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II SÉRIE- NÚMERO 62

Apontam-se a seguir os aspectos que, no entender da comissão de inquérito, se consideram como tendo tido influencia no acidente de 26 de Fevereiro de 1978.

1.2.1.1—O clima de agitação marítima não terá sido correctamente definido, principalmente em resultado da carência de dados estatísticos em número e em qualidade dignos de confiança.

Basearam-se, fundamentalmente, em dados colhidos na Figueira da Foz, durante sete anos, e registos de dois Invernos de uma bóia ondógrafo posicionada ao largo de Sines.

1.2.1.2 — Em consequência, as alturas da onda significativa nas proximidades da obra terão sido deficientemente avaliadas, com todas as probabilidades de o terem sido por defeito.

Por outro lado, e pelo que respeita aos períodos de retorno, também se pode suspeitar de uma previsão estatística pouco correcta, pois que a altura da onda significativa, Hs — 8,5 m, corresponde, segundo os critérios de projecto, a um período de retorno da ordem dos dez anos, e, segundo a análise do INMG (3), esse período é estimado em cerca de cinco anos.

1.2.1.3 — O projecto não contém planos de ondulação, como é norma em projectos desta natureza.

Remete-se para um estudo de agitação marítima no (então) futuro porto de Sines, realizado para o GAS por três especialistas do LNEC(4), em regime de profissão liberal, que é nitidamente insuficiente e não permite tirar conclusões definitivas.

Assim, os problemas da concentração de energia, resultantes da ocorrência de fenómenos de refracção, não foram averiguados, embora milite a favor dos projectistas a falta de elementos relativos à batimetria dos fundos, que deviam ter exigido, e a circunstância de, até então, não haver conhecimento da existência na costa portuguesa de ondas de grande período, únicas para as quais o fenómeno é relevante.

Não obstante, a importância da obra e a sua localização tornavam perfeitamente indispensável que tal estudo tivesse sido incluído entre as peças do projecto.

1.2.1.4 — A geometria do perfil resistente do quebra—mar é muito académica e arriscada.

Académica, porque os seus refinamentos geométricos são incompatíveis com os processos construtivos próprios das obras marítimas e praticamente impossíveis de controlar. Ilustra-se a afirmação com o exemplo da berma do prisma de apoio do manto de dolos que, com 3 m de largura, à cota ( — 15.00), e constituída por blocos naturais de 16t a 20t, nenhum construtor conseguiria executar, ainda que se argumente com o facto, conhecido a posteriori, de que os ensaios em modelo reduzido, conduzidos em vários laboratórios, revelaram que a berma, com tal configuração e dimensões, não era determinante no processo de ruína.

Arriscada, porque, com a preocupação da economia de primeiro investimento —os volumes da

obra crescem substancialmente com o suavizar dos taludes—, se adoptou um talude do manto de protecção a 1,5:1, que a prudência e o bom senso desaconselharia numa obra deste vulto, de mais com as incertezas e insuficiências de informação que caracterizavam o clima de agitação marítima e, portanto, a definição das solicitações.

1.2.1.5 — Optou-se por um tipo de bloco artificial de protecção, o dolo, sem que tal decisão fosse apoiada em estudos comparativos com outros blocos artificiais há muito consagrados, estudos esses que haveriam de prosseguir todas as fases de um projecto deste tipo, incluindo os ensaios em modelo reduzido.

1.2.1.6 — Adoptou — se, assim, na zona mais importante do molhe um tipo de bloco extremamente controverso, com virtudes muito enaltecidas e defeitos muito pouco conhecidos, estes agravados pela extrapolação de dimensões, e de que não havia qualquer experiência em Portugal.

Foi uma experiência ousada para um país pequeno, embora se compreenda que, historicamente, o dolo era a grande «vedeta» das obras marítimas dos princípios dos anos 70, e se deva, por imperativo de justiça, elucidar que só a partir de então começaram a surgir, aqui e além, as críticas a um bloco de protecção de quebra — mares que se apresentara como quase milagroso quando foi lançado.

Deve dizer-se também que é muito provável que qualquer outro projectista optasse pelo mesmo tipo de bloco que era, na altura, repete-se, a grande moda.

A falta de resistência estrutural dos dolos face às solicitações a que estão submetidos por via de acção dinâmica das vagas explica a sua fractura individual, a rotura do imbricamento e, portanto, a perda da estabilidade global do manto dos dolos que, reduzidos a peças mais pequenas, se chocam uns contra os outros, provocando mais fracturas e a ruína total do manto.

O mecanismo teórico da rotura é o que resulta da aplicação de esforços dificilmente quantificáveis, no estado actual dos conhecimentos, que provocam tensões de tracção no betão superior às que este material pode suportar.

Os ensaios em modelo reduzido realizados no Canadá, em que, nos dolos, foi simulada a resistência do betão à tracção, demonstraram que a explicação para o acidente que cs próprios ensaios evidenciaram foi confirmada pela forma que, no modelo, tomou o perfil após a ruína, a qual era inteiramente análoga à do protótipo após o acidente.

Outrossim, os ensaios realizados no estaleiro da obra sob a orientação do LNEC, utilizando o próprio protótipo dos dolos, confirmaram a fragilidade destes blocos para acções estáticas da ordem de grandeza do próprio peso e, por maioria de razão, para acções dinâmicas, como as que terão de sofrer em serviço, que são, de certeza, de efeitos muito mais nefastos.

1.2.1.7 — Os ensaios, em modelo reduzido, realizados no LNEC foram apreciados muito do «ângulo hidráulico» e nada do «ângulo estrutural», apesar do alerta lançado em tempo oportuno.

1.2.1.9 — Embora nada tenha a ver com o acidente, o projecto não considerou os problemas de conservação do manto de dolos durante a vida da

(3) Instituto Nacional de Meteorologia e Geofísica. (4) Laboratório Nacional dc Engenharia Civil.