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7 DE NOVEMBRO DE 1984

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último preceito exclui dos poderes de inspecção e fiscalização do Provedor de Justiça.

É dizer que a solução dada ao caso concreto não é passível de alteração por intervenção do Provedor de Justiça, a qual não poderá, assim, aproveitar à reclamante, neste caso.

III

A eventual intervenção do Provedor de Justiça terá, pois, de se confinar à recomendação no plano legislativo. E a incursão a levar a cabo para o efeito deve incidir, não tanto sobre as opções de fundo subjacentes aos preceitos transcritos —e que à Administração, como poder executivo, cumpre fazer—, como à forma como tais opções lograram expressão.

O presente processo vem, com efeito, aflorar as múltiplas dúvidas que se levantam no campo da interpretação e aplicação dos mencionados preceitos, dúvidas que desde logo se revelaram na produção legislativa, jurisprudencial (judicial e administrativa) e doutrinal.

Assim é que, logo após a publicação do Decreto--Lei n.° 667/76, divergências entre as Direcções-Ge-rais das Contribuições e Impostos e de Viação, quanto à sua aplicação às multas cominadas no direito estradai, levaram a Procuradoria-Geral da República, no Parecer n.° 37/77, de 10 de Março ('), a excluir da previsão do artigo 18.°, em apreço, «as multas de natureza criminal, designadamente as previstas no Código da Estrada».

E o legislador aceitou esta primeira posição doutrinal e administrativa (:), já que, em 16 de Junho seguinte, sentiu a necessidade de publicar o Decreto Regulamentar n.° 40/77, determinando, especificamente, a actualização das multas contidas no Código da Estrada.

Mas, acto contínuo, deve ter pretendido pôr cobro a dúvidas semelhantes, através da interpretação autêntica operada pelo transcrito D.ecreto-Lei n.° 296/77.

Forma simplista esta de alargar ainda mais o já de si vago e impreciso âmbito de previsão do artigo 18.* do Decreto-Lei n.° 667/76, para alcançar aquele objectivo!

Com efeito, se o artigo já suscitava numerosas dificuldades interpretativas, aquele decreto-lei veio aditar outras.

Entre as primeiras referiremos ainda: desde logo, as decorrentes do próprio enquadramento — que aí se afigurava limitativo— das importâncias que refere, nos conceitos de licenças, taxas e multas, conhecidos como são os problemas que se levantam na conceitualização destas figuras, nomeadamente no que respeita às taxas; depois, a questão de saber o que se deva entender por importâncias «fixadas em quantitativos específicos» — se se quer referir, apenas, as importâncias fixadas, como parece ter-se entendido no aludido parecer da Procuradoria, como explicar a referência aos «limites das multas»; e estarão abrangidas as importâncias fixadas em percentagens ou permila-gens, como acontece, precisamente, em certos emolumentos do Tribuna] de Contas?

(') Diário da República, 2." série, de 5 de Maio de 1977. (!) O Parecer n.° 37/77 foi homologado por despacho do Secretário dc Estado da Justiça de 21 de Março de 1977.

De entre as dificuldades que o Decreto-Lei n.° 296/ 77 fez acrescer, citaremos as seguintes: ao acentuar que as importâncias referidas no n.° 1 do artigo 18.° do Decreto-Lei n.° 667/76 são todas as que constituem receita do Estado, qualquer que seja a sua natureza, pretendeu excluir, afinal, a necessidade de tais importâncias se reconduzirem aos conceitos de licenças, taxas e multas? E que solução deu ao já suscitado problema da aplicação da actualização às multas de montante variável? E, para quem entenda que quis, efectivamente, que o diploma interpretado se aplicasse a tais multas? Como proceder à actualização daquelas em que (apenas) um dos limites fora elevado antes do mesmo diploma (')? E porque fugiu, de novo, a uma resposta expressa à também já levantada questão da aplicação às multas criminais (2) ?

Por estranho que pareça, a verdade é que, neste contexto de mais dúvidas de que certezas e apesar dele, não se coibiu o legislador de, como vimos, repetir, no Decreto-Lei n.° 131/82, de 23 de Abril, os exactos termos do estafado artigo 18.° É dizer que se renova toda a série de dificuldades que este artigo já suscitara. Com esta estranha particularidade: como aquele decreto-lei, ao fixar o coeficiente de actualização por referência ao «ano em que foi estabelecida a respectiva importância em vigor à data da publicação deste diploma», remonta a anos (anteriores a 1973) já previstos pelo artigo 18.°, vê-se que aceitou de ânimo leve que houvesse importâncias a que não se aplicara este artigo (não cuidando de precisar quais e porquê). E, também apesar disso, reedita o regime!

IV

Cremos ter demonstrado, à saciedade, que o legislador andou mal e, o que é pior, persistiu no erro, apesar de advertido: dele não se pode dizer, na verdade, que «consagrou as soluções mais acertadas» e, menos ainda, que «soube exprimir o seu pensamento em termos adequados», como o n.° 3 do artigo 9.° do Código Civil impõe que se presuma.

Haverá, pois, que enveredar pelo caminho certo. E, se isso não será fácil relativamente ao passado, dado já se terem produzido e radicado os efeitos dos diplomas em apreço —corrigidos, melhor ou pior, pela doutrina e pela jurisprudência—, há que evitar que, para o futuro, não se resista., de novo, à comodidade, em detrimento da correcção e da exequibilidade, risco que, como vimos, a experiência revela existir.

A tal objectivo se deverá reconduzir, em nossa opinião, a intervenção, no caso, do Provedor de Justiça.

Dada a multiplicidade e diversidade, quer quanto à natureza, quer quanto à forma da sua fixação, das receitas do Estado, que, mercê da inflação crescente, se quis e se quererá, provavelmente, actualizar, pensamos que a certeza e a segurança do direito —que neste campo, mais do que em qualquer outro, se

(') Eco desta última dúvida pode encontrar-se na circular n.° 19/79, de 26 de Setembro, da Direcção-Geral das Contribuições e Impostos.

(') Já no domínio do Decreto-Lei n.° 246/77, veja-se, com efeito, o Acórdão da Relação de Évora de 17 de Julho de 1979 (colect. de Júris, iv, 4 1332).