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II SÉRIE - NÚMERO 67

A presente proposta pode levantar dúvidas quanto à sua constitucionalidade, na medida em que possa conduzir a resultados incompatíveis com a unidade cambial do País e a unidade da política de comércio externo. Na realidade, na medida em que se entenda que a existência de um orçamento e de um fundo cambial próprios, geridos pelos Governos regionais, possa conduzir a uma política cambial e de comércio externo própria, a solução terá ter-se por incompatível com o princípio constitucional da unidade monetária, cambial e financeira. Contudo, não compete a esta Comissão apreciar se as referidas consequências resultam necessariamente da criação do orçamento e do fundo cambiais.

Já a proposta de lei n.° 66/I parece levantar menos problemas, dado que se propõe simplesmente transferir para o Governo Regional a competência para autorizar a abertura de novas agências, filiais ou sucursais de instituições de crédito na área da região autónoma, competência que actualmente cabe, em todo o território nacional, ao Governo. Naturalmente, tal competência continuaria a ser exercida no mesmo quadro legal existente para todo o território nacional no que respeita à rede bancária; o que seria transferido seria apenas o poder discricionário que as decisões administartivas revestem nesta matéria.

As dúvidas que poderão subsistir quanto à admissibilidade constitucional de tal transferência resultam do facto de o exercício desse poder discricionário por entidades diferentes poder conduzir, por um lado, a resultados incompatíveis com a unidade da política financeira e de crédito, e por outro lado, a discriminações entre as instituições de crédito sediadas no continente e as sediadas na Região Autónoma. Contudo, não seria difícil aditar uma disposição que prevenisse esta última dificuldade. Em todo o caso, parece que uma excepção sempre seria de fazer em realção ao Banco de Portugal, dadas as funções constitucionais que lhe competem (cf. artigo 105.°, n.° 2).

3.2 — Quanto ao segundo problema acima enunciado, ele resulta do facto de à face do artigo 229.° da Constituição as matérias contempladas nas presentes propostas de lei respeitarem claramente ao estatuto regional e, portanto, deverem ser reguladas pela competente lei estatutária. Na realidade, as regiões autónomas regem-se actualmente por estatutos regionais provisórios elaborados ao abrigo do artigo 302.° da Constituição. Nos termos do n.° 3 desse artigo, os estauttos regionais provisórios estarão em vigor até serem promulgados os estatutos definitivos, a elaborar nos termos do artigo 228.° que entre outras coisas reserva a iniciativa legislativa às respectivas regiões autónomas.

A Constituição não fixou qualquer prazo quer para a promulgação, publicação e entrada em vigor dos estatutos, quer para a aprovação da lei estatutária pela Assembleia da República, quer para a apresentação pelas Assembleias Regionais dos respectivos projectos. Até ao momento não foi apresentado à Assembleia da República o projecto de estatuto para a Região Autónoma dos Açores. Contudo, quer através de decretos regionais, quer através de propostas

de lei à Assembleia da República, as Assembleias Regionais têm procurado regular determinados aspectos pontuais de matérias claramente pertencentes ao âmbito da lei estatutária (por respeitarem quer à orga-

nização político-administrativa da Região, quer às atribuições e competência dos respectivos órgãos, quer ao estatuto dos respectivos membros ou titulares e que não foram regulados nos estatutos regionais provisórios. Tais decretos regionais (por exemplo, os que versam sobre o estatuto dos Deputados regionais e sobre a criação de boletins oficiais regionais) não parecem ter qualquer base constitucional. Resta saber se tais aspectos ou outros que igualmente caem no âmbito da lei estatutária podem ser objecto de regulamentação através da lei comum, avulsa, da Assembleia da República.

A resposta parece dever ser negativa. Não havendo dúvidas de que constitucionalmente tais matérias só podem ser reguladas no estatuto regional, e sendo certo que tais matérias não foram objecto do estatuto regional provisório — que, compreensivelmente, se limitou aos aspectos considerados essenciais para criar as bases institucionais das regiões autónomas e para estabelecer os mecanismos institucionais do seu funcionamento—, parece ser inevitável a conclusão de que só o estatuto regional definitivo as poderá regular.

Contra esta conclusão poderiam ser levantados dois argumentos: em primeiro lugar, o de que, a ser assim, as regiões autónomas se veriam impedidas de exercer faculdades constitucionais, ou aspectos constitucionais de autonomia regional, enquanto não entrasse em vigor o estatuto regional definitivo; em segundo lugar, o de que uma lei da Assembleia da República, quando proposta pelas assembleias regionais, é, no essencial, idêntica à lei estatutária.

Os argumentos são pertinentes, mas não parecem concludentes. Quanto ao primeiro, sempre se poderá dizer que a questão depende apenas, em primeira linha, das assembleias regionais; basta-lhes aprovarem e apresentarem os competentes projectos de estatuto (que, de resto, nos termos do Regimento da Assembleia da República, têm prioridade sobre qualquer outra lei). Quanto ao segundo argumento, a verdade é que existem diferenças fundamentais entre a lei estatutária e uma lei comum, mesmo quando a iniciativa das assembleias regionais, quer quanto ao processamento, quer quanto ao objecto, quer quanto à sua hierarquia, quer quanto à sua rigidez.

Em todo o caso, a possibilidade da regulamentação mediante lei «avulsa», pontual, de aspectos que caem dentro do âmbito do estatuto regional conduziria a duas consequências inadmissíveis: por um lado, à impossibilidade de apreciar e definir globalmente a autonomia regional; por outro lado, à eventual consumpção total do estatuto regional, através de uma série de leis pontuais, protelando assim indefinidamente a aprovação da lei estatutária e dando lugar a dúvidas permanentes sobre os limites e o sistema global da autonomia.

Embora não seja isenta de dificuldades a tarefa de delimitar o âmbito de matérias que caem na esfera do estatuto regional, tais matérias não podem ser objecto quer de decreto regional, quer de lei comum, e só podem ser reguladas, globalmente, pela competente lei estatutária.

Não que se exclua de todo em todo a possibilidade de regular mediante lei comum aspectos pontuais de autonomia regional. Tal seria justificável —embora não seja fácil encontrar fundamento constitucional