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3 de fevereiro de 1978

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II — ENQUADRAMENTO POLÍTICO CONSTITUCIONAL E PRESSUPOSTOS POLÍTICOS

1 — Inviabilizada pela recusa de confiança ao I Governo Constitucional, a fórmula governativa consistente num governo do Partido Socialista com independentes, ditada por bem compreensíveis preocupações de homogeneidade, a nova fórmula governativa patrióticamente encontrada —Governo de base PS com personalidades e apodo parlamentar maioritário e estável — muda o acento tónico da homogeneidade para a estabilidade.

Ditada esta por bem conhecidas razões de aritmética parlamentar, garante ao Executivo uma sólida base de apoio parlamentar e social, e por via dela a tranquilidade necessária à programação e execução de medidas de recuperação económica e de progresso social menos flanqueadas às flutuações de voto parlamentar.

Fundamental é, no entanto, a estabilidade social, sem a qual não é possível uma acção governativa eficiente. O País assistiu, visivelmente ansioso, ao desenrolar das negociações que conduziram à constituição do actual Governo. E embora os profissionais da insatisfação lancem já sobre ele, antes mesmo de começar a governar, pazadas de pessimismo e descrença, a maioria esmagadora dos portugueses deposita nele esperanças e concede-lhe o tempo e o crédito necessários a um juízo objectivo e fundado. Nenhum governo pode, à partida, pedir mais.

É assim de exigir um clima de paz social propício ao debate sereno e à solução construtiva dos grandes problemas nacionais, cuja ultrapassagem de algum modo divide os Portugueses.

Com esse objectivo, o Governo não se limitará ao diálogo institucional com os demais Órgãos de Soberania. Esforçar-se-á por que o diálogo real ultrapasse o institucional e dialogará com o povo a todos os níveis, em especial com as classes trabalhadoras representadas nos sindicatos, nas comissões de trabalhadores, nas cooperativas, nas unidades de produção geridas por colectivos de trabalhadores. E fá-lo-á sem discriminações ideológicas ou outras, que a reconstrução do País exige o esforço e a vontade de todos os portugueses. A principal virtude da democracia é precisamente essa: fornecer aos que ideologicamente divergem instrumentos de concertação e de diálogo em clima de paz social.

2 — Um Governo e um povo que se propõem enfrentar com êxito uma crise que, sendo nossa, é também do mundo — o que a torna mais grave, dada a crescente interdependência dela. Essa crise deriva, nomeadamente:

a) Da redução geográfica e económica de Portugal aos seus limites europeus, em consequência do fenómeno histórico e inelutável da descolonização — o País procura uma nova identidade;

b) Da situação herdada: quarenta e oito anos de

ditadura, com a consequente degradação do homem português e desgarramento da família portuguesa (um português, uma ilha); treze anos de guerras coloniais e desuma-

nizantes; isolamento e descrédito internacional;

c) Das profundas divisões existentes na sociedade

portuguesa à partida para um projecto de reconstrução nacional: desorientação e desconfiança quanto aos caminhos da Revolução, confrontações virulentas e depredadoras de bens e valores;

d) Da necessária reconversão de uma economia

de exploração colonial numa economia de auto-suficiência e de uma economia de guerra numa economia de paz: perda de mercados de oferta garantida de matérias--primas e baixo preço e de procura preferencial de produtos acabados; regresso maciço de portugueses residentes nas ex-coló-nias, com o consequente e abrupto crescimento em cerca de 8% da população portuguesa; licenciamento maciço de soldados;

e) Da recessão económica mundial: aumento ver-

tiginoso do preço dos combustíveis e outros produtos que Portugal importa, estancamento dos fluxos migratórios (solução tradicional para as nossas crises de crescimento demográfico e de desemprego), contenção do turismo, oscilações monetárias, inflação induzida;

/) Das profundas transformações económicas e institucionais ocorridas na sociedade portuguesa, com a consequente e abrupta ruptura dos necessários equilíbrios tradicionais: nacionalizações, Reforma Agrária, novas relações de trabalho, exploração reivindicativa por longo tempo violentamente contida e cujos excessos, aliás compreensíveis, contribuíram para o decréscimo da produtividade, para o absentismo, para a indisciplina no trabalho, enfim para a desorganização de importantes sectores produtivos;

g) Da sabotagem económica (quanto pior melhor)

reactivamente levada a efeito —ainda que por ausências ou omissões conscientes — pelos suportes empresariais do anterior regime;

h) De uma compreensível preocupação dos su-

cessivos governos provisórios e, embora em menor parte, do I Governo Constitucional de pouparem o povo português a sacrifícios supostamente evitáveis e da consequente relutância em tomar determinadas medidas de austeridade que o tempo entretanto decorrido e a experiência medio tempore acumulada revelou necessárias à recuperação da economia. Tem-se hoje, no entanto, a clara consciência de que os sacrifícios inevitáveis não assumidos hoje terão de, agravados, ser suportados amanha; i) De uma errada concepção, ainda generalizada, de que ao Estado compete resolver todos os problemas, de que, se não resolve, os governos não prestam e devem ser substituídos. Começa a ter-se a clara percepção de que o País são os seus cidadãos, de que o Governo não pode fazer tudo e de que não pode, nomeadamente, trabalhar pelos