I SÉRIE — NÚMERO 31
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Tivesse o Governo sido bom ouvinte e estas equipas teriam sido essenciais para agilizar o caso da extradição
de João Rendeiro, mas, mais do que isso, para, no geral, permitir uma maior eficácia nos casos da grande
criminalidade económico-financeira e nos crimes de corrupção, dada a frequente dimensão transnacional que
estes vêm a assumir.
Esta era uma proposta que, aliás, constava do Pacto da Justiça e que, desde 2018, este Governo teima em
conservar na gaveta. Mas aqui a culpa também não morre solteira, porque se há partidos que hoje se lamentam
da falta de tradutores ou de meios, recordo que há um ano a proposta do PAN foi rejeitada, com os votos contra
do Grupo Parlamentar do PS, a abstenção do PSD, do Bloco de Esquerda, do PCP, do CDS-PP, do Chega e
do Iniciativa Liberal. Estivemos sozinhos e o tempo, infelizmente, deu-nos razão. Mas, quem sabe se, no próximo
Orçamento, à luz deste embaraço, esta Casa não dá a mão à palmatória e aprova a proposta que o PAN não
deixará de voltar a trazer aqui?
O mesmo se diga em relação ao DCIAP (Departamento Central de Investigação e Ação Penal), essencial
nestes dois casos, e que tem sido tratado como parente pobre no PRR (Plano de Recuperação e Resiliência):
que possa, finalmente, ter salas de trabalho suficientes para os seus funcionários, ter mais do que uma sala de
interrogatório devidamente apetrechada e software para o laboratório informático para poder tramitar estes
processos.
O caso Rendeiro mostrou-nos também que, tal como o PAN vem dizendo há anos, os vistos gold, sejam
dados por Portugal ou pela África do Sul, não servem a economia real ou o crescimento económico, visam,
apenas e só, assegurar facilidades de deslocação, sem necessidade de visto prévio, para mais de uma centena
de países e, no caso português, dar o acesso irrestrito à zona Schengen.
Também nesta matéria o PAN propôs a revogação deste regime no Orçamento para 2020, mas PS, PSD,
CDS-PP, Iniciativa Liberal e o próprio Chega votaram contra!
Contudo, não nos cansamos e na próxima Legislatura cá estaremos, de novo, a propor o fim dos vistos gold,
e esperamos que os demais partidos nos acompanhem para corrigir um erro que, como já se viu, tanto lesa o
País.
Não podemos também continuar a tapar os olhos à realidade dos paraísos fiscais. Mais uma vez, foi o PAN
quem abriu, aqui no Parlamento, a discussão sobre este tema — falamos das Ilhas Virgens Britânicas —, para
que o Governo exigisse à União Europeia a adoção de critérios mais exigentes no que respeita à lista de
jurisdições não cooperantes, mas nada foi feito.
Sr.as e Srs. Deputados, os problemas da justiça em Portugal não começam nem terminam neste tipo de casos
ou na lentidão que marca a justiça. Existem muitas outras matérias, em particular a ambiental, que têm ficado
profundamente esquecidas e é preciso que nos comecemos a indignar e a atuar em conformidade diante da
complacência da justiça para com os crimes ambientais e os ataques aos ativistas ambientais.
Devemos indignar-nos com o facto de, apesar de as autoridades terem registado cerca de 82 000 crimes
ambientais, apenas ter havido julgamento em tribunal de 6% dos casos de poluição no nosso País. Seis por
cento de crimes contra a natureza! Seis por cento de crimes contra o Planeta, contra a nossa própria
sobrevivência!
Não podemos aceitar que neste domínio, no ano passado, a GNR (Guarda Nacional Republicana) tenha tido
mais de 12 000 denúncias e tenha feito mais de 228 000 fiscalizações, e que isso só tenha levado à deteção de
1100 crimes.
Não podemos ficar impávidos quando as descargas ilegais num rio, que ocorrem durante anos e geram uma
justa indignação das populações, levam apenas a uma condenação judicial sob a forma de repreensão escrita.
Não podemos ficar serenos quando um tribunal, mesmo em sede de providência cautelar, afirma que um
projeto como o do aeroporto do Montijo só poderia fundamentar uma declaração de impacte ambiental
desfavorável e o Governo continua, contra tudo e contra todos, a insistir no avanço deste projeto que está em
contraciclo com os desafios que as alterações climáticas nos colocam.
Mais: não podemos continuar a fechar os olhos à opacidade que marca processos como o da extração e
exploração do lítio ou o das barragens, entre tantos outros de que poderíamos dar exemplo no País. E, menos
ainda, podemos desproteger os denunciantes, como é o caso de Arlindo Marques, que se viu forçado a enfrentar
uma ação judicial. Note-se que as chamadas ações SLAPP (ações judiciais estratégicas contra a participação
pública) apenas querem desmoralizar os denunciantes, manchar a sua imagem e travar a sua ação em defesa
do ambiente.