I SÉRIE — NÚMERO 42
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Quero recordar, ainda, que é em ambientes de vulnerabilidade que devemos lutar, como nunca, pelos valores
humanitários, que devemos lutar, como nunca, pela igualdade e pela possibilidade de toda a gente ter o devido
reconhecimento na sociedade.
Eu quero recordar que, neste momento, queremos, sim senhora, um rigoroso confinamento. Mas um rigoroso
confinamento da pobreza, da exclusão social e da falta de habitação, que faça com que não haja nenhuma
comunidade, nenhum indivíduo ou cidadão em situações insalubres.
Nós queremos um rigoroso confinamento do racismo e de todas as discriminações, um rigoroso confinamento
da pobreza, um rigoroso confinamento da violência doméstica, do populismo e do taticismo político, em tempos
de pandemia.
O Sr. Presidente: — É a vez da intervenção da Sr.ª Deputada não inscrita Cristina Rodrigues. Faça favor, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Cristina Rodrigues (N insc.): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Vemo-nos novamente na circunstância de termos de debater a renovação do estado de emergência e é sem
surpresa que votarei novamente a favor.
Não há como negar a presente crise sanitária e devemos juntar esforços para a combater. No entanto,
importa não esquecer outros flagelos.
Falo novamente da violência doméstica. A propósito de outro debate sobre a renovação do estado de
emergência, já tinha chamado a atenção do Governo para o facto de a instabilidade provocada pela COVID-19
ter particular impacto nas mulheres que, por medo de expor os filhos ao vírus, por medo do desemprego ou da
crise económica, ficavam especialmente vulneráveis perante cenários de violência doméstica. E venho reiterar
essa preocupação.
Ontem, foi divulgado um estudo da Escola Nacional de Saúde Pública, que revela que um terço dos inquiridos
foi vítima de violência doméstica pela primeira vez durante a pandemia. Segundo o mesmo estudo, houve um
aumento dos casos não reportados oficialmente, pois a maior parte das vítimas não procurou ajuda nem
denunciou, porque o considera «desnecessário», que «não alteraria a situação» e por se sentirem
constrangidas.
E o mais preocupante é que, segundo os dados do Ministério Público, até 1 de setembro de 2020, o número
de queixas registadas sofreu um acréscimo de 8% face ao período homólogo em 2019, resultando numa média
de 40 queixas de violência doméstica por dia.
Para além dos casos mais graves, que culminam com o assassinato da vítima e cujo número também
sabemos não ser residual, ainda estamos em janeiro e já contamos com duas mortes. O confinamento tem-se
revelado um inferno para as vítimas.
O nosso foco deve estar na resolução da pandemia, mas não podemos abandonar os mais vulneráveis,
especialmente quando sabemos que esta crise sanitária veio acentuar as desigualdades económicas e sociais.
Não podemos esquecer os idosos que vivem em lares e cuja qualidade de vida e de saúde piorou no contexto
atual, mas também os que vivem sozinhos e que, neste momento, estão privados de qualquer apoio.
Não podemos esquecer as crianças e a importância de reforçar a primeira linha de sinalização de casos do
sistema de proteção, uma vez que não existem contactos regulares com professores, que são quem muitas
vezes deteta situações de maus-tratos ou negligência.
Não posso deixar de dizer que o confinamento, necessário por razões de saúde pública, tem impactos
elevados ao nível do bem-estar e saúde mental de todos, o que deve ter uma intervenção urgente do Governo.
Por fim, apelo aos portugueses que fiquem em casa e àqueles que necessariamente têm de sair que
cumpram as orientações da DGS (Direção-Geral da Saúde) e as regras em vigor.
Quanto mais cumpridores formos, mais rapidamente voltaremos à normalidade.
O Sr. Presidente: — Para concluir o debate, tem a palavra o Governo, através do Sr. Ministro da Administração Interna, Eduardo Cabrita.