9 DE ABRIL DE 2021
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O Sr. André Coelho Lima (PSD): — Sr. Presidente, vou mesmo terminar.
Diz o Sr. Deputado Jorge Lacão que nós queremos que um Deputado diga «vou ali e já venho e vem aqui
outro substituir-me» e que é isso que estas propostas querem. O que o Partido Socialista quer é que um
Deputado diga: «vou ali e já venho, não vem ninguém substituir-me e fica aqui uma cadeira vazia».
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Srs. Deputados, terminámos, assim, o ponto 4 da nossa ordem
de trabalhos e vamos passar ao ponto 5. Deste ponto consta, então, a discussão do Decreto-Lei n.º 14/2021, de
12 de fevereiro, que altera o regime jurídico de entrada, permanência, saída e afastamento de estrangeiros do
território nacional [Apreciação Parlamentar n.º 44/XIV/2.ª (BE)].
Para intervir, em nome do partido que apresenta esta mesma apreciação parlamentar, tem a palavra a Sr.ª
Deputada Maria Manuel Rola.
A Sr.ª Maria Manuel Rola (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Os
vistos gold são habitualmente discutidos pelas piores razões. Em Portugal, em Malta, no Chipre, em Espanha,
na Grécia, esta figura tem sido associada a práticas de corrupção, a tráfico de influências, a peculato e a
branqueamento de capitais, mas também à proteção de empresários que, por exemplo, no Camboja, destroem
as florestas tropicais, como revelado no Chipre leaks, ou ainda a empresários que, em Portugal, vêm perseguir,
ameaçar e até matar pessoas para poderem especular com as suas casas, como comprovou recentemente a
condenação de um tribunal no Porto.
O Governo português pouca informação colige e mantém-se neste estado de negação, mas esta denúncia
dos vistos gold não é só o Bloco de Esquerda que a faz. Também a Comissão Europeia, na análise de risco e
exposição da União Europeia a atividades de branqueamento e financiamento de terrorismo, afirma existir uma
grande vulnerabilidade a estas atividades potenciadas pelo esquema dos vistos gold. Não é difícil imaginar
porquê.
Os vistos gold são uma porta de fuga à legislação e ao arresto de bens de qualquer crime, em qualquer parte
do mundo, e Portugal é parte integrante, cada vez mais, deste circuito.
É por isto que o Bloco de Esquerda insiste no fim deste esquema, a par com as recomendações de outras
entidades internacionais que pugnam pela transparência, pelos direitos humanos e pelo combate ao crime fiscal
e à corrupção. É também por isto que trazemos, de novo, esta questão a debate, mas não só. Os vistos gold
são um problema concreto também para quem vive no nosso País, pois, em conjunto com outras medidas, veio
aumentar exponencialmente a especulação imobiliária que dificulta, a centenas de milhares de pessoas, o
acesso à habitação. Quantos dos edifícios comprados até 2020, através deste esquema, estão vazios e
emparedados, sem cumprir a sua função social? Quantas casas, apartamentos, terrenos e outro edificado viram
o seu preço subir exponencialmente precisamente para poderem vir a ser alvo de venda no âmbito deste
esquema, que vende edificado para a compra da cidadania portuguesa?
Parece existir, dentro do Governo, quem esteja ciente desta realidade. A própria Ministra da Coesão
Territorial, Ana Abrunhosa, em janeiro de 2020, dizia precisamente o seguinte, e cito: «Os vistos gold têm gerado
especulação imobiliária e têm levado a que as nossas famílias, jovens qualificados, não consigam encontrar
uma casa no Grande Porto e na Grande Lisboa. Isso é inaceitável».
E eu digo que é inaceitável e que é inaceitável também que, nos dias de hoje, com a crise que vivemos, os
valores do imobiliário não desçam, que não acompanhem a atividade económica e os rendimentos de quem vive
em Portugal. Continua a ser extremamente difícil encontrar uma casa ou um espaço comercial a valores
decentes e este vai ser um problema ainda mais denso na retoma económica e, com a manutenção dos vistos
gold, o património imobiliário ficará, com certeza, a saque.
Ora, no Orçamento do Estado para 2020, ficou inscrito o compromisso de retirada dos vistos gold nas zonas
litorais e nas áreas metropolitanas até ao final desse ano. Entre o anúncio do fim, no ano de 2019, na discussão
do Orçamento do Estado, o novo anúncio e a pressão, ao largo do ano de 2020 e ainda agora durante o ano de
2021, o que o Governo tem vindo a garantir é uma alta na procura destes esquemas sem acabar com eles,
potenciando-os, assim. Nos dias de hoje, não só a promessa ficou por cumprir, como existe uma corrida de
acesso ao programa que vulnerabiliza ainda mais o nosso País, num momento de crise.