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II SÉRIE — NÚMERO 12

6 — A respeito dos actos praticados no exercício de poderes discricionários (l3) importará referir que a respectiva fundamentação reveste papel deveras importante atendendo a que dela poderá resultar ou não a harmonia do fim do acto com o objectivo da lei, sendo certo que tal harmonização poderá, igualmente, decorrer de indícios tais como a incongruência, a insuficiência, o desvio de procedimento e a desfiguração dos factos C4). Aliás, a própria lei (artigo 19.°, § único, da Lei Orgânica do Supremo Tribunal Administrativo) procurou facilitar a anulação contenciosa por desvio de poder de tais actos, exigindo apenas desconformidade entre o motivo principalmente determinante do autor do acto e o fim visado por lei, exigência da qual deriva uma evidente hierarquização de motivos. Seja como for, e independentemente da restrição do âmbito do desvio a que tal interpretação poderia conduzir, a doutrina nacional tem-se orientado no sentido da relevância da motivação como via de detectar o fim prosseguido pelo autor do acto. Também o Supremo Tribunal Administrativo, partindo do princípio de que não existem actos inteiramente discricionários viria a decidir que, circunscrevendo-se o vício de desvio de poder no âmbito da discricionariedade do acto, este poderia ser atacado por quaisquer outros vícios quanto a aspectos estranhos ao domínio da dis-cricionaridade. Aquela instância administrativa também decidiu, em Acórdão de 15 de Março de 1979 (sumariado no Boletim do Ministério da Justiça, n.° 289, p. 360), que a falta de indicação dos motivos de facto e de direito ou a sua obscuridade, incongruência ou insuficiência (n.° 3 do artigo 1.° do Decreto-Lei n.° 256-A/77) inquina o acto de vício de forma (16).

A relevância da fundamentação decorre do ónus que impende sobre o recorrente, segundo jurisprudência constante do Supremo Tribunal Administrativo, de alegação e prova dos factos demonstrativos do vício de desvio de poder. Com efeito, o recorrente deverá, logo na petição de recurso, explicitar os fins visados pelo autor do acto que se afastam daquele para que o poder foi concedido, não obstante poder invocar, à cautela, a incongruência ou inexactidão dos motivos de facto e de direito com vista à anulação por carência de fundamentação.

Decorre ainda da viabilidade do designado «desvio de procedimento», que se traduz no emprego de procedimento, contemplado na lei para obtenção de certo

(") Entenda-se por poderes discricionários os que conferem a uma autorização administrativa uma certa margem do apreciação quanto à decisão a tomar, permitindo-lhe optar entre várias soluções juridicamente fundamentadas por aquela que lhe pareça mais oportuna. V. Anexo à Recomendação R (80) 2 formulada pelo Comité de Ministros do Conselho da Europa em 11 de Março de 1980.

(") Renato Alcssi, in Sistema institucionale di diritlo am-ministrativo, p. 331, citado pelo Dr. Oswaldo Gomes, ob. cit., p. 129.

(") Uma vez que a Administração estará sempre vinculada, no mínimo, âs regras de competência, à obrigação de agir com um fim de interesse público e à proibição de fundar a sua decisão em factos materialmente inexactos ou numa apreciação afectada por erro manifesto (Acórdão de 20 dc Outubro de 1977, in Acórdãos Doutrinais, n." 193, p. 9). Esta é também a posição defendida por Prosper Weil, in O Direito Administrativo, p. 122.

(") A favor da anulabilidade por vício de violação de lei (cf. Oswaldo Gomes, ob. cit., pp. 129 e 138).

resultado, mas à margem dos casos a que o mesmo é aplicável e para alcançar um objectivo diverso (").

7 — Relativamente aos poderes discricionários da Administração, indicaremos, para finalizar, os princípios aos quais, segundo a falada recomendação do Conselho da Europa, deverá obedecer o exercício daqueles poderes. São eles:

Prossecução apenas do fim em vista do qual o poder foi conferido à autoridade administrativa;

Actuação objectiva e imparcial, que tome em consideração apenas os elementos pertinentes específicos do caso;

Respeito pelo princípio da igualdade perante a lei, evitando toda a discriminação;

Manutenção de um justo equilíbrio (proporcionalidade) entre os direitos, liberdades e interesses individuais e o fim prosseguido;

Tomada de decisão num prazo razoável, tendo em conta a matéria em questão;

Aplicação das directivas administrativas, de carácter genérico, de modo consequente e constante, tendo em atenção as circunstâncias particulares de cada caso.

Alguns destes critérios ou princípios (v. g. legalidade, justiça, imparcialidade e proporcionalidade) tinham merecido, aliás, referências da doutrina portuguesa já na vigência da Constituição de 1976 (18).

8 — Aprovado pelo Decreto-Lei n.° 191-F/79, de 2C de Junho, o regime jurídico e condições de exercício das funções de direcção e chefia, o panorama altera-se, mais uma vez. A comissão de serviço tornou-se a única forma de provimento do pessoal dirigente da função pública, cujo elenco passou a ser composto pelos directores-gerais, secretários-gerais ou equiparados, pelos subdirectores-gerais e outros cargos equiparados, pelos directores de serviço e pelos chefes de divisão, segundo o preceituado nos artigos 1.° e 4.° daquele diploma.

Acerca do termo da comissão de serviço, o artigo 4.° veio a estabelecer 3 modalidades:

Para os directores de serviço e chefe de divisão, a comissão (de 3 anos) poderá ser dada por finda ate 30 dias antes do seu termo, pela Administração ou pelo interessado, através de manifestação expressa (n.° 2 do artigo 4.°), ou a requerimento do interessado, apresentado com a antecedência mínima de 60 dias e dirigido ao membro do Governo competente;

Para os directores-gerais, subdirectores-gerais e equiparados, a comissão poderá cessar nas condições previstas para os directores de serviço e chefes de divisão, sem embargo de poder ser-lhe posto termo, a todo o tempo, por despacho do membro do Governo competente;

(") A título de exemplo, indicaremos a utilização do processo dc aposentação do Decreto-Lei n.° 152/75 para encobrir u aplicação dc uma medida político-disciplinar ou de saneamento.

(") V. Direito Administrativo, t. i, da autoria do Dr. Mário Esteves (pp. 356 e seguintes). V. ainda o estudo do Dr. Sérvulo Correia, «Os princípios constitucionais da Administração Pública», in Estudos sobre a Constituição, 3." vol., pp. 661 e seguintes.