21 DE MAIO DE 2021
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É para isto que contaremos com o contributo de todos, neste debate e em todos os direitos que, constitucional
e legitimamente, exercerão.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Cláudia Santos, do Grupo Parlamentar do PS.
A Sr.ª Cláudia Santos (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro da Administração Interna, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: A reestruturação do SEF consta do Programa do Governo e, antes dele, já
estava no Programa Eleitoral do Partido Socialista. Ihor Homeniuk morreu nas condições dramáticas que
conhecemos, em 12 de março de 2020, meses depois de aqueles programas, em 2019, se terem tornado
públicos. Não será, por isso, a trágica morte de Ihor Homeniuk a definir a mudança no acolhimento de
migrantes e na investigação da criminalidade associada às migrações, apesar de se achar que o modo como
Ihor morreu não deve ser esquecido. Não recuperaremos a sua vida, nem tudo aquilo que com ela se perdeu,
mas talvez possamos honrar a sua memória refletindo sobre aquilo que devemos alterar. Uma coisa sabemos:
não é possível «rasgar as vestes» em indignação e clamar que tudo está mal para, depois, vir aqui defender
que, afinal, tudo deve ficar mais ou menos na mesma.
A ideia de que o conceito de segurança interna precisa de ser revisitado não é de hoje. No mundo de hoje,
nenhuma segurança pode ser só interna, não vivemos num aquário. O conceito de segurança tem
necessariamente de expandir-se. Hoje, talvez se deva falar, sobretudo, em segurança humana. Nesta, o
Estado continua a ser um referente, mas já não é o único. O conceito de segurança humana está centrado na
pessoa e no bem-estar dos povos. Com este conceito de segurança, as questões postas pelos migrantes são
encaradas sob um novo prisma. Cada país faz escolhas sobre os migrantes que pode acolher e o acolhimento
de migrantes não deve ser enquadrado num contexto policial. Uma coisa é o acolhimento de migrantes; outra
coisa é a criminalidade parasitária das migrações e dos limites que cada Estado lhes define. Essa
criminalidade é assunto de polícia e deve ser tratada como criminalidade muito grave. Os migrantes merecem
uma resposta; os criminosos, que se aproveitam das fragilidades, merecem outra resposta.
Várias razões justificam a mudança de paradigma. Tratarei apenas de duas. Primeira razão: o medo que os
migrantes têm da polícia e o receio de serem tratados como criminosos torna-os mais vulneráveis à
exploração e dificulta a descoberta dos crimes de que são vítimas. Por isso, a estrutura que os tenha como
interlocutores não deve ser também uma estrutura policial.
Uma das maiores perplexidades do tráfico de seres humanos é a dificuldade da sua deteção. Há dezenas
de milhares de pessoas traficadas no mundo. Por que razão temos tão poucos processos criminais? Há muitos
mais processos por tráfico de droga do que processos por tráfico de seres humanos. Para os traficantes de
pessoas, o risco de descoberta é baixíssimo e a probabilidade de lucro é enorme.
Em 2020, foram confirmadas 13 vítimas de tráfico de seres humanos, no nosso País. Mas como é isto
possível? Por que razão conseguem os criminosos ocultar mais facilmente pessoas vivas, que falam e se
mexem, do que pó branco ou comprimidos? Por uma razão principal e por outras razões complementares.
A razão principal é que as vítimas do tráfico de seres humanos não querem ser encontradas. E não querem
ser encontradas, sobretudo, porque o sistema favorece a confusão sobre aquele que é o seu papel e, por isso,
têm receio da polícia. Não sabem se serão tratadas como vítimas ou como criminosos. Como canta Manu
Chao em Clandestino, um hino de todos os migrantes, «Sozinho vou com a minha pena/Sozinha vai a minha
sentença/Correr é o meu destino/Por não ter papéis/Sou uma raia no mar/Um fantasma na cidade/A minha
vida está proibida/Diz a autoridade».
As vítimas só denunciarão o crime de tráfico de pessoas se conseguirmos combater as armas utilizadas
contra elas pelos seus agressores. E uma dessas armas é precisamente o medo da polícia.
Olhemos para a história de Teresa: Teresa foi criada pela avó na América Central e, ainda jovem, foi
enganada com promessas de amor e de uma vida melhor por um homem que pensava que se preocupava
com ela. Foi levada por esse homem para os Estados Unidos da América e ele obrigou-a a prostituir-se,
ficando-lhe com todo o dinheiro e ameaçando-a de que seria deportada e depois humilhada perante a família
se o denunciasse. Mas aquilo que concluiu o relatório internacional que apresentou o caso de Teresa é o