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17 DE DEZEMBRO DE 2020

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aconteceu nas instalações do espaço equiparado a centro de instalação temporária do aeroporto de Lisboa e

três inspetores do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras foram acusados do crime pelo Ministério Público.

As condições em que este homicídio ocorreu devem alarmar-nos, não apenas pela violência extrema do

ato e pela tentativa de ocultação do mesmo, mas também por ter sido praticado enquanto o Ihor se encontrava

injustamente detido e por ter contado com a conivência ou, pelo menos, a negligência da hierarquia.

Os centros de instalação temporária e espaços equiparados são locais de detenção onde se encontram

pessoas que não cometeram qualquer crime, sendo detidas tão-somente pela sua condição de migrante

indocumentada cuja entrada no País foi recusada.

A maioria das pessoas sente que é tratada como criminosa. São privadas da sua liberdade e do contacto

com familiares e amigos e não têm apoio jurídico adequado, nem dispõem de um tradutor ou intérprete.

São alvo de abuso de todo o tipo de arbitrariedades sob a forma de negação de direitos, humilhações,

intimidações e agressões.

Estas situações são há muito denunciadas pelas organizações de defesa dos direitos dos migrantes e

refugiados e pela Provedora de Justiça. Nos últimos tempos, têm também vindo a público diversas denúncias

de pessoas que ficaram detidas no espaço do aeroporto de Lisboa, que mostram que este não é um caso

isolado, apenas teve, infelizmente, consequências mais trágicas.

Estas pessoas migrantes e os seus representantes legais relatam que as agressões aos detidos são

comuns. A sala onde Ihor Homenyuk foi espancado até à morte era conhecida como um espaço onde as

pessoas detidas eram humilhadas e agredidas. Esta era, infelizmente, uma morte anunciada.

O Bloco de Esquerda pediu, de imediato, uma audição com caráter de urgência ao Ministro da

Administração Interna, de modo a apurar as responsabilidades políticas de quem tem a tutela do SEF.

O Ministro, tanto na audição a 8 de abril, como ontem, assumiu o compromisso da realização de uma

investigação célere, o apuramento de todas as responsabilidades, a assunção de consequências sem olhar a

quem e de mudanças na estrutura do SEF.

Mas as poucas medidas entretanto tomadas ficam muito aquém do necessário. Houve uma requalificação

das instalações do espaço equiparado a centro de instalação temporária do aeroporto de Lisboa, mas esta não

foi mais do que uma operação de cosmética que não alterou em nada a estrutura.

As pessoas que não são autorizadas a permanecer em Portugal continuam a ser presas, e isso é

inaceitável num Estado de Direito democrático.

Só a forte pressão pública e mediática terminou com o silêncio do Estado. A diretora nacional do SEF

abandonou, a seu pedido, o cargo e o Estado, depois de ter ignorado e negligenciado a família de Ihor, decidiu

finalmente pagar-lhe uma indemnização.

O Governo tratou este assassinato como se fosse um mero acidente de percurso, uma mancha excecional

numa instituição policial de outra forma exemplar.

Mas o que este crime hediondo e vergonhoso nos revela é a falência de um modelo caduco e desumano de

lidar com a imigração. Um modelo que trata, à partida, as pessoas migrantes com desconfiança e suspeição,

como uma ameaça à segurança.

As pessoas migrantes e requerentes de asilo que procuram Portugal em busca de uma melhor vida, como

tantas portuguesas e tantos portugueses fizeram no passado e continuam a fazer no presente, não podem ser

tratadas como suspeitas ou criminosas até prova em contrário.

Têm de ver respeitados os seus direitos e ser tratadas com todo o respeito e humanidade que lhes são

devidos. O Estado de Direito não se suspende quando se cruza a fronteira de entrada em Portugal.

Precisamos de uma política de acolhimento que assente numa abordagem humanista, que respeite os

direitos humanos e que valorize a diversidade e o contributo que dão a Portugal.

É necessário que o acolhimento de pessoas migrantes e requerentes de asilo caiba a um organismo

vocacionado para o efeito, com funcionárias e funcionários com uma formação rigorosa, que assegure o

mesmo respeito pelos direitos humanos que é garantido às cidadãs e aos cidadãos nacionais. Um organismo

administrativo que acolhe e não uma polícia que reprime.

É necessário garantir em todas as etapas do processo de admissão de entrada o acesso a apoio jurídico

especializado, a intérpretes e mediadores, ao apoio de organizações não governamentais que atuem nesta

área e a apoio consular.