I SÉRIE — NÚMERO 31
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Esmiucemos: o fundo de tesouraria deveria estar disponível a 1 de abril, mas o Governo só o tornou
disponível a 14 de setembro. A Assembleia da República aprovou um montante de 750 milhões de euros para
o fundo, mas o Governo resolveu ignorar a Assembleia, passar por cima da lei e reduzir esse montante para
100 milhões de euros. O reembolso do financiamento, que deveria ter um prazo de 10 anos, foi reduzido pelo
Governo para quatro anos e a carência de capital, que deveria ser 18 meses, passou, pela mão do Governo,
para 12 meses. Quanto à taxa de juro, ao contrário do que o Governo se comprometeu com Os Verdes — ficar
próxima de 0% —, ficou afinal em 1,5%.
Ou seja, o Governo acordou com Os Verdes, e a Assembleia da República aprovou, uma linha de apoio às
micro e pequenas empresas, mas o Governo, depois de ter visto o Orçamento do Estado para 2021 aprovado,
transformou essa linha de apoio numa vulgar linha de crédito. Depois lembramo-nos da «palavra dada e da
palavra honrada» e percebemos que as contas do défice falaram, pelos vistos, mais alto do que a honra.
Mas mais, o fundo de tesouraria é, neste contexto, apenas um exemplo, porque o mesmo aconteceu com
outras propostas de Os Verdes previstas no Orçamento para 2021, como a do apoio para o arranque de
eucaliptos de crescimento espontâneo ou ainda a da implementação da Estratégia Nacional para a Mobilidade
Ativa Ciclável.
Não foi, aliás, por acaso que o Governo do PS mostrou tanta resistência em fazer uma revisão da matéria
dada, isto é, de se proceder a uma análise da execução das medidas do Orçamento para 2021 antes de
procurarmos convergências e soluções para o Orçamento do Estado de 2022.
Mas, no que diz respeito ao fundo de tesouraria para as micro e pequenas empresas, o Governo não
desrespeitou apenas a Assembleia da República, o Governo não está em falta apenas com Os Verdes, o
Governo desrespeitou, sobretudo, os milhares de micro e pequenos empresários que viram nesse fundo uma
espécie de tábua de salvação, um excelente contributo para a sobrevivência das suas pequenas empresas.
Se o Governo não quer ficar eternamente mal e em falta com Os Verdes, com esta Assembleia e com os
micro e pequenos empresários, ainda está a tempo de fazer o que já deveria ter feito, respeitar a palavra dada
a Os Verdes e respeitar a decisão que foi tomada pela Assembleia.
Aplausos do PEV e do PCP.
O Sr. Presidente: — Pelo Grupo Parlamentar do PS, tem a palavra o Sr. Deputado Ascenso Simões.
O Sr. Ascenso Simões (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Portugal e os portugueses vivem, há duas décadas, em situação de contingência. Esta circunstância marcou e marca, decisivamente, a forma como
encaramos o presente e olhamos o futuro.
Governos curtos, instabilidade, ausência de sentido político, só interrompidos em 2005 e 2015, obrigaram-
nos a um caminho penoso que introduziu tristeza e fez estagnar muitas das forças mais dinâmicas da nossa
sociedade.
Quando, em 2020, estávamos a iniciar a libertação da crise social e económica, afundámos de novo com
tudo o que a pandemia do século nos trouxe e quando Portugal se preparava para aplicar, em simultâneo, três
programas europeus, o Governo vê o seu Orçamento reprovado. Nenhum cientista político encontrará as razões
para este triste tempo.
Estamos no final de uma Legislatura única, importa olhar para VV. Ex.as e questionar a vossa consciência.
Que País queremos? Estaremos à altura do tempo que vivemos?
Temos para nós que o que interessa a Portugal é, em traços largos, organizar a esperança; organizar a
esperança é o nosso acontecer coletivo. Devemos organizar a esperança para afirmar Portugal no mundo e na
Europa construindo pontes entre continentes; organizar a esperança numa comunidade de língua portuguesa
que se valorize nos campos social e económico e confirmando, também, a nossa vocação multilateral.
Devemos organizar a esperança elegendo o diálogo Norte/Sul, encontrando soluções para a pobreza,
fazendo face às migrações que procuram mundos melhores; organizar a esperança aumentando a segurança
sem ceder nas liberdades, optando pelo diálogo religioso e pela paciência no crescimento dos povos sem tutelas
ou amarras.