I SÉRIE — NÚMERO 54
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incompatibilidades, foca-se também na leitura restritiva do Estatuto dos Deputados quando se discute se um
Deputado pode ou não suspender o mandato para concorrer a uma eleição.
O que deliberou a Comissão de Transparência neste caso foi que as disposições da legislação eleitoral não
estão vertidas nas causas de suspensão temporária do mandato previstas no Estatuto dos Deputados e que,
portanto, apesar de o artigo 1.º, n.º 3, dizer que o Estatuto dos Deputados é integrado por outras disposições
legais aplicáveis, um Deputado não pode suspender o seu mandato para participar no processo eleitoral. Ou
seja, um Deputado, que tantas vezes goza de privilégios face aos restantes cidadãos comuns, é, neste caso,
para a Comissão de Transparência, um cidadão de segunda.
Sr.as e Srs. Deputados, a iniciativa que o PAN traz é simples: trata-se de dar ao Estatuto dos Deputados a
coerência com a legislação autárquica que a interpretação da Comissão de Transparência não tem conseguido
dar. Trata-se de dar forma, no Estatuto dos Deputados, a um direito de suspensão do mandato para participar
em certos atos eleitorais e não de criar uma obrigação de suspensão do mandato.
Acreditamos que os termos da proposta são adequados, mas estamos disponíveis para trabalhar a ideia na
especialidade e para refletir, por exemplo, se faz ou não sentido ter uma formulação tão ampla quanto aos
órgãos das autarquias locais, ou se devemos prever as mesmas regras para o Parlamento Europeu, onde esta
regra não está prevista.
Entretanto, assumiu a presidência o Vice-Presidente José Manuel Pureza.
O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, muito boa tarde.
A próxima intervenção cabe ao CDS e, para tal, tem a palavra o Sr. Deputado João Almeida.
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O CDS participa neste
processo legislativo com um projeto de lei com dois objetivos essenciais, tendo o primeiro a ver com aquilo que
entendemos dever ser um bom princípio para a aprovação de regras que se destinam a todos os Deputados
desta Assembleia da República. Que princípio é esse?! O princípio da maior maioria possível na aprovação
dessas regras.
O Estatuto dos Deputados que temos, neste momento, em vigor, concretamente em relação a esta matéria
da suspensão de mandato pelos Deputados, foi aprovado numa legislatura em que o Partido Socialista tinha
maioria absoluta, única e exclusivamente pelos Deputados desse grupo parlamentar, e nem sequer por todos.
Isso, do ponto de vista das regras de uma instituição, é profundamente errado. Não há donos das instituições,
ainda que, conjunturalmente, alguma das forças possa ter uma maioria suficiente para aprovar uma regra.
É preciso também perceber qual o impacto que isso tem. Como as regras não podem ser alteradas a toda a
hora, como as regras não podem mudar a todo o tempo, cabe às maiorias terem a responsabilidade e o bom
senso de procurar consensos para a aprovação dessas alterações — tudo o que o Partido Socialista não fez.
O Partido Socialista, há uns anos, resolveu fazer esta alteração ao Estatuto dos Deputados porque se sentia
ameaçado pelos Deputados que o Bloco de Esquerda estava a eleger. Vai daí, faz-se tábua rasa de tudo aquilo
que sempre foi o princípio de funcionamento do Parlamento, porque o que conta é o interesse eleitoral do Partido
Socialista e, se o Partido Socialista pode perder Deputados para o Bloco de Esquerda, então, as regras do
Parlamento mudam todas!
Srs. Deputados do Partido Socialista, não foi aceitável à época e não é aceitável agora.
Atente-se àquilo que se alterou e ao sentido que isso possa fazer: faz algum sentido que um Deputado que
esteja doente, com uma doença grave, só o possa estar por 180 dias? Foi isso que os senhores consagraram.
Faz sentido que alguém que queira prestar apoio a um familiar não possa suspender o seu mandato, deixar de
receber a sua retribuição, deixar de receber salário, mas já possa faltar justificando a falta, continuar a receber
e, no Parlamento, o lugar está vazio?
É esta a democracia que os senhores defendem, com a lei que está, neste momento, em vigor. No
Parlamento, há menos representatividade. Na vida pessoal do Deputado continua a haver um proveito de que o
próprio podia querer prescindir, por uma razão de transparência, de seriedade e de honorabilidade, mas não
pode. Porquê?! Porque o Partido Socialista não deixa. O Partido Socialista acha que é muito melhor faltar do
que poder, transparentemente, suspender o mandato. Isso não é aceitável. Isso não é, de forma alguma,
aceitável.