I SÉRIE — NÚMERO 14
40
direito. Ou seja, o Estado subtraiu-se da provisão pública de respostas tão importantes como a resposta para a
infância, como as creches, os lares de idosos, equipamentos na área da deficiência ou centros de dia para
pessoas idosas.
Para o Estado, há uma vantagem nesta retirada da provisão pública, que é o facto de pagar menos do que
aquilo que gastaria se assumisse a responsabilidade. Mas as consequências são pesadas, quer para os
trabalhadores, quer para a população, porque sabemos que existe uma enorme escassez de oferta. Para dar
apenas um exemplo, no campo de cuidados a pessoas idosas, só 12,8% das pessoas idosas têm acesso a uma
resposta da rede de equipamentos sociais — são dados oficiais do diagnóstico social. E, além dessa escassez
de oferta, o facto de estes cuidados não serem constituídos como um direito, não permite que as pessoas
possam reivindicar a sua realização por parte do Estado.
O Sr. Jorge Costa (BE): — Muito bem!
O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Mais ainda, os trabalhadores das IPSS têm salários muito baixos, são profundamente desvalorizados e têm uma sobrecarga laboral que não tem qualquer compensação.
Se compararmos as mesmas funções no setor público e no setor privado, vemos diferenças salariais da
ordem dos 100 €, por exemplo, no campo do apoio social. Por isso, a consequência desta privatização, desta
externalização das respostas sociais, é a precariedade, a desvalorização social.
O Estado é um Estado que financia, é um Estado que fiscaliza, é uma espécie de Estado multibanco, mas
que, na verdade, não consegue garantir nem a universalidade do acesso nem a qualidade dos cuidados
prestados.
Outra consequência da realidade que temos é a proliferação de respostas clandestinas. Não é por acaso
que, em Portugal, a escassez de oferta pública e o facto de a oferta privada não ser acessível para a maioria
das famílias faz com que haja 35 000 pessoas a residir em lares clandestinos.
Já propusemos, neste Parlamento, que, na negociação que o Governo faça dos acordos de cooperação, se
possam introduzir critérios que revejam, naturalmente, as verbas, mas que tenham como contrapartida o respeito
por condições laborais, o combate à precariedade. Não faz nenhum sentido o Estado ter, por exemplo, integrado
as amas que estavam na segurança social a falso recibo verde e continuar a financiar IPSS que têm amas a
fazerem as mesmas funções e que continuam num regime ilegal, de falso recibo verde, sem ver o seu contrato
reconhecido.
O Sr. Jorge Costa (BE): — Muito bem!
O Sr. José Moura Soeiro (BE): — É importante que, também nessa revisão dos acordos de cooperação, se harmonizem as condições laborais e salariais entre os trabalhadores do setor público e os trabalhadores das
IPSS. E, sobretudo, não podemos continuar a aceitar que o reforço do pessoal, dos trabalhadores, nas respostas
sociais, como aconteceu nos lares, seja feito à custa de contratos de emprego-inserção. Estamos a falar de 15
000 trabalhadores que o Governo anunciou que iam trabalhar para os lares, sem um contrato de trabalho, sem
um salário, com uma bolsa que soma ao subsídio de desemprego. É indefensável!
E, independentemente ou paralelamente a esta revisão dos acordos de cooperação, precisamos, sim, de
investir numa rede pública de cuidados sociais, de respostas sociais.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Sr. Deputado, queira concluir.
O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Precisamos — e com isto termino, Sr. Presidente — de repensar profundamente o próprio modelo de intervenção e de institucionalização.
Creio que este é o desafio principal que se coloca e ao qual o Bloco de Esquerda pretende responder.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — O PSD dispõe ainda de 54 segundos para intervir e como, a seguir, dispõe também do tempo de encerramento do debate, se não houver oposição, procederemos da mesma