21 DE JANEIRO DE 2021
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O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Estas iniciativas, assumidamente, vêm na
sequência do facto de terem surgido, publicamente, notícias de que, nos nossos tribunais, nem sempre se estava
a seguir o princípio do juiz natural na distribuição dos processos. Isto é preocupante e foi reconhecido como
preocupante por esta Assembleia, que, aliás, desenvolveu diligências no sentido de procurar apurar, com rigor,
como é que as coisas se processam, para que se possa, eventualmente, atuar em função disso.
Importa dizer, desde logo, que o princípio constitucional do juiz natural é um princípio de que o Estado de
direito não pode prescindir e daí que tudo o que deva ser feito para o proteger, para o salvaguardar, é,
naturalmente, importante. Perante o surgimento de dúvidas sobre a sua aplicação e até perante as informações
que nos foram dadas, muito detalhada e francamente, de que havia situações em que se justificava abrir
exceções não tanto ao princípio do juiz natural, mas no sentido de haver uma distribuição que, em algumas
situações justificadas, escapasse a um princípio de pura aleatoriedade, trata-se de algo que, efetivamente,
merece reflexão. É que, a partir daí, com a abertura de uma pequena porta que seja, é possível que entrem
coisas que não desejamos, no que diz respeito à subversão do princípio da aleatoriedade e, consequentemente,
do juiz natural.
Daí que, do nosso ponto de vista, sejam bem-vindas as iniciativas que venham no sentido de procurar dotar
o sistema de distribuição dos processos pelos juízes de critérios de sindicância, ou seja, que procurem que o
sorteio que é feito e que dá lugar à distribuição dos processos seja controlável pelos vários agentes judiciários,
isto é, que tenha, naturalmente, uma direção judicial, como deve ser, mas que os vários intervenientes no
sistema, designadamente o Ministério Público e os advogados, tenham condições institucionalizadas para
participarem nesse processo, de modo a verificarem, de forma cabal, a aplicação do princípio do juiz natural e
a poderem, obviamente, fiscalizar as exceções que, justificadamente, lhe tenham de ser introduzidas,
nomeadamente por via da existência de escusas ou impedimentos na atribuição de determinado processo a
determinado juiz.
Portanto, achamos bem estas iniciativas, achamos que a questão que o Sr. Deputado José Magalhães, há
pouco, referiu, quando disse que não podemos retroceder a meados do século XX na distribuição de processos,
para regressar, pura e simplesmente, ao papel, está correta, e creio que também não é isso que se pretende,
mas aquilo que, de facto, importa salvaguardar é que haja transparência neste processo, porque, efetivamente,
isso é fundamental para a justiça.
Uma das críticas que a justiça, por vezes, sofre é a de falta de transparência no seu funcionamento mas, não
defendendo nós que a justiça não deva funcionar com a necessária discrição — não pretendemos uma justiça
espaventosa, designadamente em termos públicos e mediáticos —, consideramos que a transparência, naquilo
que é essencial, é um valor importante. Mas tendo havido, há uns tempos, dúvidas relativamente à aleatoriedade
na atribuição dos processos, é importante que essas dúvidas sejam dissipadas e que a Assembleia da República
faça o que está ao seu alcance para criar um sistema que seja — permitam-me a expressão — à prova de bala
do ponto de vista da genuinidade e da correção da distribuição dos processos.
Daí, encaramos favoravelmente estas iniciativas. Obviamente, haverá aperfeiçoamentos que será necessário
fazer e estamos inteiramente disponíveis para isso.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Dou agora a palavra ao Sr. Deputado Telmo Correia, do CDS-PP.
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, somando a nossa opinião relativamente
a grande parte do que já foi dito, e sem discordâncias de fundo em relação a praticamente todas as intervenções,
gostaria de dizer o seguinte: de facto, como aqui foi dito, conhecemos — ou presumimos conhecer — a origem
destas propostas e do que está, hoje em dia, em cima da mesa.
Portanto, a origem disto foram situações de uma enorme gravidade em que se gerou uma convicção e uma
suspeição. É verdade que nada está decidido, mas temos todos a profunda convicção de que pode ter havido
factos, inclusivamente do foro criminal, que permitiram adulterar o que devia ser a escolha normal, a escolha de
um juiz natural.