de direito!
Perdoem-me o lugar comum, mas é um diploma sem PEES — leia-se Programa de Estabilização Económica
e Social — nem cabeça. Em vez de estado de contingência, os senhores, com esta autorização, se for
concedida, podem colocar o País em estado de sítio.