I SÉRIE — NÚMERO 49
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Nestes dois meses de dimensão parlamentar da Presidência portuguesa, a Assembleia da República
recebeu a visita do Colégio de Comissários e levou a cabo várias iniciativas de que singularizo, pelo seu
alcance, duas conferências interparlamentares: sobre a estabilidade e governação económica, organizada
com o Parlamento Europeu e o seu Presidente; e sobre a Política Externa e de Segurança Comum e a Política
Comum de Segurança e Defesa. Com temáticas diferentes, as duas conferências tiveram um propósito
comum: pensar estrategicamente a Europa.
Como bem declara o Tratado de Lisboa, os parlamentos nacionais contribuem ativamente para o bom
funcionamento da União.
A cooperação internacional sempre fez parte integrante da nossa matriz democrática e da nossa política
externa. Neste caso, ela é ainda mais fundamental. Nenhum país sozinho pode vencer ou superar as
consequências da pandemia.
Como lembrou o Papa Francisco, perante um desafio que não conhece fronteiras, não se podem erguer
barreiras. Os muros do nacionalismo e do populismo são impotentes para travar a pandemia.
E como não ter presente o apelo e a advertência feitos por António Guterres, reiterados há duas semanas
perante os nossos Deputados numa conferência, no âmbito da dimensão parlamentar da nossa Presidência do
Conselho da União Europeia, sobre a necessidade absoluta de todos, independentemente do lugar onde
habitam e das respetivas condições económicas, terem acesso à vacinação contra a COVID-19?
Estamos perante um imperativo ético de bem comum e uma exigência de gestão pública, porquanto, como
o mostram as variantes do vírus, nenhum de nós estará a salvo enquanto outros lutam pela vida em condições
de miséria económica, de conflito armado ou tão simplesmente de falta de acesso à saúde pública.
Não nos esqueçamos destas palavras.
Excelência, Minhas Senhoras e Meus Senhores: Afirmou ainda Vossa Excelência, na noite de 24 de
janeiro, que a sua eleição é a demonstração de repúdio do extremismo por parte dos portugueses.
Estou certo de que assim é, sendo este um assunto que a todos deve preocupar e que exige ação e
resposta determinadas.
Organizações como a Freedom House avisam-nos que a democracia está sob ataque e que a liberdade no
mundo se encontra em declínio há 15 anos consecutivos, sendo que menos de um quinto da população
mundial vive em países totalmente livres.
Nesse período, assistimos ao ressurgimento de movimentos e de ideais de extrema-direita, com
substanciais ganhos mesmo em Estados-Membros da União Europeia de sólidas tradições democráticas. Uma
tendência que preocupa não só governos e forças de segurança de países democráticos, mas também
organizações internacionais ou religiosas.
Nas palavras do Secretário-Geral das Nações Unidas: «Os movimentos de supremacia branca e neonazi
são mais do que ameaças de terrorismo interno — tornam-se ameaças transnacionais que estão a crescer a
cada dia. Precisamos de uma ação coordenada global para derrotar este grave e crescente perigo».
São questionadas a universalidade dos princípios e valores em que assentam as sociedades livres e os
fundamentos da ordem multilateral internacional construída ao longo de décadas.
As raízes deste fenómeno têm terreno interno fértil na polarização política; nos populismos vários; nas
desigualdades que fragilizam a coesão social; nas situações de corrupção, que há que combater com
determinação e eficácia; nos ataques ao Estado de direito; na xenofobia e no racismo, que negam a igualdade,
diversidade e unidade na dignidade, intrínsecas a cada ser humano.
São eles acompanhados de outra dimensão, esta de natureza externa: a promoção do autoritarismo e da
reivindicação da sua pretensa melhor capacidade de resposta aos problemas atuais, recorrendo à
manipulação e à desinformação, potenciadas pelas novas tecnologias e pelo seu imediatismo.
Surgindo por vezes sob a capa de nacional-populismo ou de movimentos inorgânicos, o radicalismo e o
extremismo são, inquestionavelmente, perigos para a democracia, com as dicotomias antissistema, repletas
de respostas falaciosas e impraticáveis, sem adesão à realidade e com difícil relação com a verdade e os
factos.
É um fenómeno que explora, oportunista que é, os receios da população e as dificuldades que os Governos
democráticos têm manifestado na resposta às suas inquietações, que perturbações como a pandemia tendem
a acentuar.