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II SÉRIE — NÚMERO 1

oportunidade apresentada pelo PSD, a qual não chegou a ser convertida em lei.

Importa reencetar na presente legislatura um processo legislativo que conduza, no mais curto prazo, à aprovação de uma lei da República que garanta o direito ao planeamento familiar e à educação sexual. Ê nesse sentido que o Grupo Parlamentar do PCP apresenta o presente projecto de lei, cujo articulado reproduz integralmente e sem alterações o apresentado na anterior legislatura.

1 — Um direito fundamental que a lei deve consagrar

A Constituição da República fixa entre as incumbências do Estado a de «promover pelos meios necessários a divulgação dos métodos de planeamento familiar e organizar as estruturas jurídicas e técnicas que permitam o exercício da paternidade consciente».

Do artigo 67.° da Constituição deriva para o Estado o dever positivo de criar as condições necessárias para a realização do planeamento familiar, designadamente através dos meios e serviços públicos. Esta importante garantia institucional visa assegurar um direito dos cidadãos que a evolução da ciência e da técnica veio tornar possível: o direito de decidir ter ou não ter filhos, quantos filhos e o intervalo entre os nascimentos.

Inovação com profundas repercussões sociais, o direito ao planeamento familiar reveste-se de particular importância para a mulher, a quem possibilita a liberdade de opção num domínio que condiciona decisivamente o seu futuro. Da criação de condições para o seu exercício depende a transformação da maternidade em acto consciente e desejado, capaz de fazer a felicidade tanto daqueles que decidem dar a vida como da criança que vai nascer.

Tal qual se encontra constitucionalmente, o planeamento familiar não é apenas uma liberdade dos cidadãos, mas um verdadeiro direito, a todos devendo ser assegurada a possibilidade de o exercerem em condições adequadas — donde as específicas obrigações do Estado nesta matéria.

O planeamento familiar não surge, porém, considerado exclusivamente no âmbito individual. Trata-se de uma questão a encarar no plano comunitário. Componente essencial dos cuidados primários de saúde, o planeamento familiar é fundamental, desde logo, para a prevenção dos riscos que para a mulher decorrem de um número de gravidezes e partos excessivos e com reduzido intervalo, mas também necessário para a protecção da criança, que, concebida em tais circunstâncias, não deixará de as ver reflectidas negativamente no seu próprio futuro.

A garantia do planeamento familiar é, porém, mais vasta. Envolve a necessidade de dar resposta às questões decorrentes da esterilidade e infertilidade. As consultas de planeamento familiar visam a necessária prevenção e tratamento nessas situações, por forma a defender a saúde e as aspirações daqueles que vêem afectada a possibilidade de dar vida a um novo ser.

É a estes princípios que importa dar consagração legal, explicitando as diversas dimensões e aspectos dos direitos dos cidadãos, bem como as responsabilidades e incumbências do Estado, consolidando e dando força de lei a disposições e orientações que vêm vigorando sem tal suporte. Propondo-se inovações quanto a vários aspectos, houve a preocupação de preservar

e defender o quadro que tem presidido ao lançamento do planeamento familiar no nosso país após o 25 de Abril.

Na verdade, foi em 1976 que foi determinada a criação em todos os centros de saúde de uma consulta de planeamento familiar, integrada na valência de saúde materna. Fundamentando a medida, o despacho governamental que a aprovou sublinhava justamente que «o planeamento familiar diminui a morbilidade e mortalidade materna e infantil, melhora as taxas de saúde infantil, tem uma acção preventiva contra o aborto, com as suas consequências nefastas na saúde materna, e contribui para o bem-estar familiar». Nas consultas a partir de então criadas passou-se a prestar informação sobre os diversos métodos contraceptivos e permitiu-se aos utentes, independentemente do estado civil e idade, optar livremente pelo método que considerem preferível, de forma confidencial e gratuita, como gratuitos são os métodos facultados.

Esta decisão foi de enorme importância. Permitiu que o planeamento familiar se tornasse acessível, em muitas localidades do País, a um número crescente de cidadãos.

Consagrado como fazendo parte dos cuidados primários de saúde, encarado no plano comunitário e concebido como exigindo um diagnóstico exacto da situação e uma actuação planeada e organizada que garanta a cobertura geral desses cuidados fundamentais, o planeamento familiar conheceu uma notável expansão no nosso país. Para tanto, foi fundamental o esforço e as energias empenhadas por numerosos técnicos de saúde que nos centros de saúde ou em organismos centrais muito têm feito no sentido de criar as estruturas necessárias e divulgar e incrementar a sua existência. Há também que salientar que para tal expansão contribuíram estruturas como a Associação de Planeamento Familiar —que já no tempo do fascismo iniciou a sua acção cívica em prol do planeamento familiar— e a própria Comissão da Condição Feminina, que tem neste campo desenvolvido uma actividade positiva, injusto seria não referir, também, a acção dos policlínicos, os jovens médicos que, destacados para os mais variados pontos do País, levaram as primeiras bases do planeamento familiar a tantas portuguesas e portugueses.

O planeamento familiar encontra uma extraordinária receptividade nas populações, que ganham consciência crescente dos benefícios que dele advêm para o seu bem-estar, para a saúde e para o futuro dos seus filhos.

No entanto, os ataques que neste domínio foram lançados nestes anos pelas forças mais obscurantistas e retrógradas da sociedade portuguesa estão a ter consequências de enorme gravidade. Foi praticamente paralisada a expansão das estruturas existentes e, em vez de passos em frente, que urgia dar, recuou-se em aspectos fundamentais, multiplicaram-se restrições. Chegou-se ao ponto de uma norma da Direcção-Geral de Saúde ter proibido o acesso dos jovens às consultas de planeamento familiar caso não fossem expressamente autorizados pelos pais. Mas a esta decisão somou-se ainda uma orientação gerai tendente a restringir os serviços prestados nas estruturas públicas, o saneamento de técnicos competentes da Direcção--Geral de Saúde e a introdução de restrições à liberdade de escoiha de métodos em unidades dependentes do Ministério dos Assuntos Sociais.