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1 DE JUNHO DE 1983

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C) Interrupção da gravidei por motivos terapêuticos

Diferente nos seus pressupostos e processo de decisão, a interrupção da gravidez por motivos terapêuticos obedece a critérios e regras de carácter médico. É segundo as regras e conhecimentos da medicina que deve ser ajuizada a sua necessidade para remover «perigo de morte ou de grave lesão da saúde da mulher» ou enfrentar «séria probalidade de doença ou malformação de particular gravidade do nascituro» não detectada nas 12 primeiras semanas.

A interrupção da gravidez só pode ser praticada em tais casos se for confirmada, antes da intervenção, por 2 médicos que devem formalizar por escrito o seu parecer, justificando a necessidade da intervenção e fixando o prazo em que deva ter lugar. A interrupção não pode ser realizada em caso de oposição da mulher, estabelecendo-se as regras processuais e penais tenden tes a garantir a livre expressão da sua vontade.

D) Os profissionais de saúde face ao novo regime legal

A eficácia do regime legal agora proposto depende em larga medida do empenhamento e capacidade dos profissionais de saúde. Trata-se de encarar em moldes novos situações que exigem a aplicação de conhecimentos técnicos, mas também formação humana, deon tologia profissional.

Das características que se imprimiram ao processo de decisão resulta, desde logo, a atribuição ao médico de um papel fundamental na informação da mulher sobre as principais questões de que depende a escolha final. Esta não cabe ao médico, mas a isenção, rigor, objectividade e humanidade do seu comportamento revestem-se de extrema importância para a realização dos objectivos legais, na fase inicial como em todas as restantes do processo, antes, durante e depois da intervenção, se esta vier a ter lugar. E outro tanto se pode afirmar em relação aos restantes trabalhadores de saúde, todos abrangidos pelos deveres de sigilo e protecção dos direitos da mulher.

A lei, que assenta no estrito respeito pelas convicções morais, ideológicas e filosóficas de cada um, não poderia evidentemente, deixar de salvaguardar o direito dos profissionais de saúde à objecção de consciência em relação a actuações directamente ligadas à interrupção da gravidez. Mas providencia-se para que não seja defraudado o direito da mulher a uma informação completa e objectiva, com vista a uma escolha livfe, consciente e atempada. Determina-se ainda que os estabelecimentos de saúde públicos autorizados a praticar a «vxwrupção voluntária da gravidez devem ser organizados por forma a disporem dos serviços necessários para dar resposta aos pedidos de interrupção de gravidez que venham a receber.

Não se compelindo ninguém a praticar aquilo que a sua consciência impeça, procurou-se, de igual modo. assegurar a quem também em consciência optou os cuidados de que necessite para poder ver realizada em boas condições a interrupção voluntária da gravidez.

E) A importância fundamental da prevenção

Um dos objectivos essenciais do novo regime legal situa-se, como já se sublinhou, no domínio preventivo Algumas fases do çtocesso de decisão e execução de

interrupção de gravidez oferecem condições apropriadas para a informação da mulher quer sobre o controle dos nascimentos, quer quanto às formas de prevenir malformações e doenças em futuros filhos.

Assim sucede, desde logo, na consulta inicial. Em sede regulamentar caberá explicitar e desenvolver uma gama de elementos informativos escritos a entregar à mulher, por forma a tornar mais eficaz a desejável acção de esclarecimento.

Estabeleceu-se, ainda, que, se vier a realizar a intervenção, a mulher deve ser observada, nos 7 dias posteriores, num centro de saúde, onde lhe será fornecida informação sobre planeamento familiar. Esta obrigação ser-lhe-á sempre referida na altura da intervenção. Mas é, sem dúvida, do esforço dos serviços públicos competentes, da acessibilidade do planeamento familiar (e não de sanções penais) que depende a efectiva realização deste objectivo legal. Por isso mesmo se sublinha no articulado que cabe ao Estado «adoptar as providências necessárias para que a interrupção voluntária da gravidez não constitua meio de controle dos nascimentos, designadamente assegurando a criação e regular funcionamento dos serviços adequados e gratuitos de planeamento familiar».

F) As disposições penais

De todo o quadro fixado decorre não só a possibilidade de recorrer à interrupção voluntária da gravidez em condições satisfatórias do ponto de vista médico e social como a garantia de uma aplicação séria, responsável e eficaz do regime que se prevê.

Mas tem necessariamente de ser considerada a possível verificação de situações que infrijam os limites agora traçados.

Extremamente pesadas, as penas previstas no velho Código Penal de 1886 decorriam de uma matriz ideológica e política do século passado, assinalada por objectivos de retaliação e repressão (e não de educação), largamente indiferente ao facto de o aborto clandestino representar em si mesmo uma grave punição da mulher.

Diferindo nas penas, não assenta em atitude diferente face à mulher o Código Penal que entrou em vigor em 1 de Janeiro de 1983.

Outra deverá ser a filosofia penal subjacente às disposições que agora importa definir. Não poderá ignorar-se o muito, o quase tudo, que está por fazer para erradicar os factores que conduzem ao aborto. E precisamente aí que haverá que empenhar os esforços sociais decisivos.

Não se confundiu, pois, o que deve ser garantido e prevenido através de legislação social e o que requer adequada tutela penal. Neste último campo, procedeu-se também a necesárias distinções.

Para o primeiro domínio se remeteu o tratamento da mulher que tenha consentido interromper a gravidez em condições que não acautelam a sua vida e saúde Parece, na verdade, de afastar a possibilidade de responder a tais situações com algemas, cadeia ou multa para a mulher, por mais frontal que seja — e é — a desaprovação que a lei exprime em relação ao acto praticado. Nesses casos, o preço a pagar pela mulher (por causas que em larga medida se criaram contra a