9 DE ABRIL DE 2021
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carrocel que não dignificava a estabilidade do mandato dos Deputados nem valorizava os Deputados na sua
responsabilidade própria perante os eleitores.
A segunda razão é que os Deputados não devem igualmente suspender o seu mandato pelas tais razões
pessoais invocáveis uma vez que o mandato que os eleitores conferem aos Deputados é um mandato que deve
ser entendido como vinculativo. Ao ser entendido como vinculativo, as razões de suspensão têm de estar
ancoradas em razões maiores. Ou são razões que resultam da necessidade do levantamento do mandato por
razões processuais e de natureza judicial ou são razões constitucionalmente derivadas do funcionamento dos
órgãos de soberania no seu equilíbrio, não podendo haver justaposição de funções políticas, ou são derivadas
de alguns casos de direitos fundamentais inalienáveis, como, por exemplo, o direito à parentalidade e aqueles
que, de forma muito clara, estão estabilizados na versão em vigor.
Mas se se vier a admitir a possibilidade de um Deputado invocar um motivo relevante de natureza familiar ou
profissional, isto significa dizer ao Parlamento: «Eu fui eleito Deputado, mas agora, por razões pessoais, vou ali
e já venho. Venha cá um outro, transitoriamente, substituir-me, que eu, depois, talvez volte». E isto por razões
pessoais, ditas ponderosas, mas é uma cláusula completamente indeterminada.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Sr. Deputado, queira concluir, se faz o favor.
O Sr. Jorge Lacão (PS): — E também por razões profissionais igualmente indeterminadas e,
consequentemente, a tal natureza vinculativa do mandato, o respeito pelos eleitores, a estabilidade do mandato
parlamentar e a dignidade do Parlamento ficam fundamentalmente afetadas por esta visão patrimonialista, por
esta visão privatista que os Srs. Deputados conservadores querem imprimir à natureza do mandato.
É por isso que não podemos aceitar esta solução e é por isso que a vamos rejeitar.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado André
Ventura.
O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Jorge Lacão, foi o seu partido que criou esta
trapalhada monumental em que está metida a Assembleia da República.
Foi o Sr. Deputado Pedro Alves que, num parecer dado à Comissão de Transparência e Estatuto dos
Deputados sobre a suspensão do meu mandato, conseguiu juntar o «z» com o «g» e o «g» com o «a» e chegou
a uma solução em que ninguém acreditava — porque, aliás, o parecer original era noutro sentido — para
conseguir convencer a Assembleia de uma coisa, Sr. Deputado: que um Sr. Deputado único não pode ser
candidato a Presidente da República sem suspender o seu mandato.
O Sr. Deputado fala do alto de 100 Deputados atrás de si, mas esquece-se que a democracia também é
daqueles que têm um Deputado ou dois e podem ser candidatos a uma câmara municipal ou à Presidência da
República ou a muitos outros órgãos. Temos muitos dons, não temos ainda o dom da ubiquidade, que é de estar
em todo o lado ao mesmo tempo.
É muito fácil falar quando temos 100 Deputados atrás de nós. Se não estou eu, amanhã está outro. Se não
está o André está a Joana; ela que venha para aqui falar.
Depois, o Sr. Deputado vem acusar, falando da rotatividade dos mandatos como se os grupos parlamentares
instrumentalizassem os Deputados. Aliás, é curiosa a contradição do Sr. Deputado, quando diz: «Estamos aqui
contra aqueles grupos», referindo-se ao Bloco de Esquerda, «que faziam rotatividade de mandatos,
instrumentalizando». Mas, Sr. Deputado, quem é que lhe garante que aqueles Deputados foram
instrumentalizados? Ou outros, de outras bancadas?!
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Sr. Deputado, queira concluir, se faz o favor.
O Sr. André Ventura (CH): — Quem é que lhe garante que um Deputado que cede o seu lugar a outro, no
meio do mandato, está a ser instrumentalizado e não assumiu livremente essa posição?