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25 DE MAIO DE 1985

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Eloy, a quem dirijo as primeiras palavras, num discurso não muito alinhavado, mas em que tentarei responder ao apelo feito pela Mesa no sentido de conseguirmos responder ao «Painel — A situação dos jovens em Portugal», que nos propõem dentro de tempo limitado.

Intervenho de pé porque penso que é mais fácil para as pessoas que estão a ouvir verem a maneira como as coisas são ditas e, porventura, sentidas.

Falo também com algumas ideias alinhavadas porque, em primeiro lugar, penso que a riqueza do debate reside na espontaneidade e na nossa juveni-lidade.

A culpa daquilo a que assistimos de manhã não é tanto dos oradores inscritos, mas da mistificação e da solenidade que instituições como a Assembleia da República, que estas paredes corporizam, têm vindo a transmitir ao longo dos anos.

Em segundo lugar, pela natureza e conteúdo das intervenções. Algumas delas em nada se poderiam distinguir das que são feitas numa sala semelhante àquela em que nos encontramos em virtude de os mais velhos verem em nós permanentemente os adultos, a cuja visão muitos de nós tentam sistematicamente responder.

Em terceiro lugar —e talvez seja a razão mais forte, ainda que sem um conteúdo muito objectivo por parte de todos os jovens aqui presentes—, por uma nova forma de estarmos e vivermos a vida.

Hoje não é necessário traçar grandes quadros para retratar o estrato juvenil, ou estratos, como defende o Prof. Braga da Cruz, que num estudo sociológico recentemente feito falava no «estrato juvenil português». Quem, como nós, contacta com essa realidade ainda menos.

No entanto, mais importante do que constatar realidades — algumas delas com as diferenças que aqui não foram expostas na parte da manhã— é saber quais as causas que estão por detrás delas e, principalmente, discutirmos sobre as soluções para as diminuirmos. Não possuímos a varinha mágica — penso que não existe em nenhum país do Mundo— para termos a veleidade de querermos eliminar os quadros tão escuros e que alguns colegas jovens de manhã aqui quiseram escurecer ainda mais.

Por razões metodológicas e facilitadoras da clareza das nossas palavras, faremos algumas denúncias, sem, no entanto, nos esquecermos de que falamos a 2 % de jovens, nos quais nós próprios nos incluímos, e a que tenho a liberdade de chamar elite, que são os dirigentes associativos.

Quero pedir desculpa a todos por falar em voz alta e por voltar a denunciar estas questões. É que desde muito cedo me habituei a falar alto, uma vez que, na maior parte das vezes, as pessoas a quem me dirigia não me ouviam, infelizmente, habituei-me a isso e até hoje não perdi o hábito.

Terei de o fazer novamente porque vejo aqui tantas cadeiras, bonitas por sinal, em que deviam estar sentados tantos ilustres deste país que deviam estar com atenção aos problemas concretos que todos os jovens, incluindo eu, poderão apresentar.

Os estudos sobre a juventude feitos em Portugal são escassos e mais escassa é a sua divulgação. Recordo-vos que, em termos de informação, 80 % da informação que circula no Mundo provêm de agências

transnacionais e que desses 80 % só 20 % ou 30 % são delicados a três quartos do território mundial, onde residem e permanecem dois terços da população.

Será oportuno perguntar, pelo menos neste Ano Internacional da Juventude, em que o Poder devia ser sensível a estas questões, quanto é dedicado, em termos de informação, na comunicação social portuguesa aos problemas da juventude.

Para referenciar as exposições de que faiamos, baseamo-nos, fundamentalmente, nalguns estudes: num inquérito feito pelo FAOJ, salvo erro em 1983, num estudo mandado elaborar pelo Sindicato dos Professores da Grande Lisboa, num estudo da Comissão de Coordenação Regional do Norte, num estudo do Prof. João Ruivo, num estudo feito pela Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, com o inconveniente de todos eles terem sido já realizados há bastantes anos e nem todos serem coincidentes no tempo e noutras questões.

Segundo o estudo da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, com dados provenientes do INE, existem em Portugal 1 600 094 jovens entre os i 2 e os 22 anos. Convém lembrar desde já que, desses jovens, 83 000 drogam-se ocasionalmente, 36 000 drogam-se habitualmente, mais de 50 % consomem álcool e 8 % caminham para a álcoolização. Relembro aqui uma das constatações do I Congresso de Psiquiatria Social, realizado em Portugal, e que foi divulgada, segundo a qual, dos 500000 alcoólicos existentes em Portugal, um quinto necessita de tratamento urgente e em 74,5 % desses casos a ingerência de bebidas alcoólicas se inicia na alimentação da infância.

Segundo o FAOJ, entre os 15 e os 24 anos existem em Portugal —não coincide muito com os números do INE — cerca de 1 600 000 jovens, o que representa, aproximadamente, 15 % da população portuguesa. Esses jovens nem sequer estão distribuídos harmoniosamente nos mesmos espaços territoriais do País. Uma das causas importantes é a diferença., cada vez maior, quer queiramos, quer não, entre os jovens do interior e os jovens do litoral.

Por incrível que pareça e por muitos sorrisos que possam surgir nesta Sala, ainda há jovens em Portugal no limiar do século xxi que nunca viram uma praia ou que nem sequer conhecem Lisboa, ê caso para dizer que ali o carteiro nem sequer uma vez tocou.

Por exemplo, entre 1960 e 1981 houve um acréscimo de 20 % na população juvenil, mas só os distritos de Lisboa, Porto e Braga absorveram 51,3 % desse acréscimo, ou seja mais de metade. Se somarmos os distritos que compõem o litoral, essa percentagem eleva-se a 75,2 %, excluindo o território correspondente ao distrito de Faro. Assim, como se pode lalajr em desenvolvimento ou em participação?

Outro exemplo: tendo em conta os 8 % de jovens que têm o grau universitário ou mais, acontece que nos distritos de Castelo Branco, Faro, Portalegre e Viana do Castelo apenas 1 % dos alunos que entram na escola primária ingressa no ensino superior. Será devido às condições económicas? É que hoje para se fazer uma viagem de 300 km, ida e volta, no interior de Portugal gasta-se, no mínimo, 1500$. Ao mesmo tempo os Serviços Sociais da Universidade Clássica de Lisboa fecham quartos de algumas residências sociais.