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7 DE NOVEMBRO DE 1984

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niência de serviço — «que injecta na lei interpretada, fingindo que tal foi o seu sentido originário», segundo uma prática, aliás, bastante conhecida (").

Verdadeiramente inovadora, face ao que preceitua o artigo 9.° do Código Civil, o certo é que a interpretação autêntica levada a cabo retira a sua eficácia (retroactiva) autónoma da própria declaração de vontade do legislador (artigo 2° do Decreto-Lei n.° 356/ 79, com referência ao n.° 1 do artigo 13.° do Código Civil), não se justificando, nesta fase, abordar o aspecto formal da alteração do Decreto-Lei n.u 256-A/ 77, nprovada ao abrigo de autorização legislativa — uma vez que a Assembleia da República ratificou, pela Resolução n.° 180/80, de 2 de Junho, o Decreto-Lei n.° 10-A/80, de 18 de Fevereiro, que repôs em vigor o Decreto-Lei n.° 356/79, cuja revogação havia sido produzida, por sua vez, pelo Decreto-Lei n.° 502-E/79, de 21 de Dezembro, em virtude de «contrariar o espírito e a letra do referido diploma e também a orientação jurisprudencial dominante sobre a mesma matéria».

E não há dúvida de que a contradição é flagrante.

Por outro lado, a retroactividade consagrada no artigo 2." do Decreto-Lei n.° 356/79 não procede de alguma das razões justificativas da retroactividade das leis interpretativas, isto é, de considerações de justiça relativa (necessidade de assegurar tratamento uniforme para todos os casos), de certeza do direito e de razoabilidade (não envolver a violação de expectativas legítimas dos interessados) que a doutrina reconhece ("). Ausentes, no caso sob apreciação, os pressupostos que ditam a aprovação de leis interpretativas, outra qualificação não pode merecer o artigo 1.° do Decreto-Lei n.° 356/79 que não seja a da norma inovadora, face à nova disciplina que, entretanto, introduziu no âmbito do dever de fundamentação dos actos administrativos.

Quanto ao carácter interpretativo imposto pelo artigo 2.°, restará dizer que, para além da unificação dos pressupostos das leis interpretativas, o diploma era causa veio consagrar uma regulamentação em todo desconforme à orientação da jurisprudência dos tribunais administrativos, no sentido da necessidade de explicitação dos factos integrados no conceito de conveniência de serviço.

3 — No que respeita às transferências, será de recordar que o Provedor de Justiça tem vindo a recomendar (M), desde 1978, a adopção de alguns princípios nesta matéria, como por exemplo:

A fundamentação concreta e específica da necessidade daqueles actos;

A efectivação, segundo escala de prioridades, de graduação previamente definida e publicada, de entre trabalhadores susceptíveis de serem abrangidos;

A audição prévia do trabalhador (não porque a transferência deva sempre e necessariamente ser condicionada pela aceitação, mas porque a con-

(") V. Interpretação e Aplicação das Leis. de Francisco Ferrara, na tradução de Manuel de Andrade, 2." ed.. p. 133.

(u) V. Noções de Direito Civil, de Pires de Lima e Antunes Varela, vol. i, 6." ed., pp. 213 e 214.

('") V. recomendações formuladas, a coberto dos ofícios n." 7937. de 29 de Agosto de 1978, e 9485, de 21 de Agosto de 1980, aos membros do Governo que superintendem na função pública.

sulta dos interessados poderá, em muitos casos, fazer surgir soluções alternativas ou procedimentos que minorem os efeitos prejudiciais das transferências). Na sequência de tais nomeações vieram alguns diplomas —Decreto Regulamentar n.° 12/79, de 16 de Abril, Decreto--Lei n.° 519-A/79, de 29 de Dezembro, Decreto-Lei n." 135/80, de 20 de Maio, e Decreto-Lei n.° 183/80, de 4 de Junho — consagrar algumas daquelas regras, embora se reconheça que muito haverá a fazer neste campo.

4 — Para além disso, o carácter objectivamente inovador e a eficácia retroactiva do Decreto-Lei n.° 356/ 79 justificariam, só por si, a audição das organizações representativas dos funcionários, o que parece não ter sucedido. De qualquer modo, esta não é uma questão decisiva para a abordagem do problema nuclear da constitucionalidade daquele decreto-lei, acerca da qual pouco haverá a acrescentar depois da análise a que procedemos.

V — No que toca a tal questão sempre diremos, pelos argumentos invocados, que a Constituição da República resultou ofendida, pelo Decreto-Lei n.° 356/ 79, nos seus artigos 269.", n.°" 1 e 2, e 52." alínea 6).

O n.° 1 do artigo 269.° da Lei Fundamental acabou violado, directamente, enquanto o artigo 1° daquele decreto-lei ilude o dever de fundamentação dos actos de exoneração e transferência através da remissão pura e simples para um conceito —o da conveniência de serviço — cuja integração é dispensada ao autor do acto. Nessa medida fica, praticamente, esvaziado o conteúdo do direito de informação do andamento dos processos (") e o direito ao conhecimento das resoluções definitivas (M) consagradas no n.° 1 do artigo 269." da Constituição da República Portuguesa e regulamentados pelo Decreto-Lei n.° 256—A/77, porquanto ao destinatário do acto de exoneração ou de transferência resta, unicamente, o conhecimento de que por conveniência de serviço — a invocar unilateral e decisivamente pela entidade competente para praticar aqueles actos — foi exonerado ou transferido.

De tal situação decorre, por seu lado, ofensa do n." 2 do artigo 269.° da Constituição (direito de recurso contencioso, com fundamento em ilegalidade, contra quaisquer actos), uma vez que, como oportunamente referimos, o artigo 1.° do Decreto-Lei n." 356/79 inviabiliza a alegação e demonstração do vício de desvio de poder, normalmente invocado nos casos de exercício de poderes discricionários.

Aquele normativo poderá prestar-se, outrossim, a práticas que redundam em despedimento sem causa justa ou por motivos políticos e ideológicos —que a

(") Os actos de exoneração e transferência, por maior informalidade que se lhes queira emprestar, não deixam dc implicar a organização de um processo, ainda que singelo, que normalmente é integrado no processo individual do funcionário após anotação pelo Tribunal de Contas (cf. artigo 10.° do Decreto-Lei n." 146-C/80. de 22 de Maio).

(") Direitos de natureza análoga aos «direitos, liberdades e garantias» enunciados no título n da parte t, como defendem Vital Moreira e G. Canotilho, in Constituição da República Portuguesa Anotada, Coimbra. 1978, p. 464.